Sem voz própria: falta emoção a ‘Elis’, o filme da cantora-emoção
A cinebiografia de Elis Regina não conseguiu pôr em cena aquilo que sempre se viu e ouviu nas apresentações da maior cantora brasileira: emoção
Elis Regina (1945-1982) cantou de tudo — do samba à disco music —, e cantou sempre bem: para fora, com emoção. Tal emoção, porém, não chega a aparecer em Elis, que estreia nesta quinta-feira. Como é comum em cinebiografias de artistas, o filme do diretor estreante Hugo Prata mostra uma sucessão de shows e apresentações em festivais e programas de TV. Mas nenhuma dessas cenas desponta como um momento de consagração inconteste: um espectador que porventura não conhecesse Elis não sairia do cinema convencido de que aquela foi a maior intérprete brasileira de todos os tempos.
Andreia Horta entregou-se vigorosamente ao papel de Elis, mas sua bela atuação apaga-se sob o convencionalismo de uma narrativa que, a partir da chegada da cantora gaúcha ao Rio de Janeiro, em 1964, segue até o fim de forma linear, sem flashbacks nem grandes saltos no tempo. Os dois maridos que Elis teve estão bem representados: Gustavo Machado faz de Ronaldo Bôscoli um refém de sua própria cafajestice, para quem a necessidade de namorar todas as mulheres do Rio estava acima da felicidade familiar, e Caco Ciocler capta cada detalhe da timidez do pianista César Camargo Mariano. Outros personagens — como Nelson Motta (Rodrigo Pandolfo) e Henfil (Bruce Gomlevsky) — entram e saem de cena sem que se entenda bem o que fazem na história.
Prata deu peso talvez demasiado aos problemas de Elis com o regime militar. Em compensação, passou ao largo de momentos altos da carreira de sua personagem. A omissão mais escandalosa: nada se diz sobre a gravação de Elis & Tom, disco no qual a cantora combinou sua voz ao talento de Tom Jobim. A morte, causada por uma mistura de álcool e cocaína, ganha uma cena apressada e fria. O filme carece, enfim, daquilo que se via quando Elis estava em palco: força dramática.
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