O Brasil onde nasceu, a Europa onde vive há 25 anos e o Oriente, uma de suas paixões, são as inspirações do estilista Gustavo Lins, que buscou resumir sua vida, suas buscas e encontros na coleção de Alta-Costura que vai apresentar na próxima semana em Paris.
“Eu me coloquei a pensar; tenho 50 anos, o que fiz da minha vida? E decidi resumir nesta coleção os momentos mais importantes da minha vida e do meu trabalho”, declarou Lins em uma entrevista à AFP em seu ateliê no Marais, um dos bairros mais antigos de Paris e hoje um dos mais chiques.
“Esta coleção é o resultado das minhas raízes brasileiras, do meu aprendizado em Barcelona e em Paris e da minha paixão pelo quimono”, afirmou o único latino-americano a fazer parte do exclusivo clube da Alta-Costura, protegido na França com uma série de exigência, entre elas de que as criações tenham que ser costuradas à mão.
Os desenhos de Lins, formado em arquitetura no Brasil e que depois estudou em Barcelona, se destacam pelo rigor do corte e as formas quase arquitetônicas das peças, onde nenhum detalhe é aparente e os materiais, sedas finas, tafetás, caxemiras, têm um caimento que envolve o corpo.
Sua roupa parece fácil de usar, simples. “A simplicidade é o mais difícil de obter e o mais elegante, o mais chique”, afirma Lins, lembrando que este trabalho de Alta-Costura pode ser feito em Paris porque aqui estão “os melhores trabalhadores e artesãos do mundo, advindo de todo o planeta”.
“Mas não se pode continuar fazendo Alta-Costura como há 50 anos. O que eu faço não é um corpete com barbatanas: é para uma mulher atual, que está em uma corrida contra o tempo e que quer, necessita, de uma roupa fácil, que siga seu movimento”.
“O século XX já acabou. Devemos buscar novas referências, novos códigos, uma nova ética. Devemos ver o corpo de outra forma”, diz o estilista, que com sua fala suave e pausada expressa suas convicções sobre o mundo atual.
“Serão anos difíceis para a Europa, de muito conflito. E a moda não escapa disso. Nós, os criadores, devemos expressá-los, não devemos viver na nostalgia do passado”, afirmou Lins, que na entrevista compartilhou lembranças e histórias fascinantes que revelam sua cultura e sensibilidade.
“O estalar da seda, do tafetá, é importante, como no conto da cortesã que escutava atrás da porta par saber qual de suas rivais ia visitar o Imperador naquela noite”, conta Lins, que trabalhou como aprendiz em grandes maisons de moda de Paris, como as francesas Louis Vuitton e Jean Paul Gaultier, além da japonesa Kenzo.
Esta é a primeira vez que em suas coleções não vai apresentar quimonos, sua peça emblemática. “Mas todas as roupas foram concebidas como o quimono japonês. Muitos dos vestidos têm um padrão retangular, e é o jogo de costuras e pregas que criam o volume”.
“Também nesta coleção retomei as roupas masculinas, como abrigos, para vestir a mulher”, diz Lins, enquanto veste uma bela modelo lituana com um abrigo masculino, acompanhado com uma pantalona de seda e um cachecol largo, adicionando um toque feminino, glamuroso.
“Para mim é Yves Saint Laurent o costureiro que entendeu como usar um corte masculino e transformá-lo em feminino”, disse Lins, manifestando uma total admiração, quase reverência, pelo estilista falecido em 2008.
Gustavo Lins lembrou também que esta é a primeira vez que apresentará uma coleção salpicada de cores vivas, como o verde esmeralda, inspirado nas pedras preciosas de sua Minais Gerais natal, o vermelho e o branco, “e como de costume, o preto”. Mas nesta coleção o preto vem saturado de vermelho e azul.
A coleção reflete também o impacto que causou a Gustavo uma visita que fez em dezembro à Andaluzia.
“Fiquei fascinado com a maneira como as mulheres usam esses vestidos cheios de babados”, explicou Lins, que após essa viagem ao sul da Espanha se pôs a criar tecidos estampados com círculos, com os quais fez calças e vestidos em sedas e musselina, com acabamentos em pele.
“Para esta coleção criei 35 desenhos, dos quais seis masculinos, que vou apresentar pela primeira vez na sede da Embaixada do Brasil na França”, disse o estilista, que criou sua própria marca em 2003 e agora vende no mundo inteiro, especialmente na Ásia e Europa.