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Reforma trabalhista desestimula ações na Justiça

Para economistas, a mudança vai criar espaço para que as empresas possam empregar seus recursos para mão-de-obra de forma mais otimizada

Por Felipe Machado Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO Atualizado em 4 jul 2017, 13h08 - Publicado em 4 jul 2017, 08h47

O governo trabalha para aprovar a reforma trabalhista rapidamente para sinalizar aos agentes econômicos que a agenda de reformas está mantida, apesar da crise política que atinge o governo Temer. Apesar de a nova lei dar recursos para as empresas modernizarem seu funcionamento, especialistas em direito apontam que o texto traz vários pontos que podem prejudicar o trabalhador e causar insegurança jurídica.

O Senado deve votar requerimento para urgência para o projeto nesta terça-feira, abrindo prazo para o texto ser levado a plenário em duas sessões administrativas – o que cairia no dia 10 ou 12 de julho.

A proposta aprovada na Câmara foi mantida integralmente, apesar de o próprio relator sugerir que o presidente vete seis itens considerados polêmicos. O eixo da proposta é de que as negociações entre os trabalhadores e empregados tenham validade em relação ao que determina a lei – com exceção de pontos não negociáveis, como férias, 13º salário, pontos relativos a segurança, entre outros. É o chamado “acordado sobre o legislado”, que visa evitar que um trabalhador entre na Justiça para pedir reparação – como compensação de horas ou afins – mesmo que sua categoria tiver concordado com a proposta da empresa.

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Flexibilização

A mudança é bem recebida por economistas, que veem espaço para que as empresas possam empregar seus recursos de forma mais otimizada. Para o professor de economia da FGV Fernando de Holanda Barbosa Filho, a flexibilização na negociação de regras pode aumentar o número de vagas formais porque as empresas poderão ajustar a força de trabalho às necessidades. “Não faz sentido um bar ter o mesmo número de garçons no meio da semana que têm de sexta a domingo”, exemplifica.

O professor de economia do Insper Sérgio Firpo aponta que embora  um eventual aumento de empregos seja um efeito marginal, a possibilidade de negociar a redução na carga horária com diminuição de salário pode ajudar a manter postos de trabalho em momentos de crise como agora. “Se a empresa não tem como manter um trabalhador sob um contrato de 40 horas, a saída é demitir. Uma redução de jornada é ruim para o funcionário, mas pelo menos ele não fica desempregado”, avalia.

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Direitos

O lado negativo da reforma é que, sob o argumento de diminuir as disputas judiciais, existem mudanças que desestimulam que o trabalhador que tenha sido lesado busque reparação na Justiça.

Uma delas é a que diz que os custos de perícia nos processos deverão ser pagos pelos trabalhadores caso percam a causa nos tribunais. Esse tipo de avaliação técnica é feita para determinar quem tem razão em casos como processo por insalubridade ou periculosidade.

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Esse valor deverá ser quitado pelo trabalhador mesmo que ele tenha recorrido à justiça gratuita por não ter condições de pagar a defesa. E pode ser debitado do dinheiro ganho em outros processos trabalhistas, mesmo que não tenham nenhuma relação com aquele perdido. “Hoje, se o pedido for considerado improcedente, quem paga é a União. No ano passado, o TRT-SP pagou cerca de 20 milhões de reais”, explica o presidente do Tribunal Regional do Trabalho (TRT-SP), desembargador Wilson Fernandes.

Outra mudança que desestimula a reclamação na Justiça é a fixação de honorários ao advogado que ganhar a causa. Quem perder a ação, terá que desembolsar entre 5% e 15% do valor da causa para pagar o defensor adversário.  “Indiscutivelmente, vai gerar uma redução muito grande no número de ações. Vai dificultar muito o exercício do direito, mas também vai exigir mais responsabilidade do reclamante”, considera o presidente do TRT-SP.

Além de itens que aumentam os custos no caso de perdas, dois pontos restringem o acesso à Justiça propriamente dito. Os trabalhadores que aderirem a um plano de demissão voluntária (PDV) não poderão processar a empresa por nenhuma falha, pois o texto diz que essa opção “enseja quitação plena e irrevogável dos direitos decorrentes da relação empregatícia”.

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Também, quem tiver curso superior e receber mais do que duas vezes o teto da previdência (ou seja, mais que 11.062,60 reais atualmente), não vai poder questionar na Justiça cláusulas do contrato de trabalho que considerar injustas. Isso porque a lei vai considerar quem estiver nessa condição como capaz de negociar livremente com o empregador em uma série de itens, mesmo que contraponha à CLT ou acordos coletivos.

Menos segurança jurídica

Um dos argumentos para priorizar a negociação é o de dar maior segurança jurídica às empresas, que enfrentariam menos disputas na Justiça. Para a doutora em direito da UnB Gabriela Neves Delgado, o efeito da reforma deve ser justamente o contrário, pois ao mexer em benefícios como tempo de repouso menor e fim da contabilização do deslocamento, a lei vai contra um princípio da lei trabalhista, que é de proteger o trabalhador, que é a parte mais fraca. “Toda legislação trabalhista tem que ser construída para melhoria das condições de trabalho”, explica

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Outro problema é que o “acordado sobre o legislado” também pode ser questionado, pois há legislação que impede que o resultado do acordo seja menos benéfico que o da lei. “Existe uma convenção da OIT que o negociado sobre o legislado só vale se for para melhorar as condições do trabalho. E o Brasil ratificou essa norma, que é supra legal, ou seja, fica entre a lei e a Constituição”, diz o procurador-geral do Trabalho, Ronaldo Curado Fleury.

Sindicatos

A reforma tira o peso dos sindicatos, cujo papel, em tese, é o de igualar a disputa de forças nas negociações, segundo os especialistas. Uma mudança na atuação é a desobrigação de que sejam consultados ou avisados em caso de demissão voluntária. O texto também retira a obrigação de homologação de demissões individuais.

Outra crítica é que a lei não promove mudanças na estrutura sindical além do fim da contribuição obrigatória. Hoje em dia, o trabalhador só pode se filiar ao sindicado da sua categoria profissional, e que atue na região onde trabalha. “Os sindicatos que estão autorizados a negociar são os mesmos”, diz Otavio Pinto e Silva, professor de Direito da USP e livre-docente.

O problema é que muitos deles não têm o preparo necessário para representar seus trabalhadores. “Se for desse jeito, vai ser um fracasso, o movimento sindical não está maduro. Eu já fiz mais de 500 dissídios”, diz Fernandes.

Outro lado

Para o relator da proposta na Câmara, deputado Rogério Marinho (PSDB-RN), a mudança garante as proteções fundamentais e há órgãos fiscalizadores, como o Ministério do Trabalho e o Ministério Público do Trabalho.   Segundo o parlamentar, as novas regras permitem que se retire proteção excessiva do trabalhador, dando espaço para resolver conflitos antes que cheguem à Justiça. “O Estado não pode ser o tutor dos trabalhadores, estes precisam ser livres para escolherem o que lhes é mais benéfico”, escreveu a VEJA.

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