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Fagundes: ‘O nazismo eliminava idosos, a história não pode se repetir’

Ator fala a VEJA sobre a vida na quarentena, critica o desprezo pelos mais velhos e fala de Regina Duarte: "Minha torcida é que ela não se queime mais"

Por Raquel Carneiro Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO Atualizado em 17 abr 2020, 15h33 - Publicado em 17 abr 2020, 15h03

No próximo dia 1º de maio, Antonio Fagundes entraria em cartaz no Rio de Janeiro com a peça Baixa Terapia, que recentemente encerrou a temporada em São Paulo. Os planos foram adiados. Como boa parte dos brasileiros, o ator e sua equipe estão em quarentena, os teatros estão fechados e, sem patrocínio, a equipe se esforça para acertar as contas que ainda precisam ser pagas. “Dependemos exclusivamente da bilheteria”, conta Fagundes por telefone a VEJA. O ator de 70 anos se depara agora com uma nova e inédita rotina. “Há 54 anos minha vida é trabalhar e viajar. Estou desfrutando dos prazeres de ficar em casa.” Entre eles, ler muitos livros e ver muitos filmes, além de apreciar a companhia da esposa, Alexandra Martins, e alimentar um novo vício: o Instagram.

O ator falou a VEJA sobre a crise que se abate sobre o mundo por causa do coronavírus e fez um apelo para que as pessoas aprendam com os erros cometidos não só por outros países que minimizaram a ação da doença, mas também com as lições que a história tem a ensinar. Confira:

 

Como tem sido essa descoberta das redes sociais na quarentena? As redes são envolventes: se você entra e fica… você fica, e fica, não sai mais. Dedico uma hora e pouco por dia, tenho usado especialmente para dar dicas de livros aos seguidores. Amo ler e agora estou tendo um tempo para leitura que normalmente eu tinha de cavar entre meus dias movimentados. Lia enquanto esperava para fazer uma cena, no período de refeição, tirava algumas horas de sono da minha vida. Agora, basicamente sento e leio por horas. Estou lendo um livro a cada dois dias. E em média uns três filmes por dia. Logo, o dia vago está ficando curto.

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Há muitos relatos de pessoas idosas saindo de casa. O que diria para elas? Que elas devem olhar para o resto do mundo, que está pagando um preço altíssimo por não ter se isolado antes. Tivemos sorte, entre todas as aspas possíveis, de sermos um dos últimos países a entrar nesse processo. É assustador o número de mortos na Itália, Espanha, Estados Unidos. Espero que não aconteça conosco.

Há também nas redes sociais e em noticiários de todo o mundo um aumento do “ageísmo” (preconceito com idosos). São comuns hoje frases como “essa doença só mata idosos”. O que pensa desse tipo de atitude? Primeiro, acho que essas pessoas devem ser órfãs, pois ninguém pode em sã consciência não se preocupar com a morte dos pais e dos avós, certo? Outra coisa: elas marcaram a data para morrer? Porque, depois dos 40 anos de idade, já estamos todos mais perto da velhice do que da juventude. É horrível quem não valoriza idosos. Todo esse cenário me faz lembrar da frase de Edmund Burke: “Quem não conhece sua história, está condenado a repeti-la”. Esse mesmo tipo de preconceito já foi visto na história, com a eugenia. Na Alemanha, o nazismo eliminava idosos, uma história que não pode se repetir. Eliminava-se também os que pensavam diferente, os deficientes. O mundo está passando por isso de novo. Milhões de pessoas morreram pela irracionalidade. E parece que não aprendemos nada com isso.

Hoje discute-se política no Twitter. Não vejo como seja possível falar sobre um assunto tão complexo em 140 caracteres. Eu gosto de sentar e falar por horas. O diálogo racional é a solução para diminuir a radicalização política.

Antonio Fagundes
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O senhor tem medo de ficar doente? Tem pensado nisso? Não tenho medo de ficar doente. Acho desagradável ficar doente. Qualquer machucado me incomoda. E morrer todos nós vamos. Agora, se eu puder adiar esse dia, fico feliz.

Gosta de falar sobre política? Não em entrevistas ou nas redes sociais. Hoje discute-se política no Twitter. Não vejo como seja possível falar sobre um assunto tão complexo em 140 caracteres. Eu gosto de sentar e falar por horas, ouvir a opinião do outro e dar a minha. Tenho amigos que pensam radicalmente diferente de mim, para todos os espectros, para a direita e para a esquerda. Mesmo assim, a gente tem troca. E, quando conversamos, os dois lados saem modificados. O diálogo racional, baseado em fatos e não em preconceitos ou vontades, é a solução para diminuir essa radicalização política.

Qual sua opinião sobre as políticas adotadas neste momento de calamidade pública, em que a saúde e a economia estão em foco? Vimos agora as falhas da política econômica liberal que se diz independente do Estado. Mas o Estado tem, sim, funções e obrigação em participar de políticas econômicas, como projetos para a criação de emprego e uma melhor distribuição de renda. A principal dessas atribuições é a saúde, que não pode ser privatizada. Se o mundo não der atenção à ciência e à saúde nos próximos anos, a próxima pandemia vai ser muito mais letal.

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O senhor atuou diversas vezes com Regina Duarte. Ainda mantém contato com ela? Não, pois nunca tivemos um contato além do profissional. Fomos bons colegas. Gosto dela. E eu disse que quando ela entrou para a pasta da Cultura eu torcia para ela não se queimar, pois imagino que um artista, por mais inteligente e capaz que seja, vai ter muitas dificuldades de lidar com o circo que é nossa política. Aquilo é para profissionais. Sei que ela está se queimando por todos os lados, com quem apoia e com quem não apoia o Bolsonaro, com a classe artística. Mas minha torcida ainda é que ela não se queime mais. Não tenho nenhum ódio ou sentimento ruim por ela, assim como não sou ignorante de dizer que seria fácil lidar com o monstro que é aquele ministério.

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