Assine VEJA por R$2,00/semana
Continua após publicidade

BC deixou cenário inflacionário se deteriorar, diz Daniel Lemos, ex-XP

Para o fundador da Riza Asset, o Banco Central está refém de previsões que ficaram no passado e o cenário para a bolsa de valores vai se deteriorar

Por Luisa Purchio Atualizado em 4 Maio 2021, 20h41 - Publicado em 4 Maio 2021, 15h54

O engenheiro de produção Daniel Albernaz Lemos, de 42 anos, ficou cerca de sete anos na XP e saiu no início de 2019, surpreendendo o mercado. Já com 20 anos de experiência no mercado de investimentos, à época ele era o segundo nome da XP Investimentos. Próximo do co-fundador Guilherme Benchimol, assumira o banco da XP e era responsável pela área de mercado de capitais. Alguns meses depois, Lemos ingressou na Riza Asset, um braço da então Riza Capital, a empresa voltada à fusão e aquisição de grandes empresas criada pelo ex-BTG Marco Gonçalves, conhecido no mercado como Marcão – no final de 2020, a Riza Capital foi vendida para a XP e Marcão assumiu a área de M&As da empresa.

Em janeiro de 2020, a Riza Asset foi lançada oficialmente, com o foco em gestão de recursos e suporte aos processos de fusões, e o primeiro fundo da empresa foi aberto no final de fevereiro, pouco antes da pandemia de Covid-19 derrubar as bolsas em todo mundo. Já naquela época, quando a Selic estava em  2% ao ano, a mínima histórica atingida pelo Brasil, Lemos apostava em fundos com um mix de ativos diferentes, incluindo renda fixa, debêntures, dívidas corporativas, securitização de recebíveis e recuperação de crédito. Na última sexta-feira, 30, a Riza Asset bateu 5 bilhões de reais sob gestão. Ao ingressar na Riza, Lemos esperava que o juros baixos permaneceriam no Brasil por um período de dois a três anos e já projetava que a inflação seria um desafio para o país, uma vez que crescimento econômico se contraporia aos seus limites estruturais. Pouco tempo depois, veio a pandemia e, por motivos diferentes, a inflação disparou.

Às vésperas da decisão do Copom, que, na quarta-feira, 5, deve subir a Selic em 0,75 ponto percentual, chegando a 3,50%, Lemos falou a VEJA sua análise sobre as decisões do Banco Central (BC). O mercado atualmente se encontra dividido entre os defensores da estratégia atual do Copom de subir gradualmente os juros e os críticos, os quais alegam que BC teria exagerado na dose de baixa ou até por não ter mantido por mais tempo um estímulo máximo à economia. Lemos faz parte dos integrantes do mercado que consideram que a Selic está abaixo do que deveria e o BC deixou o cenário inflacionário se deteriorar ao manter a esperança de que a situação fiscal do país poderia melhorar. Como isso não aconteceu, ele avalia que a instituição ficou refém das próprias projeções e não pode subir os juros de maneira drástica, para o patamar ideal, para não perder a credibilidade. Neste momento em que a Selic vai subir e os especialistas projetam que a renda fixa vai voltar com força no país, a projeção é de que faltará interessados na bolsa de valores brasileira e que ela vai se deteriorar.

Qual é a expectativa da Riza sobre a reunião do Copom?
Temos duas percepções. Achamos que o Copom deveria fazer ajuste de política monetária o quanto antes. Por outro lado, ele percebeu que a mudança drástica de discurso em todas as minutas e atas do Copom foi sentida pelo mercado em forma de volatilidade. Pouco tempo antes de ter feito o aumento de 75 bps (pontos de base, em inglês), o discurso do BC era outro e praticamente falava que ia ficar durante dois anos com uma política de forward guidance (indicando o caminho futuro dos juros), com manutenção da Selic enquanto algumas condições não fossem atingidas.

Continua após a publicidade

Quais foram as consequências desta mudança inesperada de discurso?
Obviamente não dá para isolar os efeitos como da PEC do Orçamento, as decisões do ministro do STF Edson Fachin e diversas coisas que aconteceram mais ou menos na mesma época, mas com certeza a Selic contribuiu com a volatilidade e com uma insegurança dos investidores sobre a velocidade em que a política monetária de menos acomodação seria restabelecida.

Na sua avaliação, qual seria a alta ideal da Selic?
De 100 a 150 bps (o aumento de 1 a 1,5 ponto percentual). Dado que a inflação já está saindo da meta para a projeção do ano que vem, o BC deveria normalizar pelo menos para um juro real perto do que está a inflação para termos juros zero corrente o quanto antes. Essa é a alta necessária, mas o Banco Central provavelmente vai aumentar de 75 a 100 bps. Acho difícil fugir disso.

