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Como usar o dinheiro público

Para que serve um banco estatal de desenvolvimento

Por André Lahóz Mendonça de Barros
Atualizado em 25 jun 2019, 16h57 - Publicado em 21 jun 2019, 07h00

É curiosa a história do BNDES, o banco que voltou aos holofotes nesta semana com a ruidosa queda de seu presidente, Joaquim Levy. Foi concebido nos anos 50 por um medalhão do liberalismo nacional, Roberto Campos, o Bob Fields tão hostilizado por nossa esquerda. E, no entanto — como é complexo este país! —, virou peça central da visão nacional-desenvolvimentista que predominou no Brasil durante décadas, especialmente em seus momentos mais delirantes.

Em teoria, há uma justificativa clara para a atuação do banco. Em inúmeras situações práticas, muitos investimentos bem-vindos para a sociedade acabam não acontecendo por falta de interesse do capital privado. São casos em que, para usar o jargão, o retorno social supera o retorno privado, uma falha de mercado descrita já por Adam Smith, o pai da ciência econômica, faz mais de 200 anos. Imagine uma estrada que tenha o potencial de desenvolver uma região nova. É improvável que alguma empresa tope construí-la, já que, pelo menos nos primeiros anos, não haverá tráfego em alta escala. O livre funcionamento do mercado, nesse caso, fará com que a estrada simplesmente não saia do papel. Mas existe aí uma clara oportunidade de ação estatal: afinal, a estrada de fato pode impulsionar o crescimento.

O difícil é separar o joio do trigo. Ou seja, quando há real necessidade do investimento público e quando há apenas políticos querendo gastar o dinheiro de todos. O Brasil procurou em diferentes momentos históricos erguer uma indústria naval. Na última das tentativas, nos governos Lula e Dilma, bilhões de reais foram repassados a estaleiros que hoje estão sucateados. Foi naquele ambiente de euforia que buscamos criar fantasiosos campeões nacionais que brigariam com multinacionais pelo mundo. Talvez o mais emblemático desses campeões tenha sido a Odebrecht. O grupo levou 7 bilhões de reais do BNDES em empréstimos sem garantia, que agora estão sob alto risco de não ser devolvidos. O mesmo pode ocorrer com créditos que foram dados a obras em Cuba e na Venezuela. Na soma de todos os casos, uma fortuna em dinheiro público pode virar pó. Também é difícil justificar por que o banco estatal se tornou sócio de várias empresas que figuram entre as maiores do país e seriam capazes de levantar capital com investidores privados. Trata-se de uma carteira de 115 bilhões de reais em participações que não cobrem nenhuma falha de mercado — a lacuna que justificaria o fato de o Estado entrar com dinheiro do contribuinte.

É contra esse estado de coisas que se batia Joaquim Levy. Acabou defenestrado pelo próprio presidente Jair Bolsonaro, que ganhou sua improvável eleição encampando um discurso liberal que nunca foi o seu. Em parte, o pecado de Levy foi ter trabalhado em outras gestões, independentemente da cor partidária — a exata definição de uma gestão técnica. Está claro que, mais do que competência, o que se busca são membros de uma seita. É torcer para que seu sucessor, Gustavo Montezano, esteja à altura do profissional que acaba de ser chutado do governo.

Publicado em VEJA de 26 de junho de 2019, edição nº 2640

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