Por que os juros caem na Rússia enquanto sobem no resto do mundo
Desde o aumento disparado na taxa de juros com início da guerra, o Banco da Rússia adotou a política dos cortes, atingindo 11% hoje

O Banco Central da Rússia cortou, nesta quinta-feira, 26, pela terceira vez seguida a sua taxa básica de juros desde a invasão na Ucrânia. A taxa de 14% foi para 11%. O movimento russo é oposto ao que ocorre na maior parte dos países ocidentais. No momento, Estados Unidos, Reino Unido, França e Brasil são exemplos de política contracionista para conter os efeitos da inflação.
A tática da presidente do BC russo, Elvira Nabiullina, à primeira vista, pode parecer contraditória. A inflação robusta no país em guerra passa dos 17%. No entanto, dois indicadores vistos como positivos à Rússia, justificam a redução na taxa de juros: um leve arrefecimento na alta dos preços e a recuperação da moeda russa.
Embora ainda muito elevado, o aumento generalizado nos preços desacelerou de 17,8% em abril para 17,5% em maio, segundo estimativa prévia do Banco Central da Rússia. Um alívio e indício de mais diminuições de ritmo para os próximos meses. Já o rublo teve um pico de dois anos, depois de um recorde de baixa em março, no calor da guerra. Hoje, um dólar equivale a 64.75 rublos, cotação próxima de níveis pré-pandemia.
Em contrapartida, o banco central americano, o Federal Reserve, por exemplo, já indicou que vai seguir no aumento de juros nos EUA para reduzir os efeitos da inflação, que está em mais 8,3%, próxima do recorde de quatro décadas. Já o Brasil, com uma inflação cada vez mais pressionada, também segue na mesma linha. A taxa de juros, por aqui, está em aumento sucessivo desde abril de 2021.
Para o professor da Escola de Economia da FGV-SP, Henrique Castro, os indicadores relativamente positivos na Rússia são resultados da estratégia do banco central do país em impor medidas de controle de capital para mitigar o impacto das sanções econômicas de outros países. Um dessas medidas foi a obrigatoriedade da comercialização de combustível em rublo. “A Europa, embora tentando diminuir a dependência desses insumos da Rússia, ainda está importando. Para evitar maior desvalorização do rublo frente ao dólar, o Banco da Rússia decidiu que todas as compras de petróleo e de gás feitas por países estrangeiros, especialmente da Europa, deveriam ser feitas em rublo, em contas de tinham que ser abertas lá. Com o aumento da demanda pela moeda, evitaram maior desvalorização”, explica Castro.
Inflação e taxa de juros
Poucos dias após a invasão na Ucrânia no dia 24 de fevereiro, o Banco Central Russo implementou um aumento de emergência na taxa básica de juros. Naquele momento, a taxa estava em 9,5% e foi para o elevado patamar de 20%, na tentativa de conter a queda do rublo. Desde então, a estratégia monetária foi cortar a taxa em sucessivos “300 pontos base”, isto é, em três pontos percentuais, de 20% foi para 17%, depois 14% e, nesta quinta, 11%. Na época, o Banco também impôs medidas rígidas de controle de capital em uma tentativa de mitigar o impacto das sanções e sustentar o rublo, incluindo a já mencionada obrigatoriedade da comercialização de combustível na moeda nacional e a restrição de transferência de dinheiro para exterior.
A Rússia fez o movimento drástico do aumento da taxa de juros, já sentindo os efeitos na inflação com a dificuldade de importar determinados produtos e bens, bem como a proibição de negociar com os outros países, com o aumento das sanções econômicas. Agora, com indícios de uma inflação em queda, o Banco Russo viu abertura para continuar a sua estratégia de cortar as taxas de juros e estimular a produtividade no país. “Continuar com as taxas muito altas é deprimir ainda mais a economia. Os juros alto desincentivam o investimento. Fica mais caro captar dinheiro e investir. As pessoas acabam tendo mais interesse em colocar os seus recursos em títulos e na renda fixa, do que investir no mercado de produção, com criação de emprego e expandir produção. A estratégia russa deu certo, até agora!” cita o professor Henrique Castro.