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Oliver Stone reconstrói em tom sóbrio a trajetória de Snowden

Jovem analista de inteligência que denunciou a vigilância indiscriminada sobre os cidadãos americanos ganha filme equilibrado

Por Isabela Boscov
Atualizado em 4 jan 2018, 16h02 - Publicado em 10 nov 2016, 09h52

Em um filme de Oliver Stone, espe­ra-se certo tipo de herói: um homem cujo apego ao dever e à pátria é tão intenso que beira o fervor — mas que, no cumprimento desse dever, se vai desencantando até o ponto em que decide que o correto é cometer o que alguns definiriam como um ato de traição. Homens assim febris conduziram os trabalhos mais memoráveis do diretor: os soldados de Platoon e de Nascido em 4 de Julho, o promotor de JFK — A Pergunta que Não Quer Calar. O tom, porém, é decididamente mais sóbrio do que o habitual para Stone em Snowden — Herói ou Traidor (Snowden, Estados Unidos/França/Alemanha, 2016), que estreia no país nesta quinta-feira. O diretor reconstitui a trajetória de Edward Snowden, autor do mais extenso vazamento de informações da história da Inteligência americana, com a moderação necessária para não expor ainda mais a já arruinada vida do personagem, desde 2013 obrigado a um exílio imprevisto na Rússia (estava em fuga para a América do Sul quando seu passaporte foi revogado e ele se viu impedido de deixar o aeroporto de Moscou). E, apesar da franca tomada do partido de Snowden, constata-se no filme um grau muito maior de racionalidade na visão de Stone, outrora tão afeito às teorias conspiratórias.

Autodidata brilhante, Snowden foi recrutado pela CIA quando teve de interromper seu treinamento militar por causa de fraturas graves nas pernas. Caiu sob duas influências opostas: a do seu mentor na agência (vivido por Rhys Ifans), favorável à ideia de que os fins — coibir o terrorismo e a invasão digital — justificam os meios, por mais abusivos que estes sejam, e a de um analista veterano (Nicolas Cage) posto de escanteio por ter criado um programa de vigilância que bloquearia toda informação pessoal que não coubesse ao Estado devassar. É para efeito dramatúrgico que essas figuras são recortadas de maneira tão nítida. Elas personificam a ambivalência que começou a se manifestar em Snowden à medida que sua carreira na Inteligência progredia, primeiro como funcionário da CIA e depois no setor privado, prestando serviços às agências governamentais. Joseph Gordon-Levitt é uma escolha excelente para o papel: consegue parecer tão introvertido quanto Snowden ao mesmo tempo em que obtém da plateia uma reação de empatia — uma compreensão não apenas intelectual, mas emocional, dos motivos que o levaram a delatar, no que as autoridades americanas consideram ser crime de alta traição.

No documentário ganhador do Oscar Citizenfour (e é a filmagem desse documentário, em um quarto de hotel em Hong Kong, que o filme de Stone usa como espinha dorsal), a ambivalência de Snowden fica clara. Rapaz disciplinado, que nunca trocou de namorada (no filme, Shailene Woodley) e nem café bebia, Snowden gostava da adrenalina de saber segredos, participar de um círculo fechado, escrever softwares revolucionários. Mas começou a se sentir envenenado pela enormidade do que estava propiciando: programas de invasão indiscriminada e ilimitada da privacidade dos cidadãos comuns. Snowden tinha 29 anos quando divulgou as evidências recolhidas na Agência de Segurança Nacional. Se retornar aos Estados Unidos, provavelmente será condenado e executado. Na Rússia, vive em estado jurídico indefinido (e, vale lembrar, está num país governado com mão de ferro por um ex-espião da KGB). Stone constrói com considerável eletricidade, mas também com equilíbrio, essa jornada de idealismo e desilusão.

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