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O encontro de Guedes com empresários: aproveitar “janela” de oportunidade

Ideia do ministro é aproveitar a força da base governista para aprovar a reforma tributária que for possível; reunião foi marcada por algumas insatisfações

Por Felipe Mendes Atualizado em 9 jul 2021, 10h18 - Publicado em 9 jul 2021, 09h28

Advogado e banqueiro com participação tempestuosa na vida pública, José Magalhães Pinto (1909-1996) certa vez disse que “política é como nuvem. Você olha e ela está de um jeito. Olha de novo e ela já mudou”. Pode-se dizer o mesmo sobre as relações humanas. Há exatos três meses, o presidente Jair Bolsonaro era ovacionado após um jantar para reaproximação do governo com empresários, em São Paulo. Mas, na última quinta-feira, 8, num almoço sediado na casa do empresário João Carlos Camargo, fundador do grupo Esfera, localizada no Morumbi, região nobre de São Paulo, o tom foi diferente. Desta vez não era Bolsonaro a estrela do evento, e sim o ministro da Economia, Paulo Guedes, que teve de fazer esforço para contornar o desconforto de alguns empresários insatisfeitos com o projeto de lei 2.337/21, a segunda etapa da reforma tributária.

Como o encontro para acalmar os ânimos dos empresários foi marcado às pressas, a comitiva do governo foi enxuta. Com “agenda cheia”, Bolsonaro ficou de fora. Guedes veio à São Paulo acompanhado de seu assessor especial, Guilherme Afif Domingos, ex-presidente do Sebrae. Do lado dos empresários e executivos do mercado financeiro, convidados por Carlos Camargo, alguns dos nomes presentes foram Alberto Saraiva, do Habib’s; Fernando Marques, da União Química; Isaac Sidney, da Febraban; Jean Jereissati, da Ambev; José Berenguer, do Banco XP; José Olympio, do Credit Suisse; Luis Henrique Guimarães, da Cosan; Luiz Carlos Trabuco, do Bradesco; Michael Klein, da Via, dona das Casas Bahia; Rafael Furlanetti, da XP; Vander Giordano, da Multiplan; e Washington Cinel, da Gocil. Ex-secretário do Tesouro, Mansueto de Almeida, do BTG Pactual, também participou do almoço. Por outro lado, diversos empreendedores na lista de confirmados do Ministério da Economia não deram as caras, como foi o caso de Edgard Corona, da BioRitmo; Flávio Rocha, do grupo Guararapes, dono da Riachuelo; e Luiza Helena Trajano, do Magazine Luiza.

Entre uma garfada e outra, Guedes teve de responder a questionamentos indigestos, como os motivos para a taxação de lucros e dividendos e o fim da dedução dos juros sobre capital próprio. Depois de muito pestanejar, disse que está disposto a adequar a “dosagem” das mudanças nos tributos, por meio de uma “corporate tax” (taxação corporativa) na faixa dos 20%. A proposta tributária enviada ao Congresso prevê  20% de IRPJ e mais 9% em CSLL. Como contrapartida, pediu um voto de confiança dos empresários para a aprovação do projeto. “O Guedes vê essa reforma como uma grande janela de oportunidades. É isso que ele usa como justificativa”, disse um participante do evento. “Ele disse que a proposta obviamente pode ser discutida, mas que ele não quer perder essa janela, porque hoje o Congresso está alinhado com as propostas, como a dos Correios e a da Eletrobras. E o momento é de aproveitar isso.”

Nem todos são simpáticos, no entanto, à pressa do governo para a aprovação da reforma. Os empresários entendem que há um risco de o governo, no ímpeto de trazer boas notícias, acabar ocasionando erros à tributação das empresas, que seriam difíceis de reparar no futuro. De saída da presidência do Credit Suisse no Brasil, José Olympio, foi um dos que se posicionaram de forma mais energética diante da proposta do governo. Segundo uma fonte relatou, Olympio fez um discurso cobrando uma postura diferente do ministro. “Ele disse que a classe que estava no almoço é a classe que apoia o governo por ele ter sido eleito com uma proposta liberal, mas que as medidas deveriam ser para o desenvolvimento do país. E essa proposta, na verdade, vai contra isso”. O presidente da Febraban, Isaac Sidney, sugeriu que Guedes estipulasse um prazo mínimo, como cerca de três anos, para que as empresas possam se adaptar à nova legislação, caso a reforma venha a ser aprovada.

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O anticlímax da reunião foi quando o ministro teria “cutucado” o CEO da Ambev, Jean Jereissati, ao citar o plano do governo de reduzir os subsídios para a indústria produtora de refrigerantes na Zona Franca de Manaus – Guedes teria se referido à região utilizando a palavra “selva”. Jereissati, por sua vez, teria respondido ao ministro que não se preocupava com esse “benefício”, mas sim com a mudança que a reforma traria em relação aos juros sobre capital próprio.

Outro a participar de um embate mais incisivo com o ministro no encontro foi o investidor Daniel Goldberg, sócio e gestor da Farallon, que teria questionado se Guedes saberia os principais fundamentos da Escola de Chicago, defensora do livre mercado, e se o ministro concordava que a proposta da reforma tributária vai de encontro com alguns desses pontos. Guedes, então, resolveu colocar panos quentes na situação. “Não sei se vocês me conhecem, mas eu tenho a minha biografia, os meus fundamentos, e quero seguir com esses fundamentos. Se a proposta for algo que não irá aumentar tributos, eu estou dentro. Se for algo que vai implicar no aumento de tributos, aí eu estou fora”, teria dito o ministro.

CEO da Cosan, Luis Henrique Guimarães, também participou do encontro como representante da Associação Brasileira das Companhias Abertas (Abrasca), da qual ele preside o conselho de administração. Guimarães aproveitou a ocasião para entregar ao ministro um estudo sobre o impacto da reforma tributária para as companhias de capital aberto. Por outro lado, Guedes pediu que as solicitações dos empresários presentes no almoço fossem unificadas e enviadas à pasta assim que possível. Para um empresário que participou da conversa, o resultado foi um pouco frustrante. “A gente esperava que essa reforma fosse atacar a informalidade, àquele devedor contumaz, que troca de CNPJ todos os anos. Mas não”, disse. “Se a reforma for desse jeito, vale mais vender a empresa, pegar o dinheiro e viver de juros. Assim eu ganho mais e não vou ter dor de cabeça.”

Ao final do banquete, apesar de um ou outro entrevero, os empresários promoveram uma salva de palmas a Guedes. De lá, o ministro e seu fiel-escudeiro se deslocaram para o gabinete do Ministério da Economia na Avenida Paulista, onde se reuniram com integrantes do setor imobiliário. Esta conversa teve tom mais ameno, com Guedes falando do “equilíbrio” que a reforma traria às empresas. O ministro ainda deu a entender que pode rever a tributação de fundos imobiliários. “A conversa foi muito honesta, direta, clara e objetiva, num tom muito de entendimento de como a reforma impactará o segmento”, diz o presidente da Associação Brasileira de Incorporadoras Imobiliárias (Abrainc), Luiz França. “O ministro chegou a levantar e ir ao quadro desenhar todas as hipóteses da reforma, tecnicamente falando, mostrando tudo de neutralidade, todas as teses dele, com alguns exemplos. Foi uma reunião muito objetiva, clara e trouxe celeridade na direção em que ele quer seguir.”

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