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Para advogados, condenação de Biel por assédio sexual é improvável

Rigidez do artigo que prevê o crime deve inocentar o cantor em julgamento

Por Henrique Castro Barbosa
12 jun 2016, 08h33

O protótipo de Justin Bieber tupiniquim Biel dominou os noticiários nesta semana após chamar uma jornalista que o entrevistava de “gostosa” em diversas oportunidades e afirmar que a “quebraria no meio” e que a “levaria para um motel” e a “estupraria rapidinho”. O funkeiro foi acusado de assédio sexual pela repórter, que procurou uma Delegacia da Mulher para se defender. O problema é, apesar de altamente reprovável, nos termos de lei a conduta dificilmente resultará em uma condenação para o intérprete de Química. É o que dizem três advogados criminalistas ouvidos pelo site de VEJA.

O artigo 216-A do Código Penal Brasileiro, que prevê o crime de assédio sexual, é claro ao afirmar que, para que o crime exista, é necessária uma hierarquia ou ascendência inerente a uma relação profissional. Ou seja, pela lei, só há assédio sexual quando as duas pessoas envolvidas estão uma em situação de subordinação uma perante a outra, com riscos imediatos para a vítima – como quando, por exemplo, o alvo refuta o assédio e perde o emprego. A jornalista que denunciou Biel estava em pleno exercício de sua função, mas o funkeiro não é seu superior hierárquico e por isso pode escapar ileso da situação. A definição do crime, conforme o artigo 216-A, é: “Constranger alguém com o intuito de obter vantagem ou favorecimento sexual, prevalecendo-se o agente de sua condição de superior hierárquico ou ascendência inerentes ao exercício de emprego, cargo ou função”.

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Por outro lado, embora pouco provável, há alguma chance de que um juiz faça uma leitura mais ampla da lei, à luz do movimento em defesa da mulher que vem tomando o espaço público – inclusive as redes sociais. “Hoje, muitas pessoas entendem que a definição desse tipo de crime vai além do que está escrito no código, até pela disseminação do movimento feminista”, diz a advogada Mariana Bissoni.

Ainda que fosse condenado, Biel poderia se beneficiar do abrandamento de pena facultado a um réu primário. No final das contas, na improvável hipótese de ser condenado, o cantor pegaria no máximo dois anos de punição em regime inicial aberto, quando há risco de mudança para um formato mais restritivo se o réu apresenta mau comportamento durante o cumprimento da pena.

Judiciário machista – Apesar da forte discussão, hoje, sobre feminismo, Mariana Bissoni acredita que o judiciário se mantenha conservador. “Acho difícil que Biel seja condenado por causa do conservadorismo e do machismo presentes no poder judiciário”, diz.

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Para a criminalista, o maior risco de Biel vem da frase em que ele diz que “estupraria” a jornalista. “É uma pena que a sua entrevista não seja a última”, afirma ele para a repórter, durante uma rodada de conversas sobre seu novo disco, Juntos Vamos Além, há mais de um mês. “Eu te levava para o motel e te estupraria rapidinho.” Segundo Mariana, a frase pode ser enquadrada como ameaça, prevista no artigo 147, e pode render multa ou detenção em regime aberto de um a seis meses. “Enquanto mulher, eu acho que foi uma ameaça sexual assustadora, gravíssima. Além de ter sido uma violação da dignidade da repórter, que estava ali fazendo o trabalho dela”, avalia. Para que ele seja acusado de ameaça, entretanto, a lei exige que a vítima faça uma representação, isto é, um processo contra o agressor. O site de VEJA procurou detalhes sobre o caso, mas a delegada responsável, Giovanna Valenti, da Primeira Delegacia da Mulher de São Paulo, não atendeu a reportagem.

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Imoral e ilegal – Para o criminalista Leonardo Pantaleão, a repórter aviltada por Biel teria maiores chances de reparação se o processasse por danos morais, ação que correria na esfera civil e não na penal. “Assédio sexual está descartado por completo, mas ela poderia ganhar uma eventual indenização por danos morais”, diz o advogado. A jornalista, vale ressaltar, foi alvo das brincadeiras de mau gosto do funkeiro diante de outras pessoas, outros jornalistas que, como ela, estavam na sede da gravadora Warner Music para entrevistá-lo. “Nem tudo que é imoral é ilegal”, diz Pantaleão.

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Outra possibilidade, levantada pela advogada Thaís Guerra, seria a de o cantor ser culpado por importunação ofensiva, isto é, por proferir imoralidades com grosseria e com teor de baixo calão, incomodando a repórter em público. A advogada, entretanto, deixa claro que o delito não é considerado um crime, mas uma contravenção penal, que poderia render apenas multa.

Na altamente improvável hipótese de Biel receber diversas condenações, não haveria soma de penas. “Por se tratar do mesmo fato, a condenação por duas vezes caracteriza o que chamamos de bis in idem, um direito que proíbe que a pessoa seja processada duas vezes em razão do mesmo fato”, explica Thaís.

Como solução final, a advogada defende um debate mais aberto para o caso – algo que transcenda a esfera jurídica. “Deve-se discutir por que um homem se sente confortável em se referir a uma mulher da maneira como Biel se referiu a essa jornalista. É a cultura do estupro e da banalização da violência. O direito penal é um instrumento ineficaz para tornar a sociedade mais segura e agradável para nós. Espero que um dia possamos viver em um mundo em que os homens nos respeitem e que não se sintam confortáveis em agir dessa forma, independentemente da possibilidade de uma repreensão criminal para o fato”, diz.

Omissão de socorro – Além da acusação por assédio, Biel responde por omissão de socorro ao deixar de prestar ajuda a uma motociclista derrubada por ele em sua cidade natal, Lorena, na última terça-feira. Como a vítima não sofreu lesão corporal de natureza grave, a condenação do funkeiro pode resultar em pena de um a seis meses de detenção em regime inicial aberto ou apenas em multa.

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