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‘Temos de educar nossas crianças para uma democracia melhor’

Nome forte do grupo de Marina Silva, a educadora Neca Setubal afirma que a participação social nas eleições foi grande, porém, é preciso melhorar o nível

Por Talita Fernandes
8 nov 2014, 14h54

Coordenadora do programa de governo de Marina Silva na disputa pelo Palácio do Planalto, a educadora Maria Alice Setubal, mais conhecida por Neca, promete continuar empenhada no campo político após o fim das eleições. Em entrevista ao site de VEJA, ela disse que a prioridade é retomar, junto com Marina, o projeto de criação da Rede Sustentabilidade, partido idealizado pela ex-senadora que não conseguiu aprovação da Justiça Eleitoral para ser criado. Alvo de fortes ataques da campanha de Dilma Rousseff por ser uma das herdeiras do banco Itaú, Neca defende ainda a melhora da educação no país. Segundo a educadora, apesar dos investimentos, houve retrocesso na área nos últimos quatro anos. Neca argumenta que é preciso pensar numa “nova escola” que, entre outras coisas, estimule a qualificação do debate político. Depois de uma campanha marcada por ataques, a aliada de Marina avalia que, embora tenha havido forte participação popular no processo eleitoral, isso se deu “com baixíssima qualidade. Neca evitou falar sobre questões econômicas, mas fez críticas ao governo de Dilma Rousseff, classificando de incoerentes as primeiras ações do governo após a reeleição. “Era previsível que muito do que a Dilma criticava em nossa campanha, ela iria fazer. Mas o que acho mais inacreditável é que, depois de três dias de reeleita, os juros já subiram”, afirma. Leia trechos da entrevista.

A senhora ganhou bastante destaque na campanha de Marina Silva, tanto por ter coordenado o programa de governo do PSB quanto por ter sido alvo de ataques do PT. Como pretende atuar na política a partir de agora?

Eu pretendo continuar dentro da esfera política, mas não dentro do sistema político propriamente dito. Permanecerei com a Marina e com o grupo no campo socioambiental. Vamos pensar em como vamos agir, pois ainda estamos discutindo e amadurecendo uma proposta com passos concretos. Mas, sem dúvida, num primeiro momento, e isso é consenso, vamos retormar a institucionalização oficial da Rede. Esse é o ponto principal. Vamos canalizar nossas energias nessa direção. Depois, temos de pensar qual o timing exato de entrar no Tribunal Superior Eleitoral (TSE) para a revalidação da Rede.

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Quais são seus projetos para melhorar o futuro da educação no país?

Esse tema é alvo de muitas discussões que venho tendo com pessoas e partidos. Tivemos um retrocesso na educação nesses quatro anos e os indicadores mostram isso. Como país, nós não alcançamos as metas, mesmo sendo elas bastante brandas. Nós estamos muito atrasados. Eu tenho a convicção de que a educação tem de ter um olhar suprapartidário. Nós já amadurecemos, temos um Plano Nacional de Educação, ainda que com problemas, mas ele aponta para uma direção. O problema é que muito dessa direção se dá olhando para o retrovisor, para o que não fizemos. Nós temos de olhar para frente, resolver muitos desses problemas pensando na Nova Escola. Temos que pensar em uma escola mais aberta à comunidade, uma escola que repense o seu currículo. Nós temos que educar nossas crianças para uma democracia melhor, mais participativa. Essa campanha foi um exemplo de participação de baixíssima qualidade. Muito participativa, mas de baixíssima qualidade. Nós fizemos uma participação do “nós contra eles” dos dois lados. Houve pouquíssima discussão de país, do que se quer para o país, de programa, de ideias. Temos um papel fundamental que é olhar para frente e saber qualificar esse debate.

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De que forma a educação pode ajudar na melhora do processo político e eleitoral?

O que precisa ser debatido é qual o papel do Executivo, do Legislativo, do Judiciário. Qual é a visão de país, o que significam as propostas. É preciso que haja um foco na leitura, na discussão de texto, na argumentação. A educação tem de ter um papel muito forte na questão da diversidade, do respeito aos direitos humanos, das diferenças, dos grupos. Tudo isso passa pela educação, tanto dentro das escolas, quanto fora, como em centros culturais, museus e teatros. Precisamos de um trabalho do respeito ao outro. Além disso, a educação tem de atuar na sustentabilidade. São três eixos para se trabalhar na escola. São três pontos que personificam o “olhar para frente”.

