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Fernando Henrique Cardoso toma posse na ABL

Ex-presidente comparou a transmissão de cadeiras ao ritual de condução da tocha olímpica e se disse "comovido por sentar em tão ilustre companhia"

Por Pollyane Lima e Silva, do Rio de Janeiro
10 set 2013, 22h01

“Como no passado dos oráculos, a história nos pregou uma peça: ‘decifra-me ou te devoro!’ é o enigma que as ruas, sem o proclamar, deixam entredito sobre a democracia atual.”

O sociólogo e ex-presidente da República Fernando Henrique Cardoso, 82 anos, tomou posse na noite desta terça-feira na Academia Brasileira de Letras (ABL), em cerimônia no Salão Nobre do Petit Trianon, no Rio de Janeiro. Ele passa a ocupar a cadeira 36, que foi do jornalista e escritor paulista João de Scantimburgo, morto em março. FHC foi eleito em junho, ao receber 34 votos dos 39 possíveis.

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“A ABL funciona como a tocha olímpica: ao passar diplomas uns a outros, seus membros mostram a continuidade do respeito à cultura”, disse, logo após ser recebido com aplausos no salão nobre da ABL. Fernando Henrique agradeceu a escolha de seu nome, disse estar “comovido por sentar em tão ilustre companhia” e feliz com a “responsabilidade de simbolizar valores tão fundamentais” no país. “O que importa é o culto permanente à cultura, à língua que a expressa, à paz, à liberdade e à dignidade humana, valores que se servem de nós, mortais, para permanecerem imortais.”

FHC comentou os constantes protestos que tomam as ruas há mais de três meses, e definiu o momento atual como uma “crise da democracia representativa” em todo o mundo. “Não é só o oprimido que se manifesta. Há um novo tipo de pressão no Brasil e no exterior. Não estamos diante de uma elite que sabe e de um povo que desconhece. Não há tempo a perder para reconstruir a democracia e as instituições para captar os reais interesses da população”, declarou, ressalvando que é preciso “evitar que a violência ocupe a cena”.

E continuou: “Como no passado dos oráculos, a história nos pregou uma peça: ‘decifra-me ou te devoro!’ é o enigma que as ruas, sem o proclamar, deixam entredito sobre a democracia atual. Cabe a todos nós, políticos, artistas, escritores, cientistas ou, simplesmente, cidadãos que prezam a liberdade, passarmos da escuta à ação, para tecer os fios institucionais pelos quais possam fluir os anseios de liberdade, participação e maior igualdade dos que clamam nas ruas”.

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Cadeira 36 – Em cerca de uma hora de discurso de posse, FHC ainda exaltou cada um de seus antecessores e citou o envelope deixado por João de Scantimburgo, lacrado para ser aberto apenas pelo sucessor. O documento, contou o novo imortal, resume vida e obra do colega que não chegou a conhecer pessoalmente, com destaque a uma das atividades que mais prezava, o jornalismo.

A cadeira número 36 tem como fundador o poeta, professor e jornalista Afonso Celso, que escolheu como patrono o também poeta Teófilo Dias, sobrinho do escritor Gonçalves Dias. Ela já foi ocupada pelo médico e escritor Clementino Fraga (1939-1971), pelo cientista e ensaísta Paulo Carneiro (1971-1982) e pelo diplomata, filósofo e sociólogo José Guilherme Merquior (1983-1991).

Na mesa de autoridades coordenada pela presidente da ABL, Ana Maria Machado, estavam o senador Aécio Neves (PSDB) – representando o presidente de Senado, Renan Calheiros (PMDB) -, o presidente da Câmara dos Deputados, Henrique Eduardo Alves (PMDB-RN), e o governador de São Paulo, Geraldo Alckmin (PSDB). Na plateia, artistas, escritores e outras personalidades políticas, como o também peesedebista José Serra.

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Na opinião de Aécio, Fernando Henrique leva sangue novo à Academia, fazendo dela uma casa mais aberta à sociedade. “Ele é uma simbiose rara do intelectual, do pensador e do executor. E como pensador extremamente qualificado, fez em seu discurso um alerta para aqueles que tentam desqualificar a nossa democracia. É preciso promover a reconciliação da sociedade brasileira com seus representantes”, declarou o senador, após a cerimônia de posse.

Alckmin também enfatizou o “grande recado” deixado pelo ex-presidente, “de insatisfação geral com o atual modelo de democracia” no país. “Temos mais de 30 partidos. Essa fragmentação fragiliza muito as instituições”, disse. Serra, por sua vez, acrescentou que essa visão de FHC mostra a contribuição de alguém que viveu a vida pública e, ao mesmo tempo, a analisa. “Não é apenas um ator, mas também um grande analista de ideias e de processos.”

Trajetória – Fernando Henrique Cardoso nasceu no Rio de Janeiro no dia 18 de junho de 1931, em uma família tradicional de militares. Mudou-se para São Paulo aos 8 anos e graduou-se em sociologia pela Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras da Universidade de São Paulo (FFLCH/USP), completando seus estudos de pós-graduação na Universidade de Paris.

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Após o golpe militar de 1964, exilou-se no Chile e voltou para a França, onde acompanhou de perto o movimento de Maio de 1968. Retornou ao Brasil naquele mesmo ano, quando se tornou professor de ciências políticas na USP, onde teve uma frutífera carreira acadêmica e é hoje professor emérito – ele também lecionou nas Universidades de Paris, Stanford, Berkeley e Brown, entre outras.

É autor ou coautor de 23 livros e de mais de cem artigos acadêmicos. Seu livro Dependência e Desenvolvimento, publicado originalmente em espanhol em 1969, em coautoria com Enzo Falletto, é um marco nos estudos sobre a teoria do desenvolvimento, com dezenas de edições em 16 idiomas. Seus livros mais recentes são O Presidente Segundo o Sociólogo (1998), A Arte da Política (2006), The Accidental President of Brazil (2006), Cartas a um Jovem Político (2006) e A Soma e o Resto: Um Olhar Sobre a Vida aos 80 Anos (2011). Seu último livro é Pensadores que Inventaram o Brasil.

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A carreira política começou em 1978, quando foi eleito suplente de Franco Montoro para o Senado pelo MDB (Movimento Democrático Brasileiro). Antes de chegar à Presidência, cargo que ocupou por dois mandatos (de 1995 a 2002), foi Senador (de 1983 a 1992), ministro das Relações Exteriores (1992) e ministro da Fazenda (entre 1993 e 1994).

Fernando Henrique era casado desde 1952 com a antropóloga Ruth Cardoso, que morreu em 2008, em decorrência de problemas cardíacos. Com ela, teve três filhos: Paulo Henrique, Luciana e Beatriz. Atualmente, é membro do The Elders – grupo de dez líderes globais criado por Nelson Mandela para defender a paz e os direitos humanos, do qual também fazem parte Jimmy Carter (ex-presidente dos EUA), Desmond Tutu (arcebispo emérito na África do Sul) e Kofi Annan (ex-secretário-geral da ONU), entre outros.

VÍDEOS – Entrevista com FHC

Parte 1: ‘Tarifa do transporte foi apenas o curto-circuito’

Parte 2: ‘Dilma tenta, mas não sabe fazer’

Parte 3: Política externa de Dilma tem visão equivocada’

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