Diante da plateia, Rita (Amanda Brugel) discursa sobre a recém-conquistada liberdade. Sob a função de “Martha” — doméstica escravizada de Gilead, ditadura teocrática que ocupa parte do antigo território dos Estados Unidos —, Rita fugiu para o Canadá em um avião clandestino junto com 86 crianças. Todas foram devolvidas às suas famílias legítimas — antes, haviam sido sequestradas pelo governo de Gilead e dadas a casais sem filhos da elite, já que a infertilidade é regra no futuro distópico pintado por The Handmaid’s Tale. A fuga que encerra a terceira temporada da série é o ponto de partida de sua quarta fase, que acaba de chegar ao Brasil pelo serviço de streaming Paramount+. Ao narrar a façanha, Rita exalta o heroísmo de June (Elisabeth Moss), uma aia — título dado às mulheres férteis feitas de escravas sexuais — que orquestrou a ação libertária: “Gilead sabe trazer à tona o pior de uma pessoa. Mas, no caso de June, trouxe o melhor”. No caos, porém, os conceitos de melhor e pior se confundem: ainda em Gilead, a atormentada June instiga uma jovem a matar a facadas um homem que a estuprou.
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É delicada a balança em que se equilibra The Handmaid’s Tale, mantendo de um lado a violência e o sofrimento intrínsecos à realidade da trama e, de outro, pequenas fagulhas de esperança liberadas a conta-gotas. Mas, na nova temporada, suas protagonistas entreveem a luz no fim do túnel — e não é fortuita a correspondência entre a ficção e a guinada política real nos Estados Unidos. Lançada em 2017, a distopia adaptada da obra de Margaret Atwood se tornou símbolo de resistência pop ao populismo sexista de Donald Trump. A aia June foge para liderar a resistência ao autoritarismo, mas a trilha rumo à liberdade não é fácil: a polarização e a discórdia são ameaças sempre à espreita.
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June deixou Gilead para trás, mas isso não a livra de provações. No caminho a um destino desconhecido, é acolhida por uma jovem esposa violenta e traumatizada, forçada a se casar na adolescência. Depois, por um grupo de insurgentes de regras controversas. A liberdade é uma conquista inestimável — mas será preciso lutar com unhas e dentes para defendê-la.
Publicado em VEJA de 12 de maio de 2021, edição nº 2737
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