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O milagre mexicano: país faz reformas e mercado aplaude

Mesmo com PIB fraco, México segue livro da ortodoxia econômica e agrada investidores, enquanto Brasil ainda cria desconfiança

Por Ana Clara Costa e Talita Fernandes
7 set 2013, 09h58

A economia mexicana teve retração de 0,74% no segundo trimestre. No acumulado do ano, cresceu 1% – e deve fechar 2013 com um avanço de não mais que 1,8%. Comparado ao resultado frustrante do vizinho latino-americano, o crescimento de 2,3% previsto para o Produto Interno Bruto (PIB) do Brasil em 2013 poderia ser visto com certa dose de otimismo. Mas não é. Ainda que o Banco Central afirme que não perdeu a inflação de vista, o ministro da Fazenda jure que as contas públicas estão muito saudáveis e a presidente Dilma Rousseff celebre os feitos de seu governo, a imagem do país como motor do crescimento da região está sendo sepultada, enquanto a do México resplandece – mesmo apresentando um ‘pibinho’.

A explicação para a animação dos economistas e investidores em relação ao México é lógica. Sua localização geográfica o transforma em um dos maiores beneficiados pela recuperação da economia americana. Além disso, a indústria mexicana colhe os louros da nova política econômica chinesa – mais voltada para o mercado interno e menos para as exportações. O recente aumento de custos de produção na China (explicado pela subida dos salários e leve valorização do yuan) fez do México um destino barato para alguns setores industriais dos Estados Unidos. “A China está num processo de transformação econômica direcionado mais para o consumo do que para os investimentos. Com isso, seus custos subiram, inclusive o de frete. E o México está ao lado dos Estados Unidos. Então, hoje, compensa mais para a indústria americana fabricar o produto final no México do que na China”, afirma Marco Oviedo, economista-chefe do Barclays no México.

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Contudo, muito mais que surfar a onda dos Estados Unidos, o México tem implementado reformas estruturais importantes para garantir a melhora de sua produtividade e do ambiente de negócios. O governo de Felipe Calderón conseguiu aprovar uma nova lei trabalhista mais flexível e afável ao setor privado, além de fechar secretarias e estatais deficitárias. O país encerrou 2012 com déficit fiscal de 0,4% do PIB – sem contabilidade criativa. Ao somar a essa cifra os investimentos da estatal de petróleo Pemex, o resultado fiscal é de 2,4%. Na educação, o Senado aprovou severas mudanças na última quarta-feira que tiram dos sindicatos de professores, acusados de corrupção e ineficiência, parte do poder sobre os profissionais do setor. Neste ano, o novo presidente, Enrique Peña Nieto, anunciou reformas no setor de energia com o objetivo de atrair empresas privadas para a exploração de petróleo. “O país está caminhando na mesma direção das recomendações que listamos em nosso relatório de maio deste ano. É muito animador ver o que o México está fazendo”, afirma Sean Dougherty, economista da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento ou Econômico (OCDE).

Os cortes e reformas tiveram efeito pernicioso sobre o PIB deste ano. Mas o mercado parece não se importar. Em evento promovido pela BM&FBovespa em Campos do Jordão, na semana passada, o ex-vice-presidente da área de pesquisa do banco Goldman Sachs, Jim O’Neill, afirmou que, mesmo com o resultado ruim da economia mexicana este ano, o país tem potencial para crescer praticamente o dobro do Brasil no ano que vem. O’Neill ganhou notoriedade em 2001 ao criar o termo Bric para se referir aos emergentes que mais cresceriam na década: Brasil, Rússia, Índia e China. A dependência da economia dos Estados Unidos foi o que impediu o país de entrar na lista. Mas, hoje, O’Neill mudou de opinião. “Gosto muito do que o México tem feito. Eles estão tentando fazer a lição de casa e, até o momento, está dando certo”, afirmou. Já em relação aos Brics, o economista afirmou que o mundo só testaria quais Brics eram economias fortes quando o boom das commodities terminasse. E terminou. Entre mortos e feridos, o Brasil tenta encontrar seu lugar.

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O otimismo do mercado em relação ao México não é repentino. Desde 2012, ano em que o PIB brasileiro avançou 0,9% e o mexicano, 3,6%, análises têm sido feitas confrontando os dados macroeconômicos dos dois países. O jornal britânico Financial Times é um dos maiores instigadores dessa batalha velada de potências emergentes e chegou a afirmar, em reportagem publicada em 2012 e citando um estudo do banco Nomura, que a economia do México deverá superar a do Brasil até 2022. Os investidores parecem compartilhar a mesma empolgação. Exemplo disso é que o peso mexicano praticamente não se desvalorizou nas últimas semanas devido à turbulência cambial causada pelo Federal Reserve (Fed, o banco central americano). Este ano, a moeda perdeu 2,5% em relação ao dólar, enquanto o real chegou a perder quase 20% de seu valor, mas se recuperou nos últimos dias e acumula queda de 11%. Ou seja, investidores estrangeiros se sentiram muito mais confortáveis em tirar dólares do Brasil do que do México.

No entanto, as razões empíricas são tão ou mais importantes que os fatos na hora de explicar o “milagre” mexicano. O que existe – e torna o México tão atraente ao mercado – é uma intenção clara do governo, da equipe econômica e da autoridade monetária do país de seguir o livro-texto e a ortodoxia. E é precisamente o que o Brasil da presidente Dilma não fez. Os fatos, sozinhos, ainda não chancelam uma retomada vigorosa do México. Apesar das melhorias já executadas, muitas das reformas necessárias à economia do país precisam ser concretizadas. O plano do setor de energia requer ajustes e aprovação política para sair do papel. Há uma reforma tributária essencial para o país e que ainda não foi feita. “O México foi duramente afetado pela crise de 2008 e não se beneficiou da alta do ciclo das commodities. O país então percebeu que a única forma de crescer era por meio de reformas estruturais, para ganhar competitividade”, diz o economista Christian Garman, da consultoria Eurasia.

Além disso, se a economia americana não decolar, o país será penalizado. “Se essa recuperação não vier entre seis e doze meses, isso prejudicará o México e, sobretudo, seu processo de reformas que exigem certa coesão política”, diz Dougherty, economista da OCDE. O mercado ainda não enxerga esse risco porque, dotado de certa irracionalidade, tem a esperança de que as reformas acontecerão. Tal expectativa é fundada na credibilidade que o país construiu ao longo da última década, mesmo excluído dos Brics e sem gozar dos benefícios do ciclo das commodities. É a antítese do Brasil que, creem os economistas, pode dar certo.

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