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Em debate com Armínio, Mantega não explica por que o Brasil vai mal

Confronto entre o chefe da campanha de Aécio Neves na área econômica e o futuro ex-ministro da Fazenda Guido Mantega mostra que o atual governo não tem ideia do estrago causado na economia

Por Ana Clara Costa
9 out 2014, 22h21

A jornalista Miriam Leitão apresentou, na noite desta quinta-feira, no canal pago GloboNews, um debate que tinha tudo para ser acalorado. Os participantes eram Guido Mantega, coautor, ao lado da presidente Dilma Rousseff, da política econômica que conduziu o país à recessão técnica, e seu concorrente direto, o ex-presidente do Banco Central e ministro da Fazenda em um possível governo de Aécio Neves, Armínio Fraga. A ideia era promover um confronto de ideias entre dois economistas que defendem modelos econômicos divergentes – o desenvolvimentista e o liberal. Mas o resultado foi outro. O atual ministro se furtou de dar qualquer explicação sobre o presente, e manteve os olhos fixos no passado, criticando os anos FHC. Armínio defendeu a gestão tucana e questionou pontos do atual governo, mas não obteve respostas. O ministro se negou a admitir a crise interna no Brasil e seguiu a cartilha de sempre: disse que a culpa do crescimento baixo é do exterior.

Em período eleitoral, é de se esperar que o ministro de um governo que busca a reeleição tente se esquivar das questões espinhosas. O problema é quando o discurso tenta turvar o raciocínio do eleitor. Mas é bem provável que Mantega tenha escolhido o palanque errado para sua ladainha, uma vez que o programa é destinado a um telespectador que acompanha com alguma assiduidade o noticiário econômico.

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As comparações com o governo Fernando Henrique Cardoso são inevitáveis e devem ser feitas com a devida clareza. O Plano Real implementado ainda no governo Itamar Franco resgatou o país do inferno inflacionário e trouxe de volta a estabilidade que permitiu o crescimento nos anos Lula – um feito que o próprio PT reconhece, exceto em período de eleição. À época, os desafios eram outros. O emprego não avançava, mas não necessariamente por má vontade dos governantes, e sim porque o setor privado não estava disposto a investir pesado num país instável, com inflação acima de 1.000% ao ano e algumas moratórias na bagagem. Reconhecer isso não significa afirmar que a condução da política econômica na era FHC tenha sido livre de erros. Como, aliás, nenhuma gestão é. Mas o confronto de ideias exige contextualização. Se os investimentos vieram na década de 2000, isso se deve ao fato de o Brasil ter mantido sua política econômica na linha. O tal ‘tripé’ que o ministro Mantega fez questão de esnobar durante o debate foi a ferramenta essencial para que o modelo desenvolvimentista se consolidasse no segundo governo Lula e também na gestão Dilma.

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É importante que o eleitor saiba com riqueza de detalhes o que aconteceu na economia na década de 1990. Mas, mais importante ainda é entender o que aconteceu nos últimos anos, pois é justamente o resultado das políticas desse período que afetará a vida dos brasileiros daqui pra frente. O ministro Guido Mantega não soube explicar porque a inflação subiu. Disse que se deve ao aumento das tarifas da energia elétrica e à estiagem. O problema é que a inflação não subiu em 2014, que é o período em que houve os reajustes. Ela surfa acima do centro da meta desde agosto de 2010. Quando questionado sobre o uso de bancos públicos para operações nebulosas, como investimento em empresas privadas que não precisam de estímulo do governo, o ministro não soube responder. Para fugir, criticou o lucro dos bancos na época FHC, que eram notadamente mais baixos.

O ministro também foi questionado sobre os aportes do Tesouro no BNDES e o dinheiro que o banco de desenvolvimento empresta a taxa de juros subsidiada a empresas que, em teoria, não precisariam receber recursos dos impostos dos contribuintes para crescer. Para rebater a pergunta, Mantega disse que o BNDES lucra muito mais hoje do que na era FHC. O ministro não detalhou, por exemplo, que o BNDES precisa de aportes anuais extraordinários para fechar suas contas. Ao responder sobre a falta de transparência nas contas públicas, que se materializou das mais variadas formas ao longo deste governo (as últimas delas são as ‘pedaladas’ na Caixa e no Banco do Brasil, ou seja, o atraso no repasse de recursos para programas sociais), o ministro afirmou que a dívida pública atual é muito menor (em proporção ao PIB) do que na era FHC.

Por fim, o ministro não reconheceu qualquer falha no modelo econômico que executou nos últimos anos. Disse que todas as suas ações foram, na verdade, reações a uma crise sem precedentes que drenou o dinheiro do mundo. Quando confrontado por Armínio Fraga sobre a razão de a América Latina, a Europa e os Estados Unidos crescerem mais que o Brasil, segundo o relatório mais recente do Fundo Monetário Internacional (FMI), Mantega manteve sua palavra. Disse que 90% dos países terão crescimento pífio ou negativo, em 2014, por causa da crise. O relatório do FMI, que pode ser lido aqui, mostra uma realidade muito diferente daquela pintada pelo ministro. As economias avançadas, que naturalmente crescem num ritmo mais lento e também foram devastadas pela crise, crescerão 1,8% em 2014 e 2,3% em 2015. Os Estados Unidos, país mais afetado pela quebradeira de 2008, vai crescer 2,2% e 3,1%, respectivamente. A China vai crescer 7,4% e 7,1%. O Brasil, por sua vez, crescerá 0,3% e 1,4%, de acordo com as projeções. Poucos países terão, em 2014, desempenho pior que o Brasil: entre eles estão Rússia, Líbia, Ucrânia, Itália e Iraque.

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Em última instância, o crescimento do PIB não passa de um simples número. O problema maior é que o ministro, que se despede do governo em dois meses, não fez um diagnóstico limpo de sua gestão num momento em que aquilo que o eleitor mais precisa é de transparência.

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