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Inflação, risco fiscal e juros altos frustram expectativas para o PIB

O ano se iniciou com uma das piores primeiras estimativas de crescimento de toda a série histórica do Banco Central: apenas 0,36%

Por Carlos Valim, Larissa Quintino, Victor Irajá Atualizado em 7 jan 2022, 09h50 - Publicado em 7 jan 2022, 06h00

O Brasil não é para principiantes, já dizia Tom Jobim no início dos anos 1960, mas também vem se tornando um país cada vez mais complexo para os otimistas — principalmente quando se trata da economia. Isso é particularmente visível quando se leva em conta as previsões feitas para o desempenho da economia nos próximos doze meses. Excetuando a queda projetada em 2016, o ano se iniciou com a pior primeira estimativa de toda a série histórica do boletim do Banco Central, que, desde 2002, compila semanalmente as previsões de dados econômicos feitas por analistas do setor financeiro. No documento divulgado na segunda-feira 3, a expectativa é de um crescimento de apenas 0,36%.

O valor é decepcionante e chega a ser inferior aos projetados nas primeiras semanas de 2015 e 2017, quando o país enfrentava os reflexos da temerária gestão econômica da presidente Dilma Rousseff e seu processo de impeachment. Para os economistas, pesquisadores e analistas de bancos ouvidos por VEJA, o esquálido número de 2022 se deve basicamente a um choque de realismo com as expectativas quase nulas sobre a capacidade da equipe do ministro Paulo Guedes de conseguir reverter o cenário de marasmo da economia. “Muita coisa pode acontecer no ano e é difícil prever o que teremos pela frente, mas por trás dessas expectativas está principalmente a experiência com o passado recente”, afirma Alberto Ramos, diretor de pesquisa econômica do banco Goldman Sachs para a América Latina. “No caso específico de 2022, ela reflete basicamente uma grande quebra da dinâmica do crescimento ocorrida no fim de 2021.”

Até o início do segundo semestre, havia uma expectativa de que o Brasil pudesse se recuperar com força com o avanço da vacinação e a abertura da economia, trazendo a atividade para um patamar alto para o ano seguinte. Mas uma série de fatores negativos se somou. A inflação se descontrolou e agora pode continuar rondando pela casa dos 10% até a metade deste ano. Isso forçará que a alta dos juros empreendida pelo Banco Central em 2021 continue por mais tempo, desaquecendo a economia. Além disso, a expectativa de melhora da trajetória da dívida do governo foi afetada com medidas do Poder Executivo para contornar o teto de gastos, abrindo espaço para mais irresponsabilidades fiscais. Para completar, o mercado de trabalho segue debilitado pelos efeitos do distanciamento social imposto pela pandemia.

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CETICISMO - Guedes: o mercado não confia na capacidade do governo de conduzir a retomada -
CETICISMO – Guedes: o mercado não confia na capacidade do governo de conduzir a retomada – (Edu Andrade/Ascom/ME/.)

Como se não bastasse tudo isso, até mesmo o cenário externo, que estava bastante positivo em 2021, não deve ser o mesmo. Ainda que os preços das commodities exportadas pelo Brasil continuem em alta e que o PIB mundial cresça acima dos 4% conforme se espera, os temores de inflação nos Estados Unidos indicam que o país aumentará as suas taxas de juros (nesta semana, as bolsas mundiais caíram em razão dessa expectativa). É a receita para desestimular investimentos em países em desenvolvimento e para o fortalecimento do dólar, pressionando o real a perder ainda mais valor, encarecendo as importações e os produtos cotados na moeda estrangeira, como os combustíveis. Ou seja, mais inflação.

RARO ALENTO - Colheita de grãos: expectativa de desempenho recorde em 2022 -
RARO ALENTO – Colheita de grãos: expectativa de desempenho recorde em 2022 – (Dirceu Portugal/Fotoarena/.)

Se não fossem algumas poucas boas notícias, como a expectativa de que a variante ômicron não cause maiores estragos sanitários e a volta das chuvas, diminuindo os riscos de racionamento de energia, a projeção média do mercado estaria no campo negativo. “O ano deve também ter, em algum ponto, uma melhora nos estoques das empresas, com as cadeias produtivas globais se normalizando, depois de terem travado em 2021”, comenta Eduardo Jarra, economista-chefe do Santander Asset. “Sem isso e sem o impacto da reabertura econômica pós-pandemia, os efeitos negativos seriam maiores. Então, temos dado um cenário de estagnação, que é uma projeção bem consolidada tanto entre bancos quanto em empresas.”

arte PIB

Apesar da assertividade dos agentes do mercado em suas estimativas, o ministro da Economia, Paulo Guedes, tem vociferado contra as previsões. Tanto publicamente quanto em conversas privadas. Para o ministro, é natural que no mercado financeiro haja muita desconfiança, graças ao cenário de juros e inflação, mas costuma ressaltar que os analistas costumam errar em suas previsões. “Falaram que íamos cair 10% em 2020, quando começou a pandemia, e caímos 4%. Agora, vão errar de novo”, tem dito a pessoas próximas. Guedes também costuma apontar que, entre as principais economias, o país é o único que já refluiu os estímulos fiscais usados para fazer frente à pandemia, o que seria positivo do ponto de vista fiscal. Apesar das considerações, os analistas estão céticos com a capacidade do governo de reverter a prostração. À exceção do agronegócio, a falta de dinamismo dos demais setores preocupa, enquanto problemas estruturais seguem intocados. “O Brasil tem um grande problema de produtividade. Emprega mal os seus recursos, investe pouco, não forma mão de obra de qualidade”, elenca Silvia Matos, economista do Instituto Brasileiro de Economia, da Fundação Getulio Vargas. “O diagnóstico é muito claro. A economia precisa de reformas, que não foram feitas”, diz ela. Um cenário em que, definitivamente, sobra pessimismo.

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Publicado em VEJA de 12 de janeiro de 2022, edição nº 2771

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