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“Hoje, 70% da música é lixo”, diz BiD, que estreia show

Eduardo Bidlovski ataca falta de criatividade de artistas e diz que o papel de produtores, como ele, perdeu valor com a crise da indústria fonográfica

Por Carol Nogueira
24 mar 2012, 15h58

Quem vê hoje o produtor BiD, nome artístico de Eduardo Bidlovski, nem imagina que ele esteve no meio de um turbilhão cultural no começo dos anos 1990, quando ajudou Chico Science & Nação Zumbi a produzir uma das obras-primas do rico movimento manguebeat, Afrociberdelia. Tampouco que, nos últimos anos, ele esteve envolvido na produção de outras dezenas de discos e trilhas sonoras de filmes. Hoje, com dois filhos para criar e o fim de um casamento de sete anos, BiD tenta se manter tranquilo. Pratica natação e ioga duas vezes por semana antes de chegar até seu estúdio, localizado no bairro paulistano Cerqueira César, aonde vai todos os dias para trabalhar. E, embora faça um projeto de cada vez, BiD não tem trabalhado menos. Pelo contrário. Ele acaba de produzir o novo disco da banda pernambucana Eddie (Veraneio), trabalha com o MC carioca Marechal em outro e se prepara para produzir a trilha de um documentário sobre o carnavalesco Joãosinho Trinta. E, no meio disso tudo, ainda arrumou tempo para subir ao palco e divulgar o disco que lançou no ano passado, Bambas Dois. Os shows acontecem neste sábado, no Sesc Pompeia, em São Paulo, e no dia 28, no festival carioca Sonoridades.

Bambas Dois é, de certa forma, a continuação do trabalho solo que BiD começou em 2005, logo após deixar a big band Funk Como Le Gusta, que ele ajudou a fundar. Naquele ano, ele lançou Bambas & Biritas vol. 1, que trazia parcerias com grandes nomes da música popular brasileira, como Seu Jorge, Elza Soares e Arnaldo Antunes. Para a segunda parte do trabalho, BiD apostou mais alto e chamou colaboradores internacionais: os jamaicanos Sizzla, Kymani Marley (um dos filhos de Bob Marley), Jah Marcus, I Wayne, Queen Ifrica, Tony Rebel e o trio vocal The Heptones.

Mas o ocupado produtor se diz um tanto insatisfeito com a produção cultural de hoje. “Setenta por cento da música feita hoje é lixo”, afirma BiD. Ele abre exceção para músicos que despontaram nos últimos anos e hoje fazem grande sucesso, como o rapper Criolo e a cantora Karina Buhr. “Estou um pouco desiludido com a indústria e com o papel do produtor. O artista começa a tocar no rádio, e o cachê dele, que era de 5.000 reais, vira 15.000. Mas o produtor recebe apenas pelo disco e depois não vê mais nada, não tem nenhum tipo de reconhecimento. É por isso que, daqui para a frente, só quero fazer o que gosto e com quem me identifico. A menos que venha alguém com milhões. Eu trabalho para sobreviver, mas quero fazer trabalhos que durem”, afirma o produtor. BiD ataca ainda a falta de criatividade dos artistas atuais — “Existe muita gente talentosa, mas pouca gente criativa” — e diz que, no Brasil, o público geral é desinformado quando o assunto é música.

Leia abaixo a entrevista com BiD.

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Como surgiu seu novo disco, Bambas Dois? Eu estava de passagem pela Jamaica, durante a minha primeira visita ao país, no começo de 2009. Fui fazer um videoclipe com um pessoal e passeamos de barco pelas águas do Caribe. Nessa hora, coloquei o CD do Chico César, que é um dos últimos que eu produzi (Francisco, Forró e Frevo) e o piloto começou a cantar em cima, improvisando. Foi aí que veio toda a ideia. Eu e o Gustah (produtor que trabalhou com ele no disco) fomos atrás dos colaboradores, pedimos grana emprestada para os bancos… Só depois é que a Natura Musical se interessou e resolveu patrocinar o projeto. Compus as músicas e gravamos as bases aqui com músicos brasileiros — Dominguinhos, Luiz Melodia, Chico César, Daniel Ganjaman, Siba, Céu, Anelis Assumpção e Lucio Maia, entre outros — e levamos tudo para a Jamaica, para terminar lá.

