Itamaraty rebate carta dos EUA sobre protecionismo
Governo brasileiro afirmou que documento 'não é aceitável' e críticas americanas sobre aumento de tarifas de importação são 'injustificadas'
O governo brasileiro reagiu duramente à carta em que o representante dos Estados Unidos para assuntos comerciais, Ron Kirk, criticou a política de elevação de tarifas de importação do país. “Injustificável” e “inaceitável” foram alguns dos termos usados pelo Itamaraty para classificar o documento, tornado público nesta quinta-feira, um dia depois de ser recebido pelo ministro das Relações Exteriores, Antonio Patriota.
“Não gostamos nem do conteúdo nem da forma. Consideramos injustificadas as críticas, não têm fundamento”, afirmou o porta-voz do Itamaraty, embaixador Tovar Nunes. “Temos um relacionamento muito bom com os Estados Unidos e essa forma de comunicação não é aceitável, não ajuda e não reflete esse bom relacionamento.”
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O texto de Kirk, que tem o posto equivalente a um ministro do Comércio Exterior, incomodou o governo brasileiro. Há uma semana, o embaixador americano na Organização Mundial do Comércio, Michael Punke, também havia reclamado da decisão brasileira de aumentar as tarifas de importação de 100 produtos, mas a reação de Patriota não foi tão dura.
Em entrevista ao jornal O Estado de S. Paulo, o ministro afirmou que considerava naturais as críticas feitas na organização, um fórum onde os países podem levantar suas “preocupações comerciais”. Ainda assim, lembrou que o Brasil é um dos quatro países que mais importam produtos americanos e que também medidas dos EUA benéficas às suas empresas, como o chamado afrouxamento quantitativo realizado há uma semana, prejudicam economias emergentes.
“O Brasil tem levantado na OMC um debate sobre câmbio e comércio e vê com muita preocupação essas medidas de afrouxamento quantitativo, que têm um impacto extremamente deletério sobre economias em desenvolvimento. Economias que inclusive estão ajudando o mundo desenvolvido com o seu dinamismo econômico e com a absorção de produtos exportados pelos EUA e por europeus”, disse.
“Além da retórica temos de olhar para realidade, e há questões que precisam ser legitimamente debatidas. O Brasil as têm levado para a OMC e esperamos que também sejam tratadas com seriedade.”
Tom – A diferença agora é, especialmente, o tom da carta do representante americano. No texto, Kirk não começa dizendo que escreve para declarar “em termos fortes e claros” a preocupação dos EUA com a política brasileira, acusa o governo brasileiro de tomar “claramente medidas protecionistas” e de mirar especificamente as importações americanas.
Além disso, há uma ameaça que o Itamaraty considerou desrespeitosa – Kirk diz que medidas como essa podem levar a respostas à altura e podem prejudicar as relações dos dois países.
Ameaça brasileira – Da mesma forma que os americanos expressam sua crítica às políticas protecionistas do Brasil, no entanto, o ministro da Economia Guido Mantega tem usado o mesmo adjetivo para reclamar dos EUA. Nesta quinta-feira, ele reafirmou, durante entrevista concedida ao jornal Financial Times, que a terceira rodada de relaxamento quantitativo (QE3) da política monetária do banco central americano (Federal Reserve, Fed) é “protecionista”. E ameaçou dizendo que a política vai dar início a uma nova “guerra cambial”, com consequências potencialmente desastrosas para o resto do mundo.
“É preciso entender que haverá consequências”, disse o ministro, acrescentando que o programa do Fed para estimular a economia americana “terá apenas um benefício marginal nos EUA”. “Não há falta de liquidez. E a liquidez não está indo para a produção”, acrescentou.
Déficit – O Brasil teve, em 2011, um déficit comercial de 8,2 bilhões de dólares com os EUA. Este ano, entre janeiro e agosto, a diferença na balança comercial já alcança 2,7 bilhões a favor dos americanos. Além disso, as ações dos EUA para proteger seu comércio também não costumam levar em conta os problemas que causam nos outros países.
A recente decisão do Fed de comprar 40 bilhões de dólares em títulos públicos para injetar dinheiro na economia, por exemplo, foi classificada pela presidente Dilma Rousseff como um “tsunami monetário”, que fortalece artificialmente as moedas dos demais países e prejudica o comércio. No quesito subsídios, o Congresso americano negocia uma nova lei agrícola, a “Farm Bill”, que pode ser ainda mais danosa para os produtos agrícolas que a atual, apesar de o país já ter perdido contenciosos na OMC por subsídios.
(Com Agência Estado)