Um dos principais ataques da campanha do PT contra Marina Silva foi em relação a propostas econômicas, entre elas, a de independência do Banco Central. Além disso, a senhora foi criticada por ser de uma família de banqueiros. Como vê os sinais que Dilma tem dado para a economia?

Era previsível que Dilma fizesse muito do que criticava na nossa campanha. Mas, o mais inacreditável é que depois de três dias de reeleita, os juros já subiram. Outra coisa impressionante é ter na lista dos possíveis ocupantes do Ministério da Fazenda duas pessoas do mercado financeiro. Uma delas é o Trabuco (Luiz Carlos Trabuco, presidente do Bradesco), que parece que não aceitou, e o Henrique Meirelles. Ambos são representantes do setor financeiro. O Trabuco é presidente de um dos maiores bancos privados do país e o Henrique Meirelles veio de um banco internacional. Acho que são as incongruências do PT. Durante a campanha, eles falaram uma coisa. Agora, tudo mudou. Independentemente de esses nomes serem ótimos, já que são pessoas reconhecidamente competentes, não sei como ela vai conduzir a política econômica e evitar a recessão.

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Qual o maior legado dessas eleições, que foram tão apertadas e contaram com fatores tão inesperados?

O fato de a sociedade ter despertado para a participação é um ganho. Agora, resta ver se o governo e as oposições conseguem direcionar essa disposição para uma participação mais propositiva, mais afirmativa do que esta guerra de dois lados. Esse é um potencial possível de ser desenvolvido e aprofundado pela sociedade. Esse é um ponto importante. Outro é pensar que a oposição do país tem de achar seu papel. Não basta aparecer na época das eleições. Esse papel ficou muito fragilizado nesses anos de governo do PT. O PT tinha uma posição de oposição por oposição. E acho que daremos um salto se conseguirmos construir um campo de oposição responsável.

Em 2010, Marina entregou uma carta a Dilma apresentando pontos que considerava importantes. Haverá alguma sinalização parecida agora?

Em 2010 era outro o contexto. A Marina apresentou para a Dilma e para o Serra, que eram então candidatos, uma lista com os pontos que eram parte do nosso programa. A Dilma assinou esses pontos se comprometendo com eles. Porém, não cumpriu. Em 2014, a Marina não quis repetir isso justamente por não ter tido efetividade (nas eleições passadas). O apoio dela ao Aécio estava condicionado aos compromissos programáticos. Se ele tivesse sido eleito, seria outra história, pois ela estaria acompanhando o desenvolvimento desses outros compromissos. Não é o caso da Dilma. Por isso nosso primeiro passo será a Rede. Nós temos de pensar no que queremos e, dentro da Rede, nos fortalecermos como oposição. Nós não queremos ser engolidos ou identificados diretamente com o PSDB, embora o partido possa ser um parceiro. Mas o PSDB tem o seu campo, tem as suas ideologias, tem os seus filiados e a Rede tem um outro campo de atuação;

Em que aspectos a proposta da Rede Sustentabilidade, de participação popular, se aproxima do decreto 8.243/2014, alvo de fortes cr��ticas e um dos primeiros reveses tomados por Dilma na volta do Congresso?

A Marina afirmou, no passado, que concordava com a concepção (do projeto), no sentido da maior participação. Na verdade, muito do que está neste decreto da presidente são conselhos que já existem, mas que precisam ser retomados. O que nós discutimos é que muitos desses conselhos estão desarticulados ou aparelhados. Além disso, falar de uma maior participação da sociedade por meio de um decreto já é uma coisa estranha. Isso vai um pouco de cima para baixo, é contra o conceito (de participação). Outra discordância é quanto à forma de preencher esses conselhos que, como está proposto, fica muito na mão do governo. Então, a gente discorda da forma, embora concorde com a ideia de maior participação.

Como fica a relação do PSB e da Rede?

A Marina já disse que deve deixar a sigla para se dedicar à criação da Rede. Mas não conversamos ainda sobre isso. Não sei quando será essa saída do PSB. Ela ainda está e deve continuar na sigla até a Rede existir. Mas como será essa saída está em aberto. Eu acho que a gente tem que determinar os campos também. No segundo turno, foi uma aliança. Agora, cada um tem o seu espaço. Cada partido vai ter que se rever. Está se falando muito em fusões de partido. Acho que tudo isso vai ficar mais claro no início do ano. Sobre a relação da Marina com o PSB, nesse momento ela continua. A Marina sempre falou desde 2010 e repetiu em 2014 que não faz sentido ser oposição por oposição. A oposição tem de ser, como o termo usado pelo PSB, “responsável”. Se acreditarmos que está correto um projeto do governo, nós vamos apoiá-lo.

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