Você sempre gostou de misturar gêneros. Pois é, eu já venho brincando com mistura há um tempão. Estou sempre atrás de boas combinações. O Gilberto Gil já tinha se aventurado em misturar forró e xote com reggae, mas acredito que eu tenha ido mais a fundo. Eu percebi que dancehall combina com maracatu, rastapé com ska e rocksteady, essas coisas. Eu fui atrás de outros ritmos e descobri que vários deles conversam entre si. Mas esse é o projeto mais interessante que eu já fiz até hoje. Nunca foi feito nada parecido.

Por que escolheu esses colaboradores jamaicanos? A gente fez uma lista do nosso time dos sonhos, e felizmente todos os que a gente queria deram certo. Só faltaram Gregory Isaacs, que morreu pouco antes de irmos para a Jamaica gravar, Jimmy Cliff e Peter Tosh. Também tinhamos convidado o Gil, eu queria muito que ele fosse a cereja do bolo, mas estava com a agenda lotada.

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Qual sua visão da indústria hoje? Estou um pouco desiludido com a indústria e com o papel do produtor. O artista começa a tocar no rádio, e o cachê dele, que era de 5.000 reais, vira 15.000. Mas o produtor recebe pelo disco apenas e depois não vê mais nada, não tem nenhum tipo de reconhecimento. Hoje, não se vende mais discos, então o produtor não tem de onde tirar dinheiro. O produtor antes acompanhava o sucesso do trabalho, agora não, só o artista que faz show. É por isso que, daqui para a frente, só quero fazer o que gosto e com quem me identifico. A menos que venha alguém com milhões. Eu trabalho para sobreviver, mas quero fazer trabalhos que durem.

A velocidade hoje é outra. Sim. Tem muito artista e muito lançamento. Tem muita gente fazendo disco em casa, porque os equipamentos são mais baratos hoje. Acho que cada vez mais vai ficar só quem é criativo, mesmo, uma porcentagem pequena. O triste é que a molecada atual me parece usar a música e jogar fora, como se fosse uma pasta de dente ou um sabonete.

Quem você acha que vai durar e quem não vai? Tem muito lixo, prefiro não citar nomes, mas 70% da música feita hoje é lixo. Tem um monte de coisa de que eu gosto, mas acho difícil falar um nome ou dois. Acho o Criolo um ótimo artista, porque tem um carisma grande no palco, a Karina Buhr também tem uma musicalidade incrível. São esses dois que eu mais ouço no carro. E algumas big bands como a SpokFrevo, que é uma banda ótima. O Criolo eu vi em um show quando ele ainda não era famoso, e fiquei chocado. Pensei: ‘Que cara louco’. Queria eu ter trabalhado com o Criolo…

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O que você vai fazer esse ano? Acabei de produzir o novo disco do Eddie, uma banda de Pernambuco, e estou começando a trabalhar o disco do MC Marechal. Vou fazer também a trilha do documentário do Joãosinho Trinta, dirigido pelo Paulo Machline (diretor de Natimorto, de 2009). Quero girar o mundo com o Bambas no segundo semestre. Acho que fora do Brasil vão dar mais atenção do que aqui, porque o disco é cantado em inglês, e também porque países na Europa têm muita curiosidade com esse tipo de música. Lá fora, os convidados vão agregar. Quando eu trouxe o Sizzla para tocar no festival Natura Nós, ninguém sabia quem era ele. Eu descobri que não faz diferença qual jamaicano você traz ao Brasil, porque, na grande maioria, as pessoas aqui são muito desinformadas.

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