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‘O aprendizado não pode ser solitário’

Especialista em educação da Finlândia diz que o Brasil precisa se desprender da escola do passado para estar entre os melhores do mundo

Por Maria Clara Vieira
Atualizado em 18 out 2018, 17h20 - Publicado em 18 out 2018, 17h02
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  • Mestre em educação pela Universidade de Helsinque, Anneli Rautiainen é chefe do Centro de Inovação da Agência Nacional de Educação do governo finlandês. A instituição é responsável pela educação infantil e básica e pela formação de professores no país detentor do título de melhor sistema de ensino do mundo. Anneli já atuou como professora e diretora de escola — conhece, portanto, o assunto em teoria e prática. Este ano, esteve no Brasil em nome do centro que comanda para a assinatura de um acordo com o Instituto Ayrton Senna, parceria que prevê o compartilhamento de informações entre os dois países para a adoção de inovações nas escolas. A seguir, os principais trechos da entrevista que concedeu a VEJA.

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    Muitos educadores estão tentando fazer bom uso da tecnologia em sala de aula, mas muitas vezes ela não leva a lugar nenhum. Por quê? Um dos erros mais comuns aos países que tentam incorporar ferramentas tecnológicas à sala de aula é justamente colocar a tecnologia em primeiro lugar e achar que ela, sozinha, vai resolver todos os problemas da sala de aula. Usar o computador ou o tablet não é o propósito da educação. O importante é integrar o uso destas ferramentas a uma proposta pedagógica que ensine o aluno a pensar.

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    A escola deste século XXI deve menos conteudista? Sem dúvida. Na Finlândia, nos concentramos muito mais em habilidades do que em disciplinas. É claro que as ideia não é jogar fora todo o conhecimento de matemática ou gramática, mas é muito importante que os alunos saibam construir pontes entre as matérias. Limitamo-nos a ensinar o que é essencial em todas elas e incentivamos que os estudantes aprofundem seu conhecimento conforme seu interesse. Pelo menos uma vez no ano eles devem apresentar um projeto que conecte as diferentes matérias. Se um aluno quer falar sobre poluição, por exemplo, deve procurar os professores que vão ajudá-lo a propor soluções que contemplem mais de uma via.

    As disciplinas tradicionais tendem a deixar de existir? Não completamente. A tendência é que estejam cada vez mais misturadas umas com as outras, mantendo-se, claro, o conteúdo necessário de cada área. Na Finlândia elas ainda são divididas em respeito à decisão do parlamento, da qual eu, particularmente, discordo. Acho que já deveríamos estar em uma fase mais holística do aprendizado. A vida real não acontece em compartimentos separados.

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    Por que este modelo mais flexível de matérias conversa com o século XXI? O mercado de trabalho está mudando tão rápido que os jovens vão precisar de habilidades que os tornem indispensáveis nesse mundo novo mundo tomado pela tecnologia. Por isso insisto que é preciso aprender a pensar, ao invés de simplesmente armazenar dados na cabeça. Não podemos esquecer também das habilidades sócio emocionais, tão importantes. Os melhores especialistas da educação estão priorizando a empatia, o pensamento crítico, a criatividade, a colaboração no lugar de um monte de conteúdos.

    Como se dá o ensino destas habilidades na Finlândia? Ele está previsto no currículo. Nossos professores sabem, por exemplo, que um estudante do 5ª ano deve aprender a solucionar uma equação básica e a expor seus argumentos sem discutir — e são treinados a propor, eles mesmos, atividades que desenvolvam estas características. Outro ponto que incentivamos em toda o país é que os professores se concentrem, desde cedo, em identificar e ressaltar os pontos fortes de cada criança, para que elas sejam instadas a explorar os próprios interesses.

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    Os estudantes são nativos digitais. Os professores, não. Cabe aos alunos ajudar seus mestres no contato com a tecnologia? Com certeza. Temos escolas onde os alunos já estão ensinando seus mestres a lidar com o mundo digital. Há alguns anos, uma professora veio falar comigo dizendo que não usaria tecnologia até saber aplicar todos os dispositivos. Disse a ela que esse dia nunca chegaria e sugeri que simplesmente deixasse o computador na sala para ver o que acontecia. As crianças descobriram tudo sozinhas. Não importa quem ensina quem, contando que o aprendizado aconteça. É como a vida funciona, afinal. Quem sabe ajuda os outros.

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    Isso não esvazia o papel dos professores? Não. Eles continuam a ter função central na educação, mas não são a única fonte do conhecimento. São facilitadores, ativadores do aprendizado. Sua tarefa é estimular o ambiente, encorajar a criança, estar lá para ela.

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    Como deve ser a sala de aula do futuro? Talvez seja como um restaurante self service mais sofisticado, onde você vai, se serve do que quer, mas conta com suporte. O modelo de hoje, com um monte de alunos sentados olhando para a lousa, vai desaparecer com o tempo. Também tenho certeza de que os professores sempre serão indispensáveis, pois o aprendizado não pode ser solitário. Precisamos de interações, de uma forma ou de outra.

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    Brasil e Finlândia são países muito diferentes. O que nós podemos aprender um com o outro? Não podemos comparar plenamente as condições devido às diferenças sociais, culturais e históricas. Mas podemos nos ajudar. Espero que o acordo que assinei ajude a desenvolver professores mais atentos às necessidades dos alunos. Li a Base Nacional Comum Curricular brasileira e achei excelente. Está no caminho certo.

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