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Juros em queda abrem caminho para o barateamento do crédito

Para impulsionarem o crescimento, autoridades monetárias de vários países baixam suas taxas. O Brasil segue a onda

Por Machado da Costa Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO Atualizado em 2 ago 2019, 14h51 - Publicado em 2 ago 2019, 07h00

Os bancos centrais de todo o planeta foram pegos de surpresa neste ano. Eles não imaginavam que a atividade econômica de seus países estaria tão fraca. As grandes potências bem que tentaram, mas seguem em dificuldade para aumentar o nível de consumo de seus cidadãos. Como conse­quência, a inflação fica abaixo do desejável — o que pode retroalimentar o problema, já que o consumidor adia as compras se sabe que o preço não vai aumentar. O último relatório do Fundo Monetário Internacional (FMI), recém-publicado, mostra que a economia global, depois de ter crescido 3,8% em 2017 e 3,6% em 2018, deve avançar só 3,2% em 2019, em uma evidente desaceleração. Para tentarem reverter essa tendência, os bancos centrais mundo afora vêm fazendo cortes generalizados das taxas de juros com o objetivo de estimular investimentos e consumo por meio do barateamento do crédito. O Brasil não foge à regra e já pratica juros “civilizados” — até maio de 2017, sua taxa superava a de todas as nações. Isso significa que investidores não veem mais tanta vantagem em emprestar dinheiro aos governos, que pagam cada vez menos, o que abre uma rara janela de oportunidade para que o país ataque um de seus maiores inimigos: os juros bancários.

(Arte/VEJA)

Na quarta-feira 31, duas decisões — uma aqui no Brasil e a outra nos EUA — confirmaram a tendência de guerra planetária às taxas altas. O Comitê de Política Monetária (Copom), liderado por Roberto Campos Neto, presidente do Banco Central, cortou em 0,5 ponto porcentual a taxa Selic, índice que serve de base para todos os financiamentos no país. Agora, o “custo do dinheiro” está em 6% ao ano. Algumas horas antes do Copom, o Federal Reserve, a autoridade americana equivalente ao nosso BC, reduziu sua taxa em 0,25 ponto porcentual, para a faixa entre 2% e 2,25% ao ano. Segundo o presidente do Fed, Jerome Powell, esse movimento foi de acomodação, “um ajuste” — o que acabou frustrando quem esperava o início de um ciclo mais agressivo de cortes, como o presidente Donald Trump. “Estamos ganhando de qualquer forma, mas eu, certamente, não estou recebendo muita ajuda do Federal Reserve”, tuitou Trump, que deseja acelerar o crescimento a todo custo. No outro lado do Atlântico, o Banco Central Europeu anunciou que desistiu de elevar suas taxas, atualmente zeradas, e sinalizou que as manterá assim ao menos até 2020. O mesmo acontece com a autoridade japonesa, que segura as taxas abaixo de zero, em -0,1%. Parece estranho, porém o governo do Japão está tão aflito com o baixo crescimento que, para forçar o gasto, deprecia o dinheiro de quem economiza.

Esse movimento global de baixa de juros proporciona uma grande liberação de recursos para empresários investirem em seus negócios — e para a população em geral financiar suas compras. Para se ter uma ideia do impacto, a cada ponto porcentual de queda na Selic, o governo brasileiro deixa de pagar cerca de 40 bilhões de reais de juros por ano. Bancos e investidores buscam esse dinheiro em outras fontes, e são obrigados a oferecer empréstimos em condições mais camaradas. O último tsunami de dinheiro barato assim — quando as grandes potências derrubaram juros e imprimiram papel-moeda para enfrentar a maior crise financeira desde 1929 — ocorreu em 2009, e o Brasil não aproveitou. Dez anos depois, o país está mais preparado para pegar essa onda. “O risco Brasil está em 125 pontos, enquanto o risco do México, que possui grau de investimento que nós não temos, está em 114,5 pontos. Sob os olhos do mercado, não estamos tão distantes assim”, afirma Luiz Fernando Figueiredo, sócio da Mauá Capital.

Na verdade, o governo está fazendo mais do que apenas baixar a taxa básica. Sob orientação do ministro Paulo Guedes, os bancos públicos começam a sair do jogo do crédito empresarial, abrindo espaço para bancos privados e investidores. O BNDES, há décadas o principal financiador de infraestrutura, está deixando esse mercado para focar em saneamento básico e privatizações. Isso força as companhias a procurar alternativas. Hoje, para cada 45 reais concedidos por bancos públicos, os privados emprestam 55 reais. O governo quer que essa distância fique cada vez maior. Além disso, o crédito no país representa 47,2% do PIB, e a meta é chegar a 60% até 2022. “Vamos mudar o perfil de crédito no Brasil”, afirma o secretário da Fazenda, Waldery Rodrigues.

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CAUTELA – Jerome Powell, do Fed: por enquanto, só um movimento de “ajuste” (Sarah Silbiger/Reuters)

Na próxima semana, duas medidas serão anunciadas pela equipe econômica do governo, que está trabalhando em dezessete estratégias para a redução dos juros. Ambas são voltadas para empresas. A primeira é uma mudança nas emissões de dívida — as chamadas debêntures — e a segunda é a reforma no mercado de câmbio, atualizando uma legislação criada ainda na metade do século XX. Entre as outras ações governamentais há, por exemplo, medidas que focam a melhoria do sistema de garantias bancárias, estimulando o uso de bens para a realização de empréstimos; a abertura de dados por parte do cliente para incentivar a competição; e o aumento do microcrédito.

Faltam, por ora, medidas para baixar os juros bancários do chamado crédito rotativo, aquele cobrado pelo cheque especial e pelos cartões. Os juros dessas operações passam de 300% ao ano. Durante períodos de crise, o brasileiro recorre justamente a esses expedientes. Não à toa, é o tipo de operação que mais enche os cofres dos bancos privados. As instituições públicas ainda possuem grande influência nesse mercado, e, na esteira da melhoria do perfil fiscal do país, da queda da inadimplência e do aumento da concorrência praticada pelas fintechs, a Caixa cortou em 40% os juros cobrados de seus clientes. O movimento, que parece atrasado, só foi possível devido à melhora do ambiente de negócios, garante o economista-chefe da Associação das Instituições de Crédito, Nicola Tingas: “Mais do que a queda da Selic, serão as ações estruturais que vão aumentar a competição e reduzir os juros bancários”. Essas medidas estão a caminho. Enquanto isso, espera-­se que o Banco Central continue baixando os juros.

Publicado em VEJA de 7 de agosto de 2019, edição nº 2646

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