Assine VEJA por R$2,00/semana
Continua após publicidade

Capital estrangeiro não anula necessidade de ajuste fiscal

Dependência de investimentos externos acaba deixando país vulnerável a crises

Por Ana Clara Costa
25 jan 2011, 18h07

O Banco Central divulgou nesta terça-feira uma série de recordes de investimentos feitos por estrangeiros no Brasil em sua nota sobre o setor externo. Os mais expressivos são os aportes que chegaram via compra de ações de empresas na bolsa de valores e os investimentos estrangeiros diretos (IED) – de 37 bilhões de dólares e 48,5 bilhões de dólares, respectivamente.

Enquanto países europeus agonizam para atrair capital externo, como é o caso da Grécia, Irlanda e Portugal, o Brasil desfruta uma posição confortável – com boas perspectivas de crescimento, taxa de juros atrativa para o investidor estrangeiro e um mercado de capitais bem regulado e pouco volátil.

A grande questão é que, juntamente com tais aportes, o país vem acumulando, ano após ano, um expressivo déficit em conta corrente (saldo negativo nas transações com outros países) que chegou, em dezembro de 2010, a 47 bilhões de dólares – ou 2,28% do Produto Interno Bruto (PIB). Na avaliação dos economistas ouvidos pelo site de VEJA, a esquizofrenia representada pelo aumento de investimentos, ao mesmo tempo em que cresce o déficit em conta corrente, se explica pelo fato de o Brasil ser um país que investe mais do que poupa.

Tais investimentos são financiados, em grande parte, pelo setor privado e – como se pode comprovar – pelo investidor estrangeiro. No mês de dezembro, cerca de 15 bilhões de dólares chegaram ao país por meio de investimento direto – compra de participação em empresas fechadas ou investimento direto em projetos de infraestrutura. Desse total, 8 bilhões de dólares foram direcionados ao setor de óleo e gás. Se os prazos para a extração do pré-sal se mantiverem, assim como a viabilidade de suas reservas, o Brasil poderá continuar contando com aportes externos volumosos. “Em um horizonte de curto prazo, tudo bem. Mas o que acontecerá quando esse capital sair do país? O Brasil precisa encontrar uma forma de financiar seus investimentos”, afirma Guilherme Mercês, economista da Federação das Indústrias do Estado do Rio de Janeiro (Firjan).

Para atingir essa autosuficiência, a receita é aquela velha conhecida dos economistas discípulos do liberalismo econômico: poupança interna – popularmente chamada de corte de gastos públicos. E isso significa que, enquanto o governo não cumprir essa tarefa, os dólares que entram pela via dos estrangeiros ajudam a financiar o crescimento do país. Qualquer medida que impeça a entrada desses recursos – como sugerido pelas alas mais radicais – acabará provocando efeitos negativos para a economia real.

Continua após a publicidade

Para se ter uma ideia da necessidade desses recursos, o índice de poupança privada chega a 15% do PIB. Já a poupança externa (os investimentos extrangeiros ou emissão de títulos da dívida externa) acumula algo em torno de 3% do PIB. Enquanto isso, a poupança interna (ou economia do governo) tem déficit nominal que chega a 2,7% do PIB. Ou seja: não há poupança, e sim gastos superiores à arrecadação. “Enquanto acumularmos déficit no setor público, fica difícil o real ceder e a nossa indústria continuará pouco competitiva”, diz Carlos Thadeu de Freitas Lopes, ex-diretor do Banco Central.

O fato talvez mais preocupante é que o país poderá não suportar novamente um aumento de quase 80% no déficit em conta corrente, semelhante ao que ocorreu em 2010 (quando o número passou de 1,52% para 2,28% do PIB). Além disso, analistas já avaliam a posição dos países da América Latina como sendo mais vulnerável a possíveis crises do que em 2008. Sendo assim, uma fuga de capital estrangeiro nos dias de hoje poderia prejudicar mais do que o previsto a solidez da economia nacional. As perspectivas, infelizmente, são de que o déficit cresça ainda mais, o que torna urgente uma ação de arrocho fiscal do governo. Segundo Octavio de Barros, economista-chefe do Bradesco, o déficit em conta corrente deverá encerrar 2011 em 3% do PIB.

A grande contradição desta conta está no fato de justamente os investimentos estrangeiros considerados especulativos (ações ou títulos de curto prazo) serem vistos, atualmente, como os financiadores do crescimento do país. O dinheiro que entrava e saía, ao sabor do apetite dos traders, transformava o mercado brasileiro em uma montanha-russa freqüentada por bravos. Hoje, sua presença é tão constante e cumulativa que ajuda a transformar o real em moeda forte. Vilões transformados em heróis até o próximo vento soprar na direção contrária.

Publicidade

Matéria exclusiva para assinantes. Faça seu login

Este usuário não possui direito de acesso neste conteúdo. Para mudar de conta, faça seu login

Domine o fato. Confie na fonte.

10 grandes marcas em uma única assinatura digital

MELHOR
OFERTA

Digital Completo
Digital Completo

Acesso ilimitado ao site, edições digitais e acervo de todos os títulos Abril nos apps*

a partir de R$ 2,00/semana*

ou
Impressa + Digital
Impressa + Digital

Receba Veja impressa e tenha acesso ilimitado ao site, edições digitais e acervo de todos os títulos Abril nos apps*

a partir de R$ 39,90/mês

*Acesso ilimitado ao site e edições digitais de todos os títulos Abril, ao acervo completo de Veja e Quatro Rodas e todas as edições dos últimos 7 anos de Claudia, Superinteressante, VC S/A, Você RH e Veja Saúde, incluindo edições especiais e históricas no app.
*Pagamento único anual de R$96, equivalente a R$2 por semana.

PARABÉNS! Você já pode ler essa matéria grátis.
Fechar

Não vá embora sem ler essa matéria!
Assista um anúncio e leia grátis
CLIQUE AQUI.