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Petróleo barato pode mudar o mundo

Para especialistas do Banco Mundial, com a abordagem correta, a volatilidade do preço do petróleo pode vir a ser um ponto decisivo e fundamental no caminho em direção a um futuro mais sustentável

Por Kaushik Basu e Sri Mulyani Indrawati
7 mar 2015, 08h43

O recente declínio dos preços do petróleo parece ter um impacto altamente positivo sobre a economia global – ainda maior do que a maioria dos observadores parecem reconhecer. De fato, se os governos se aproveitarem a baixa dos preços do petróleo para implementar reformas críticas em suas políticas energéticas, os benefícios podem significar melhorias nas características estruturais de suas economias amanhã.

Um dos principais motivos pelos quais o impacto do declínio do preço tem sido até agora subestimado é que ninguém sabe por quanto tempo ele vai durar. E, de fato, as últimas movimentações de preços dão uma pequena pista a este respeito. Quando os preços despencaram em 2008, eles voltaram a subir quase instantaneamente e mais rápido do que os especialistas pudessem classificar com um “novo normal”; após a queda de 1986-1987, os preços permaneceram baixos para uma década e meia.

Desta vez, a trajetória de preço parece estar determinada por um novo jogador no jogo da energia: o óleo de xisto. O custo marginal de produção do óleo de xisto (a despesa de continuar a bombear um poço existente) varia de 55 a 70 dólares por barril. Adicione uma margem de lucro de 5%, e a curva de oferta de petróleo agora tem um segmento extenso e quase horizontal na faixa de cerca 60-75 dólares por barril. Independentemente da demanda, esta será a faixa de acomodação natural para o preço do petróleo – a chamada “prateleira de xisto” – e provavelmente permanecerá em vigor por um período prolongado.

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Esse fato dá algumas dicas sobre a decisão da OPEP em novembro passado para não reduzir a oferta. A Arábia Saudita corretamente argumentou que cortar o fornecimento não aumentaria os preços, mas simplesmente cederia espaço para a entrada de novos atores que pegariam uma parte do mercado.

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Obviamente, esse padrão poderia ser interrompido se, digamos, uma guerra ou grande conflito em uma região exportadora de petróleo restringisse o abastecimento de tal maneira a fazer com que os preços ultrapassassem a prateleira de xisto. Mas, na ausência de um grande choque inesperado, as companhias de petróleo permanecerão sob pressão para continuar a vender a commodity, mesmo a preços baixos, à medida que elas se esforçam para honrar as grandes dívidas que assumiram sobre os investimentos, quando os preços do petróleo estavam em alta. Esta pressão é precisamente o que levou os preços do petróleo para baixo em dezembro e janeiro.

Diante disso, é razoável esperar que o fornecimento de petróleo se mantenha abundante e os preços permaneçam moderados até 2016 – uma tendência que vai impulsionar o crescimento global em 0,5 ponto porcentual neste período. O impacto será grande especialmente em países como a Índia e a Indonésia, onde a conta de importação de petróleo chega a quase 7.5% do PIB. Na verdade, pode ser que o saldo comercial da Índia, que tem estado em déficit por anos, apresente um superávit este ano.

Isso cria uma oportunidade única para a reforma da política energética. Em muitos países, o combustível é muito subsidiado, esticando os orçamentos públicos e incentivando o consumo exagerado. Os baixos preços do petróleo oferecem uma abertura ideal para reduzir os subsídios, liberando, assim, recursos que os governos podem gastar em serviços básicos e programas de assistência social que contribuem para a redução da pobreza.

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Mas aconselhar os países a simplesmente reduzir subsídios é muitas vezes inexpressivo. Em países onde o governo dita o preço da gasolina – como Índia e Indonésia fizeram até recentemente (e, em certo ponto, continuam a fazer) – preços de mercado mais baixos reduziriam a subvenção automaticamente. É por isso que manter subsídios é inadequado para esses países.

O objetivo deve ser a mudança de um sistema de preço fixo, com reajustes decretados pelo governo ocasionalmente, a um regime de preço baseado no mercado, em que o governo assume um compromisso confiável não para limitar preços, com exceção de circunstâncias extremas pré-definidas. Enquanto tal medida teria um efeito insignificante sobre preços agora, ela proporcionaria aos países uma enorme vantagem durante as futuras flutuações de preços do petróleo, porque os consumidores e fornecedores de varejo já não seriam excluídos de indicações de preços.

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Em meio à boa notícia, destacam-se duas graves preocupações. No curto prazo, os preços do petróleo em queda criam graves desafios para aqueles que, tendo investido na expansão de produção quando os preços estavam altos, agora enfrentam grandes custos e quebra de empresas. Mais problemáticos, os baixos preços do petróleo encorajam o consumo excessivo – cujo impacto ambiental no longo prazo vai ser agravado pelo incentivo de enfraquecimento para investir em fontes alternativas de energia.

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Os legisladores devem reconhecer esses riscos e implementar políticas para atenuá-los. Especificamente, os governos devem direcionar o dinheiro que eles economizam com petróleo e subsídios para programas concebidos para ajudar as pessoas a sair da pobreza, e eles poderiam incorporar incentivos à inovação e ao investimento em energia limpa a seus regimes fiscais.

Com a abordagem correta, a volatilidade do preço do petróleo de hoje pode vir a ser um ponto decisivo e fundamental no caminho em direção a um futuro mais sustentável, caracterizado pela prosperidade compartilhada e verdadeiro progresso na redução da pobreza. A direção a seguir é clara.

Kaushik Basu, vice-presidente sênior e economista chefe do Banco Mundial, é professor de Economia na Universidade Cornell. Sri Mulyani Indrawati, diretor executivo e diretor de Operações do Banco Mundial, é ex-ministro das finanças da Indonésia.

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Tradução: Roseli Honório

© Project Syndicate, 2015

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