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David Nicholls: ‘Tom agridoce é mais real que o sentimentalismo’

Por Meire Kusumoto Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO 29 ago 2015, 10h01

Autor do fenômeno de vendas Um Dia, que virou filme com Anne Hathaway em 2011, vem ao Brasil para participar da Bienal do Livro do Rio. Na mala, mais do que títulos que vendem como água: uma boa narrativa, críticas elogiosas e uma indicação ao Man Booker Prize

>>>Continuação da entrevista de David Nicholls ao site de VEJA, que começa aqui.

Foi difícil escrever Nós após o sucesso estrondoso de Um Dia? Na verdade, Nós foi escrito rapidamente e me trouxe muito prazer. Mas nos dois anos seguintes a Um Dia foi impossível pensar ou falar sobre qualquer outra coisa senão… Um Dia. Depois, eu comecei a trabalhar em vários projetos de roteiro e passei cerca de um ano escrevendo coisas que eu sentia, do fundo do coração, não serem tão fortes ou agradáveis quanto Um Dia. Eu tinha horror a escrever um romance desapontador, então joguei muita coisa fora antes de chegar a um livro que me desse orgulho.

Alguma das atitudes de Douglas espelha a sua experiência como pai? Felizmente, não – meu filho tem apenas 9 anos e gosto de pensar que somos grandes amigos. Mas acredito que escritores tendam a escrever sobre as suas maiores ansiedades e medos, as suas preocupações. Eu já fui um adolescente, claro, o que é um período difícil para pais e filhos. Adolescentes naturalmente querem se definir, em geral como opostos dos pais. Eu passei por esse estágio e suspeito que terei que lidar com isso no futuro, como pai.

Você escreve sobre amor, arte e vida moderna, mas seu principal tema parece ser relacionamento. Ao contrário do que acontece com alguns livros que também tratam do assunto, porém, os seus romances não soam bregas ou superficiais. Qual o segredo? Sinto ter um instinto natural para evitar o sentimentalismo ao escrever. Não acho que isso seja necessariamente admirável – as grandes emoções podem ser maravilhosas na literatura, assim como são na vida – mas a tristeza, a ansiedade, o constrangimento e o arrependimento estão sempre à espreita, mesmo nos nossos momentos de maior alegria, e eu gosto de refletir isso no que escrevo. Não quero dizer que os meus livros sejam cínicos, maldosos ou deprimentes. Só que o tom agridoce me parece mais real, e também mais comovente, do que o sentimentalismo.

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Assim como Um Dia, Nós conta a história de um casal formado por duas pessoas muito diferentes que acabam se apaixonando e se casando. Mas em Nós o casamento não é mais o mesmo após Douglas e Connie passarem cerca de duas décadas juntos. Acha que Emma e Dexter, de Um Dia, poderiam enfrentar os mesmos problemas que o outro casal caso envelhecessem juntos? Talvez sim. A paternidade muda as pessoas de forma ampla, e não tenho certeza de como Dexter, em particular, teria lidado com isso. Ao mesmo tempo, sou um tanto sentimental quanto ao relacionamento de Emma e Dexter. Gosto de pensar que eles teriam resolvido todas as questões.

Seus outros livros retratavam pessoas mais jovens. Por que decidiu mudar isso em Nós? Bom, estou com 48 anos, não tenho um encontro há 18 anos, então naturalmente minhas preocupações mudaram. Além disso, eu sempre evitei os temas família e paternidade, mas são assuntos importantes e senti que estava na hora de lidar com eles.

Você trabalhou e ainda trabalha com roteiros para o cinema e para a televisão. Escreve um romance já pensando na possibilidade de adaptá-lo? De maneira nenhuma. Há coisas que você pode fazer em um romance que não funcionam bem nas telas, e eu faço largo uso desses elementos. Monólogos interiores, o envelhecimento de personagens, histórias contadas em pequenos episódios, diferentes pontos de vista, tudo isso funciona melhor nas páginas de um livro, e eu amo não ter que pensar sobre orçamento, duração, escalação de atores etc. Escrevo o melhor que posso, não um roteiro disfarçado. Ao mesmo tempo, eu gosto de personagens, diálogos, narrativas, piadas e finais apropriados, então, a história pode funcionar na tela, ótimo. Só não é minha intenção.

Dois de seus livros foram adaptados para o cinema com roteiro de sua autoria. Você temia pelas suas histórias caso outros roteiristas fizessem esse trabalho ou isso aconteceu naturalmente, já que você já escrevia para o cinema? Foi natural eu mesmo adaptar, mas sim, havia certa dose de possessividade. Porém, é impossível proteger seu trabalho ao adaptá-lo – você ainda tem que ser impiedoso e cruel, e o autor que faz isso com seu próprio romance vai ter suas decisões eternamente atropeladas. Então eu decidi nunca mais fazer isso. É muito doloroso. Nós será adaptado para a TV, mas por outro escritor, graças a Deus.

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O que é mais fácil para você, escrever um romance, um roteiro para o cinema ou para a televisão? Por quê? Filme é uma batalha – uma batalha para conseguir fazer e para impor sua visão. Impõe muita competição, e eu não sou uma pessoa naturalmente competitiva. Mas eu amo colaborar em filmes – é um clichê, mas romancistas se sentem solitários e aos roteiristas, por outro lado, nunca falta assunto. Também amo trabalhar com atores, então odiaria não fazer nada na TV ou no cinema. Ao mesmo tempo, o megalomaníaco que existe em mim adora o controle exercido ao se escrever ficção.

Está trabalhando em um novo romance? Quais são seus futuros projetos? Infelizmente não, embora eu quisesse estar. Estou escrevendo minha primeira peça de teatro e trabalhando em uma versão para a televisão dos maravilhosos romances de Edward St Aubyn, a série de Patrick Melrose. Adoraria estar escrevendo ficção, mas as boas ideias são raras e eu não trabalharia em um romance a não ser que sentisse algo forte por ele, a não ser que estivesse preparado para que ele se tornasse uma obsessão. Quando a ideia vier, eu vou me jogar.

Já veio ao Brasil alguma vez? Será a minha primeira visita à América do Sul e estou animado. Tudo o que sei sobre o país são os clichês, e estou empolgado para começar a enxergar além deles.

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