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Mais trabalhadores optam por ser os próprios chefes

As mudanças do mercado e o desejo de liberdade potencializam o movimento

Por Larissa Quintino, Felipe Mendes Atualizado em 8 jan 2021, 18h20 - Publicado em 8 jan 2021, 06h00

De tempos em tempos, o mundo do trabalho passa por grandes rupturas. Na Revolução Industrial, entre os séculos XVIII e XIX, os operários começaram a dar expediente nas fábricas em troca de salário regular e as relações entre patrão e empregado eram estabelecidas por contrato. No início do século XX, países como Alemanha e México introduziram as primeiras leis trabalhistas que limitavam abusos e garantiam direitos e proteções. Logo após a crise de 1929, o desemprego elevado obrigou nações como Estados Unidos e Inglaterra a diminuir a jornada laboral, o que acabaria abrindo espaço para que novas contratações fossem feitas. Nas últimas décadas, pouca coisa mudou. De maneira geral, o trabalho para a maioria das pessoas consiste em dar expediente de segunda a sexta-feira, em períodos de oito a dez horas diárias e mediante uma série de regras definidas pelo Estado e pelas empresas. Agora, uma nova revolução está em curso — talvez a mais radical da história. Trata-se da ascensão do trabalho independente, livre das amarras das relações formais, e que abre um imenso campo de possibilidades para profissionais de diversas áreas. Cada vez mais o indivíduo será seu próprio patrão.

As transformações são resultado principalmente do avanço tecnológico e do surgimento de uma nova geração de empresas e trabalhadores que estão dispostos a romper com o passado, custe o que custar. Inovações como a inteligência artificial associada a sistemas eficientes de comunicação permitiram, por exemplo, que boa parte dos ofícios pudesse ser feita a distância. Na indústria 4.0, robôs controlados por mentes pensantes posicionadas em cidades longínquas conseguem restaurar equipamentos, construir máquinas fabris e até controlar uma planta industrial inteira — e tudo isso a uma velocidade impressionante. Processos mais ágeis liberam os funcionários para exercer outras atividades, inclusive a prestação de serviços a terceiros. “Cada vez mais, haverá menos emprego e mais trabalho”, afirma o presidente do Sebrae, Carlos Melles.

As empresas, por seu lado, perceberam que colaboradores livres podem ser mais produtivos. Nenhuma levou a máxima tão a sério quanto a americana Netflix. Os funcionários da líder global dos serviços de streaming tiram o tempo de férias que desejarem e quando bem entenderem. “Muito antes da Netflix, eu já acreditava que o valor de um trabalho criativo não devia ser medido por horas de trabalho”, escreveu Reed Hastings, fundador da companhia, no livro A Regra É Não Ter Regras. “Esse tipo de pensamento é uma relíquia da era industrial, quando os funcionários executavam tarefas que agora são feitas por máquinas.” Outros gigantes, como a também americana Microsoft e a britânica Unilever, ensaiam a introdução da semana de quatro dias para que os funcionários possam usufruir o tempo da maneira que acharem melhor — eles, afinal, mandam na própria carreira.

CERQUEIRA - Satisfação na troca de uma pet shop pelo trabalho de casa em casa -
CERQUEIRA – Satisfação na troca de uma pet shop pelo trabalho de casa em casa – (Claudio Gatti/VEJA)

No Brasil, a reforma trabalhista de 2017 foi um importante passo para tornar as relações entre empregados e patrões mais flexíveis, aproximando o sistema brasileiro dos países desenvolvidos. É pouco diante da brutal transformação que está por vir. De certa forma, a pandemia acelerou as mudanças. Com as restrições de circulação, o home office tornou-se uma realidade possível para milhões de pessoas. Empresas como Facebook e Twitter e a brasileira XP estão entre as que pretendem adotar o trabalho a distância permanente, pelo menos para parte de seus funcionários. Em casa, ressalte-se, dividir o trabalho entre vários clientes — ou vários patrões — pode ser mais fácil.

Como a história ensina, crises profundas como a de 2020 são desencadeadoras de revoluções. Sem emprego, muitas pessoas foram obrigadas a buscar caminhos por conta própria, antecipando processos que, cedo ou tarde, chegariam. Há vinte anos no ramo de pet shops, José Nilton Cerqueira viu o movimento da empresa onde trabalhava cair a praticamente zero durante a pandemia. A necessidade de manter alguma renda fez com que buscasse alternativas. Em maio, lançou uma pet shop móvel, que vai até a casa dos clientes para prestar o serviço de banho e tosa. “Minhas despesas foram reduzidas e consegui continuar trabalhando em uma condição que me dá maior flexibilidade”, afirma. “Agora, dependo apenas do meu trabalho. Essa liberdade não tem preço.” As grandes rupturas sempre trazem desafios. Para ser o próprio chefe, é preciso desfrutar boa reputação e ser capaz de promover o que os especialistas chamam de autogestão. Em outras palavras: administrar bem o tempo, buscar incessantemente novos clientes e manter reservas financeiras. Se fizer tudo isso, o trabalhador individual estará pronto para os novos tempos.

Publicado em VEJA de 13 de janeiro de 2021, edição nº 2720

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