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Interpol lança aplicativo para ajudar na busca de obras de arte roubadas

O ID-Art abre ao público a lista de peças nas mãos de criminosos. Tráfico dessas relíquias movimenta 10 bilhões de dólares anuais

Por Alessandro Giannini Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO Atualizado em 21 Maio 2021, 09h14 - Publicado em 21 Maio 2021, 06h00

Na madrugada de 30 de março, golpes de marreta abriram caminho para um invasor entrar no Museu Singer Laren, na Holanda. Ciente do que procurava, ele foi até onde estava O Jardim Paroquial de Nuenen (1884), uma rara pintura de Van Gogh que havia sido emprestada do Museu Groninger. Tirou-a da parede, colocou-a em uma mochila e fugiu em sua motocicleta. Um mês depois, as autoridades holandesas prenderam o suspeito do crime. O homem de 58 anos, que não teve o nome revelado, é acusado de roubar também Dois Meninos Rindo com Uma Caneca de Cerveja (1626), de Frans Hals, de outro museu. As telas, avaliadas em 24 milhões de dólares, continuam desaparecidas — mas, desta vez, haverá esforço genuíno para recuperá-las. Há alguns dias, a Interpol, a polícia internacional, lançou a sua maior ofensiva para caçar relíquias artísticas perdidas. Criou um aplicativo, o ID-Art, que abriu ao público a lista de peças nas mãos de criminosos. Com iniciativas como essa, espera-se a identificação mais rápida dos roubos, de modo a reduzir o tráfico de obras de arte, que movimenta 10 bilhões de dólares anuais.

Idealizado em 2016, o projeto do aplicativo foi realizado graças a um refinado software de reconhecimento de imagem, capaz de identificar os bens culturais roubados de várias partes do mundo. São 52 000 obras de arte, em 25 categorias de objetos, desde desenhos e documentos até esculturas e estátuas furtados de coleções públicas e particulares. Contribuem para alimentar a base 134 países, incluindo o Brasil, signatário de um acordo de cooperação com a Interpol. A triagem é rigorosa: apenas entidades autorizadas, como escritórios regionais e parceiros da organização como a Unesco, podem inserir dados. Têm acesso às informações marchands, casas de leilão, museus, jornalistas, universidades, a polícia e, agora, o público em geral.

Já na fase de testes, o ID-Art mostrou resultados. No início do ano, o Comando Carabinieri para a Proteção do Patrimônio Cultural (TCP, na sigla em italiano), órgão da polícia italiana responsável por investigar crimes envolvendo obras de arte, identificou duas estátuas à venda em um site. Na mesma época, autoridades policiais holandesas suspeitaram de duas pinturas destacadas em um catálogo virtual que seriam levadas a leilão em Amsterdã. Graças ao aplicativo, os agentes confirmaram que as peças estavam sendo procuradas, e elas foram resgatadas e repatriadas.

arte quadros roubados
(Fotos: Museu Singer Laren, Oratório de São Lourenço, Museu Isabella Stewart Gardner E Museu da Chácara do Céu/.)

Além de franquear acesso ao banco de dados da Interpol, o ID-­Art permite criar inventários de coleções de arte privadas e relatar locais culturais potencialmente em risco. Com os inventários, o colecionador mantém a listagem de suas obras organizada de acordo com convenções internacionais. Se algo acontecer às telas penduradas na sala, a imagem e as informações básicas sobre elas estarão prontas para serem encaminhadas às autoridades competentes. O usuário também pode documentar monumentos históricos e sítios arqueológicos, incluindo a localização geográfica e descrição detalhada, para mostrar o estado de conservação.

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O ID-Art permite tirar foto de uma obra suspeita e compará-­la por imagem à base de dados da Interpol. Não é possível acrescentar ou subtrair entradas, nem enviar ocorrências pelo celular. O caminho correto é fazer a denúncia por meio das forças policiais competentes: no caso brasileiro, a Polícia Federal, quando são obras do patrimônio histórico, e a Polícia Civil, em se tratando de coleções particulares. O Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan), que tem em sua própria base de dados 1 644 registros de bens furtados, desaparecidos ou roubados, fica responsável por examinar e validar bens recuperados. Se uma peça roubada em um país estrangeiro é avistada por aqui, a Interpol, que trabalha em regime de cooperação com a PF em Brasília e nos escritórios regionais, é acionada para ajudar no contato com as autoridades externas.

Isso explica a presença brasileira na base de dados do aplicativo. O produto de um dos roubos de arte mais espetaculares ocorridos no país está listado ali. Em 24 de fevereiro de 2006, quatro homens entraram no Museu da Chácara do Céu, no Rio de Janeiro, e levaram quatro pinturas com valor estimado de 10 milhões de dólares: Os Dois Balcões, de Salvador Dalí, A Dança, de Pablo Picasso, Marina, de Claude Monet, e Jardim de Luxemburgo, de Henri Matisse. Até hoje, não foram localizadas. Para Fábio Rolim, coordenador do Iphan, o ID-Art pode facilitar a recuperação dessas obras. “É sensacional, porque trabalha com inteligência artificial na busca por imagens”, diz ele. Para o italiano Corrado Catesi, chefe da Unidade de Obras de Arte da Interpol, é uma maneira de o cidadão comum “defender a herança cultural da humanidade”. Espera-se que trabalhos de Dalí, Picasso e Matisse voltem para os lugares de onde nunca deveriam ter saído, em paz, para contemplação.

Publicado em VEJA de 26 de maio de 2021, edição nº 2739

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