Por que o Banco Central decidirá subir a Selic em apenas 75 bps, frente à alta inflação do país?
Ele fica um pouco refém do próprio discurso. O último comunicado colocou que enxergava uma outra alta de 75%, o que de certa forma ancora a expectativa das pessoas. No entanto, de lá para cá a situação fiscal piorou, tanto a qualidade da discussão fiscal quanto a consciência política do que significa ter quase 100% de dívida em relação ao PIB. Neste momento em que estamos com o juros real negativo é mais tranquilo, mas na hora que tiver de jogar o juros para 6, 7 ou 8 por cento, esses encargos fiscais ficam brutais. O Banco Central percebeu que não existe uma consciência política fiscal.

Continua após a publicidade

Havia uma expectativa de reformas nos comunicados do Copom.
A nossa análise é que o BC aguardou erradamente uma sinalização ou uma evolução mais forte do lado fiscal, de reformas e perspectivas de privatização. Ele postergou demais o ajuste de política monetária e deixou o cenário inflacionário se deteriorar com essa esperança, acreditando que a inflação seria transitória. Mas a situação fiscal piorou na margem em relação às estimativas e expectativas de todo mundo e essa deterioração se tornou insustentável. Nossa impressão é que chegou uma hora que o Banco Central teve de jogar a toalha e fazer o ajuste. Até mesmo com a independência do BC, não dá para entrar no jogo político no Brasil, onde é impossível acertar qualquer previsão.

Como a alta da Selic alterará as teses de investimento?
A gente acha que é brutal. Um CDB de banco com rentabilidade de 130% do CDI significa 2,6% ao ano quando a Selic está a 2% ao ano. Porém, esta rentabilidade sobe para 9% quando a Selic sobe para 6,5%. É fato que o Brasil é rentista e o efeito da baixa da Selic que vimos na bolsa de valores foi muito grande. Na margem ele tem vários aspectos de bolha e enquanto essa Selic estava muito baixa esse jogo fazia sentido, porque o cara não tinha muito onde colocar os recursos. Quando o custo de oportunidade subir, vai ter uma realocação enorme de ativos.

Já há alguma previsão que quantifique esta realocação?
É difícil mensurar, mas em setembro e outubro do ano passado as LFTs (Letras Financeiras do Tesouro) tiveram rendimento negativo porque não havia demanda, só vendedor. Ninguém quis carregar as LFTs porque a rentabilidade estava abaixo da inflação. Com isso, o deságio foi considerável. Este é um exemplo de que a taxa de juros para atração de poupança estava totalmente fora do lugar. Achamos que, do ponto de vista do investidor local, ter 6,5% ou 7% ao ano de rentabilidade sem risco vai fazer faltar dinheiro para sustentar altas na bolsa. Pode ser que o investimento estrangeiro venha se o Brasil estiver com problemas resolvidos, mas ano que vem haverá eleição. Na nossa avaliação, o cenário para a bolsa é muito desfavorável. A alta da Selic, dos papéis do Tesouro, o processo eleitoral, a ausência de investimento estrangeiro e a crise sanitária ainda muito forte tornam o cenário inviável.

Continua após a publicidade

Quais são as novas apostas da Riza neste cenário?
Achamos que o nosso fundo Meyenii, de crédito estruturado, tem um potencial enorme neste cenário. Ele tem uma super demanda e no ano passado rendeu CDI +8%. Com o CDI atual baixo, esta é uma rentabilidade OK. Na hora que a Selic crescer 6%, ele rende 14%. Temos apostado muito nesse fundo, com expansão de área e novas contratações.

Publicidade

Matéria exclusiva para assinantes. Faça seu login

Este usuário não possui direito de acesso neste conteúdo. Para mudar de conta, faça seu login

Domine o fato. Confie na fonte.

10 grandes marcas em uma única assinatura digital

MELHOR
OFERTA

Digital Completo
Digital Completo

Acesso ilimitado ao site, edições digitais e acervo de todos os títulos Abril nos apps*

a partir de R$ 2,00/semana*

ou
Impressa + Digital
Impressa + Digital

Receba Veja impressa e tenha acesso ilimitado ao site, edições digitais e acervo de todos os títulos Abril nos apps*

a partir de R$ 39,90/mês

*Acesso ilimitado ao site e edições digitais de todos os títulos Abril, ao acervo completo de Veja e Quatro Rodas e todas as edições dos últimos 7 anos de Claudia, Superinteressante, VC S/A, Você RH e Veja Saúde, incluindo edições especiais e históricas no app.
*Pagamento único anual de R$96, equivalente a R$2 por semana.

PARABÉNS! Você já pode ler essa matéria grátis.
Fechar

Não vá embora sem ler essa matéria!
Assista um anúncio e leia grátis
CLIQUE AQUI.