Pix do Clima: Como ‘bolsa família’ para os mais pobres pode ajudar a frear o aquecimento global
Esther Duflo, vencedora do Nobel de 2019, propõe compensar os países mais vulneráveis pela crise climática, mas que serão, no futuro, os mais poluidores
O aquecimento global não é uma estatística abstrata: ele tem corpo, rosto e nacionalidade. E, se nada mudar, terá também um saldo brutal. Projeções consolidadas por modelos climáticos mostram que as mudanças climáticas podem causar mais de 6 milhões de mortes adicionais até o fim do século, principalmente por causa de ondas de calor tão intensas que tornam impossível trabalhar, dormir ou mesmo permanecer vivo sem refrigeração.
Desses mortos, 98% estarão nos países pobres e emergentes, exatamente aqueles que menos contribuíram para o problema. Foi a partir dessa matemática trágica que Esther Duflo, Nobel de Economia de 2019 e professora do MIT, apresentou a proposta FAIR (que significa justo, na tradução para o português) apelidada de “Pix do Clima” no Brasil. Ela não promete salvar o planeta com acordos diplomáticos ou metas voluntárias, mas tenta redesenhar o sistema climático global com uma lógica desconfortável, porém prática: os países que mais poluem pagam; os que mais sofrem se adaptam e assumem compromissos; e todos ganham um incentivo para reduzir emissões antes que elas disparem nos países emergentes.
A proposta nasce de três fatos que já não podem ser ignorados. O primeiro é que o calor extremo será o principal assassino climático deste século. Em partes da África, da Índia, do sudeste asiático e do norte do Brasil, a temperatura acima de 32°C, limite fisiológico que torna perigoso trabalhar ao ar livre, deve aumentar em 200 dias por ano. Nessas regiões, o calor não será um incômodo: será uma ameaça direta à sobrevivência.
O segundo fato é que o mundo está prestes a inverter a geografia das emissões. A OCDE, impulsionada por políticas ambientais, contribuirá para a redução de emissões até 2030. Mas isso pouco adiantará. O crescimento econômico e populacional dos países emergentes fará com que as emissões globais voltem a subir após o final desta década, empurrando o planeta para um aquecimento muito acima dos 2°C. A era em que a Europa podia liderar o clima sozinha acabou. O futuro das emissões está em países que ainda são pobres hoje, mas não serão amanhã.
O terceiro fato é o mais incômodo: os ricos poluem; os pobres morrem. Os 50% mais pobres do mundo emitem apenas 10% do total global. Já os 10% mais ricos respondem por metade de todas as emissões. Essa desigualdade não é moral, é matemática. E é ela que define quem vive e quem morre em um planeta mais quente.
Duflo tenta reorganizar essa equação. O mecanismo funciona assim: países ricos transferem dinheiro automaticamente para pessoas, comunidades e governos em países pobres. A transferência às famílias é a parte mais conhecida: uma espécie de “Pix do Clima”, um sistema parecido com o “Bolsa Família”, só que climático, que deposita na conta das pessoas valores necessários para enfrentar meses de calor extremo. Em países muito pobres, como Níger ou Chade, isso poderia significar cerca de três dólares por dia por adulto, valor suficiente para tirar milhões da pobreza extrema. Em países como Brasil e Índia, os pagamentos seriam liberados apenas quando a previsão climática anunciasse um mês com vários dias acima de 32°C, um gatilho objetivo e previsível.
Segundo seus cálculos, a FAIR custaria cerca de US$ 700 bilhões por ano, menos do que os subsídios diretos aos combustíveis fósseis e uma fração do custo humano das emissões globais, estimado em US$ 1,8 trilhão anuais. Para alcançar esse financiamento, ela menciona possíveis fontes, como uma tributação mínima sobre bilionários globais — a famosa supertributação aos mais ricos — e uma reforma no imposto sobre lucros de multinacionais. “Não é dinheiro inexistente, é dinheiro politicamente difícil”, disse Duflo.
Apesar da proposta, a solução ainda está longe de ser resolvida. Não está claro quem administraria o fundo, tampouco como garantir que pagamentos diretos sejam usados para adaptação climática e não drenados por clientelismo local. O histórico de fundos internacionais esvaziados e disputas políticas por governança também paira sobre o FAIR.
Mas Duflo insiste que o custo da inação é maior. “Se nada for feito, serão milhões de mortes adicionais, sobretudo entre trabalhadores ao ar livre que simplesmente não terão como sobreviver ao calor”, disse. O FAIR não resolve todas as falhas das negociações climáticas, mas toca no ponto que mais faltava à política global: proteger quem já sofre e, ao mesmo tempo, impedir que o futuro das emissões saia do controle.
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