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A longa crise na Europa

A crise ainda não acabou quatro anos depois do resgate da Grécia pela União Europeia, mas o bloco de moeda única continua integrado

Por Barry Eichengreen
18 Maio 2014, 10h28

Maio marca o quarto aniversário do resgate financeiro europeu à Grécia, que começou em 2010. Anteriormente, a ideia de que um membro da zona do euro recorreria a uma assistência de emergência do Fundo Monetário Internacional (FMI), juntamente com a Comissão Europeia e o Banco Central Europeu (BCE), era impensável. Desta forma, o resgate marcou a entrada da Europa em uma crise plena.

Quatro anos depois, autoridades europeias asseguram a todos que a crise acabou. O FMI aumentou a sua previsão para o crescimento da zona do euro este ano para 1,2%. Até mesmo a Grécia deve experimentar um crescimento modesto, mas não insignificante, de 0,6%.

Os mercados de títulos também indicam que a crise acabou. Os rendimentos de títulos do governo Irlandês caíram abaixo dos 3%. No mês passado, Portugal pôde emitir obrigações de dez anos a uma taxa de 3,57%. Até mesmo a Grécia podia vender obrigações de cinco anos com índices abaixo dos 5%.

Obviamente, provou-se que os supostos peritos que previram a iminente desintegração da zona do euro foram desmentidos pelos fatos. No entanto, é igualmente provável que aqueles que declaram que a crise acabou serão contrariados da mesma forma.

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Se nós aprendemos alguma coisa nos últimos quatro anos é que a União Europeia não tem capacidade de agir de forma decisiva. Com 28 países membros, os processos de tomada de decisão são entediantes e exigem tempo. Os interesses comuns são difíceis de definir, o que complica alcançar os acordos de partilha de encargos. A ação é considerada mais urgente por alguns países do que para outros.

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Além disso, o doente está longe de estar curado. Irlanda, Portugal, Espanha e Grécia fizeram progressos consideráveis para reduzir os seus custos unitários de mão-de-obra aos níveis de 1999 – comparativos à Alemanha. O problema é que os níveis de 1999 não são suficientes porque os produtores agora têm de lidar com a China e outros mercados emergentes. Itália e França, entretanto, fizeram consideravelmente menos progressos na melhoria de sua competitividade internacional.

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Também não é claro onde os países em crise encontrarão a demanda de que necessitam. Com os gastos internos em queda, eles dependem das exportações. No entanto, com a diminuição do ritmo de crescimento dos mercados emergentes, enfraquecem também seus mercados consumidores. As exportações espanholas, que seguiram uma tendência positiva recentemente, pararam de subir. E a Espanha pode ser o canário proverbial numa mina de carvão (tradução de “proverbial canary in a coalmine”, expressão que é usada para dizer que alguém emite um sinal de alerta em momentos de perigo).

O BCE, pela parte que lhe toca, continua fazendo muito pouco para suportar a demanda. Esteve sempre recuado desde 2011. Se decidir finalmente pelo afrouxamento monetário quantitativo, em junho, só engatinhará nesse sentido, porque o presidenteMario Draghi e a sua equipe continuam relutantes em adotar o tipo de medidas drásticas que chocaria os seus senhores políticos.

No plano orçamentário, os novos primeiros-ministros francês e italiano, Manuel Valls e Matteo Renzi, respectivamente, propuseram reduzir os impostos dos trabalhadores com salários mais baixos e dos seus empregadores. Essa é uma ação positiva para melhorar a situação daqueles que mais sofreram com a crise de desemprego. Mas, Valls e Renzi também pretendem cortar gastos para evitar que os seus défices orçamentários aumentem o que significa que as suas iniciativas não estimularão a demanda.

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Enquanto isso, a crise bancária na Europa continua sem solução. Os empréstimos para financiar os investimentos fixos continuam caindo. É notável que os últimos testes de estresse da Autoridade Bancária Europeia com os bancos da zona do euro não preveem a possibilidade de deflação no seu cenário adverso. A implicação é clara: o déficit de capital dos bancos será subestimado, e a quantidade de capital novo, que serão obrigados a aumentar, será insuficiente. Se o objetivo é restaurar a confiança e obter um sistema bancário, atirando em todas as frentes, não é a melhor abordagem.

Todos sabemos que a tão proclamada união bancária é profundamente falha. Ela cria um único supervisor, mas apenas para os bancos maiores. Harmoniza a cobertura do seguro de depósito, mas não aprovisiona um fundo comum de seguro de depósito. O mecanismo de resolução para maus bancos é incompreensível e impraticável. O fundo de resolução terá apenas 55 bilhões de euros (75,350 bilhões de dólares) do seu capital próprio, ao passo que os passivos do Banco Europeu são da ordem 1 trilhão de euros.

Finalmente, há essa inoportuna questão da dívida pública, que ainda é de 90% do PIB da zona do euro. As autoridades europeias propõem trabalhar na sua diminuição até a meta de 60% em duas décadas. Você leu corretamente. Volte em 2034 para ver como é que se saíram.

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Tudo isso tem os ingredientes de um prognóstico sombrio. Mas é o modo como a Europa progride. A sua união bancária certamente não é perfeita, mas, pelo menos ela existe, e ao longo do tempo essas falhas podem ser corrigidas. Os testes de estresse podem ser falhos, mas são melhores que as duas tentativas anteriores para a Europa. A ação do BCE neste verão pode decepcionar, mas pelo menos os responsáveis pela política monetária da zona euro farão alguma coisa.

A zona do euro não vai entrar em colapso este ano, mas os seus problemas estão longe de terminar. A Europa não colocará um ponto final na crise. Determinação não é a característica de funcionamento da UE.

Barry Eichengreen é Professor de Economia e Ciência Política da Universidade da Califórnia, em Berkeley.

© Project Syndicate, 2014

(Tradução: Roseli Honório)

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