Tatiana Oliveira, de 22 anos, que se define como parda, valeu-se do sistema de cotas para ingressar no curso de Pedagogia da Universidade Federal de Santa Maria no início de 2009, mas não conseguiu cursar sequer o primeiro semestre de aula. No dia 18 de março, foi chamada para uma entrevista na faculdade. Sem saber sobre o que se tratava, Tatiana foi interrogada pela Comissão de Implementação e Acompanhamento do Programa de Ações Afirmativas de Inclusão Racial e Social da UFSM. Os entrevistadores lhe perguntaram se já havia sofrido algum tipo de preconceito racial. �Eu disse que nunca tinha sofrido discriminação. Contei que, como meu pai é pardo e minha mãe é branca, considero-me menos parda que meu pai. Mas sempre me senti afro-descendente. Meu avô é negro�, diz Tatiana.
Um mês depois da entrevista, ela foi avisada pela coordenadora de seu curso que sua matrícula havia sido cancelada e que não poderia mais assistir as aulas. �O sistema de cotas era uma oportunidade e jamais achei que fosse sofrer preconceito justamente nesse momento�, diz Tatiana, que entrou na justiça para recuperar o direito de estudar. O caso da estudante gaúcha mostra que o que está em avaliação no sistema de cotas universitárias não é a cor da pele nem a condição financeira do candidato, mas sua consciência de raça.
Chance – O pai de Renato Lima nunca frequentou a escola. Sua mãe trabalhou como empregada doméstica antes de se casar. Juntaram suas economias e abriram uma pequena loja de conserto e revenda de aparelhos de ar condicionado. A renda obtida com o pequeno negócio não era suficiente para colocar as quatro crianças em uma escola particular. O casal passou, então, a poupar para pagar o curso pré-vestibular dos filhos. Seu esforço foi recompensado. O caçula Renato ingressou em engenharia na Universidade Federal do Rio de Janeiro. Depois de formado, passou em um concurso da Petrobras. Aprendeu inglês por conta própria ouvindo cursos de fita cassete. Depois, fez mestrado em Engenharia Química.
Um convite da Braskem levou Renato a trocar a segurança de um emprego estatal por uma renda maior. Mudou-se, então, para Salvador. Lá, tornou-se professor da Universidade Federal da Bahia. Há um ao, fez mais uma mudança: trocou a Braskem por um cargo de diretor na Camargo Corrêa na África. �O grande salto quem deu foi meu pai, que saiu da miséria e foi capaz de ajudar os filhos a estudar. Eu me esforcei muito, porque era uma chance só. Ou estudava e conseguia um bom emprego, ou iria passar o resto da vida em um trabalho braçal�, diz Renato, que, hoje, tem 44 anos.