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‘Novela é antiética e manipula espectador’, diz psicóloga

Integrante do Conselho Federal de Psicologia fala sobre sequências em que uma coach ajuda menina violentada em ‘O Outro Lado do Paraíso’ – até com hipnose

Por Maria Carolina Maia Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO Atualizado em 9 fev 2018, 09h47 - Publicado em 8 fev 2018, 11h29

Foi ao ar na noite desta quarta-feira, na novela O Outro Lado do Paraíso, a primeira sessão de hipnose de Laura (Bella Piero) por Adriana (Julia Dalavia), uma advogada que tem formação em coaching e se propôs a ajudar a menina a entender seus problemas sexuais. Induzida a um estado de consciência não ordinário, ou de transe hipnótico, Laura se viu criança diante de um tanque de tartarugas, quando percebe a chegada de um homem – seu padrasto, o delegado corrupto Vinícius (Flavio Tolezani), por quem foi abusada na infância. A confusão de papéis – uma coach que faz as vezes de terapeuta e, ainda por cima, com aplicação de hipnose – é alvo de crítica de profissionais da saúde e de até mesmo de outros coachs. Para piorar – o que jogou mais combustível nesse pequeno incêndio, por misturar questões mercadológicas com outras de saúde mental – a sequência contou com patrocínio do Instituto Brasileiro de Coaching (IBC), que pagou por uma ação de merchandising na trama.

“A novela falha na ética. É manipulação midiática, faz espectadores acreditarem que podem se tratar com outros profissionais, como um coach. O pior é o interesse mercadológico. É antiética essa enganação”, diz a psicóloga Rosane Lorena Granzotto, integrante do Conselho Federal de Psicologia (CFP).

A hipnose no Brasil é uma técnica de livre exercício, isto é, não há lei que a restrinja a uma determinada categoria profissional. Mas tradicionalmente, segundo Rosane, a técnica é usada por psicólogos, médicos e odontólogos, que a empregam para mitigar a dor física dos pacientes. “Em relação à psicologia, é um recurso auxiliar ao trabalho, uma das formas de intervir no sofrimento psíquico, e, por orientação de uma resolução do Conselho Federal de Psicologia, o profissional deve ter capacitação específica, isto é, ter realizado algum curso sobre hipnose”, explica Rosane.

Qualquer profissional, de qualquer área, pode fazer o curso, que não é regulamentado pelo MEC, focado em cursos universitários. “Mas aí a gente entra em uma questão ética”, diz Rosane. “A hipnose é uma técnica que pode acessar estados e conteúdos profundos do sujeito. Quando se trata de um trauma como o da novela, um sofrimento muito profundo que bloqueia a pessoa para uma vida saudável e normal, deve ser tratado por um profissional que, além de saber usar a técnica, tenha uma boa formação de base para compreender a mente humana e o sofrimento psíquico. A formação de alguém que lida com o sofrimento é algo muito sério, não pode ser banalizado como a novela está fazendo.”

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Para a psicóloga, o “tratamento” – o termo é utilizado pela mocinha do folhetim, Clara, vivida por Bianca Bin – de Laura por uma coach pode, na vida real, ter consequências “nefastas”. “O prejuízo mais evidente é que não vai haver uma mudança de comportamento perene, uma reconstrução existencial, porque não tem elaboração. E, vindo à tona uma coisa tão brutal como um trauma, como essa pessoa vai incorporar essa vivência? É preciso o acolhimento de alguém preparado para isso, para entender a mente humana. Há riscos de que a situação piore, que a pessoa fique mais ansiosa, com mais pânico.”

Em nota à imprensa, a Globo defendeu a trama de O Outro Lado do Paraíso, afirmando se tratar de uma obra de ficção. A integrante do CFP, no entanto, acredita que a novela, produto cultural mais consumido do país, tem responsabilidade com o público. “O que está sendo apresentado na novela é uma desinformação, está simplificando uma coisa que é muito séria. Você faria uma cirurgia plástica com um advogado que fez um curso de intervenção cirúrgica? Não é nada contra advogados nem contra engenheiros, mas cada um deveria usar a ferramenta dentro do seu campo de atuação.”

A hipnose ericksoniana, empregada pela advogada Adriana na trama de Walcyr Carrasco, ele mesmo um coach formado pelo IBC, é a mais usada hoje em dia. É diferente da clássica, aquela simbolizada pelo relógio de corda que pendula diante do paciente e que trabalha com sugestão. A ericksoniana induz o paciente a um estado de transe por meio da respiração e de uma voz mais baixa e grave, por exemplo, e, num estado de consciência não ordinário, ele consegue acessar memórias guardadas, por meio de uma conversa com o hipnotizador.

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