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‘Flores Raras’ será um filme “para o mundo”, diz Bruno Barreto

Em Pedro do Rio, na casa que reproduz o ambiente da fazenda Samambaia, diretor explica como constrói a história do filme que pretende inscrever no Festival de Berlim. "Meu ideal seria algo com a poesia e a complexidade de 'As Horas' e a emoção e a escala épica de 'Entre Dois Amores'

Por Carlos Helí de Almeida, de Pedro do Rio (RJ)
9 jul 2012, 07h46

“A sexualidade das personagens não é o foco principal do filme, mas é um aspecto importante da história”, observa Barreto

Dezessete anos atrás, quando a produtora Lucy Barreto comprou os direitos de adaptação do livro Flores Raras e Banalíssimas, de Carmen Lucia de Oliveira, sobre o relacionamento entre a arquiteta brasileira Lota de Macedo Soares (1910-1967) e a poetisa americana Elizabeth Bishop (1911-1979), o diretor Bruno Barreto chegou a desdenhar do projeto. O realizador carioca só retomou interesse pela história de amor entre a idealizadora do Parque do Flamengo, no Rio, e a ganhadora do Prêmio Pulitzer de 1956 quase 10 anos depois, quando se separou da atriz americana Amy Irving.

“Estava deprimido, arrasado com a separação, e a Amy tinha acabado de fazer o monólogo Um Porto para Elizabeth Bishop, de Marta Góes, em Nova York. Comecei a me ver na dinâmica entre Bishop, a mulher fraca que sabia lidar com as perdas, e Lota, a mulher forte, que não. Sou como a Lota, um péssimo perdedor. Acho que, na época, reativei a ideia de fazer o filme sobre elas para reconquistar a Amy”, confessou Barreto na última quinta-feira (5), entre as garfadas do break de almoço das filmagens de Flores Raras, que está sendo rodado em um sítio de Pedro do Rio, na região serrana fluminense.

A bela propriedade, cuja casa principal, de estilo modernista, foi projetada pelo arquiteto Oscar Niemeyer e é cercada por jardins projetados por Burle Marx (1909-1994), representará nas telas a fazenda Samambaia, em Petrópolis, onde Lota e Elizabeth viveram grande parte de seus 15 anos de relacionamento. “A Samambaia tem um significado importantíssimo dentro da trama. É o shangrilá delas, um lugar onde elas podiam ter mais privacidade. Foi no terreno da fazenda que Lota construiu um estúdio para Elizabeth, e foi lá que a poetisa viveu a parte mais produtiva da carreira”, explicou o diretor carioca de 57 anos.

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Na versão dirigida por Barreto, rodada ao custo de 13 milhões de reais, Lota é interpretada Gloria Pires. A australiana Miranda Otto, da popular trilogia O Senhor dos Anéis, vive a introvertida Elizabeth Bishop. A americana é apresentada à brasileira por Mary, compatriota da poetisa e ex-amante de Lota, vivida na tela por Tracy Middendorf, que tem no currículo participações em séries de TV como Lost, Law & Order: Special Victims Unit, CSI, e 24 horas. “O entrosamento entre nós três é ótimo, o que é fundamental para a história”, contou Gloria, durante um dos intervalos dos trabalhos.

Lota é o terceiro de uma série de personagens vividos por Gloria nos últimos anos inspirados em mulheres reais: em Lula, o filho do Brasil (2009), ela foi Dona Lindu, mãe do ex-presidente brasileiro; em Nise da Silveira, de Roberto Berliner, ainda inédito, encarna Nise da Silveira (1905-1999), fundadora do Museu do Inconsciente. “Nossa cultura está repleta de mulheres fortes, é muito bom que o cinema brasileiro esteja resgatando algumas delas”, comentou a atriz. “Lota enfrentou preconceitos de toda ordem pois, além de homossexual,era uma autodidata, uma arquiteta sem diploma. Apesar de tudo, deixou obras como o Parque do Flamengo”.

Ficção e realidade – Barreto recria o relacionamento de 15 anos entre Lota e Elizabeth Bishop com a ajuda da ficção. No filme, as duas se conhecem quando a poetisa recebe uma homenagem na embaixada americana, que na época ficava no Rio, então capital federal. Na vida real, Lota conheceu Elizabeth durante uma viagem a Nova York. “O livro da Carmen serviu apenas como ponto de partida para o roteiro estruturado por Carolina Koscho, que passou depois pelas mãos do diretor e roteirista americano Matthew Chapman, porque a maior parte dos diálogos é falada em inglês”, observou o diretor.

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No filme, Barreto promove a reconciliação entre Lota e seu pai, José Eduardo de Macedo Soares, dono de um dos maiores jornais da época, o Diário Carioca – a arquiteta e paisagista deixara a casa da família aos 25 anos, desgastada pela a separação dos pais. Na ficção, o reencontro é intermediado por Elizabeth, e acontece durante a cerimônia de inauguração do Parque do Flamengo, em 1965. “Não estamos fazendo uma biografia da Lota nem da Elizabeth, mas filmando a história de amor entre elas, duas mulheres de temperamentos opostos, porém complementares”, reforçou Barreto.

O diretor não se aborrece quando alguém se refere a Flores Raras como um filme de amor gay. “A sexualidade das personagens não é o foco principal do filme, mas é um aspecto importante da história”, observa o autor de Dona Flor e Seus Dois Maridos (1976) e O Beijo no Asfalto (1981), entre outros sucessos nacionais. “Mas de maneira alguma eu escamoteio a situação delas. Até porque o relacionamento entre Lota, Mary e Elizabeth refletem bem a mentalidade do país na época. Quando Elizabeth chega ao Rio, ela pergunta a Mary, na época ainda amante da Lota: ‘Como é aqui?’. E ela responde: ‘Eu e a Lota somos muito discretas. Acho que somos um pouco além da imaginação para eles”, contou.

Barreto pretende inscrever Flores Raras no próximo Festival de Berlim (fevereiro de 2013), onde competiu com O Que É Isso, Companheiro (1997). “Estamos fazendo um filme para o mundo, sobre um assunto que desperta a curiosidade também no exterior, porque o trabalho da Elizabeth Bishop só começou a ser descoberto nos últimos dez anos. Até então, mesmo nos Estados Unidos poucos conheciam os textos dela. Meu desafio é contar essa história de maneira acessível, mas sem simplificá-la. Meu ideal seria algo com a poesia e a complexidade de As Horas (2002) e a emoção e a escala épica de Entre Dois Amores (1985).

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Correção: Em uma versão anterior, este texto afirmava que o filme de Roberto Berliner, ainda inédito, sobre a fundadora do Museu do Inconsciente chama-se Engenho de Dentro. O nome correto do longa é Nise da Silveira (o texto já foi corrigido). Engenho de Dentro é o local onde o filme foi rodado.

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