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De Mick Jagger a Fiona Apple, acertos e micos nas músicas sobre a pandemia

Enquanto cantor dos Stones fez uma letra sofrível sobre sua vida no confinamento, outros artistas foram menos literais - e mais felizes - ao falar do tema

Por Felipe Branco Cruz Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO Atualizado em 22 abr 2021, 15h17 - Publicado em 22 abr 2021, 15h14

A julgar pelas notícias alvissareiras sobre o avanço das vacinas e o relaxamento das medidas de distanciamento vindas do Reino Unido, podemos supor que, pelo menos por lá, felizmente a pandemia já esboça uma trégua. O momento, portanto, não poderia ser menos oportuno para se lançar uma canção sobre as agruras do confinamento. Quanto mais com uma letra que remói expedientes cotidianos manjadíssimos ao redor do planeta. Pois a nova música de Mick Jagger, Eazy Sleazy, gravada em parceria com Dave Ghrol, fala justamente sobre como a quarentena do vocalista do Rolling Stones foi banal (ainda bem!), com louças para lavar, sem futebol na TV, premières virtuais, reuniões pelo zoom, e até aulas frustradas de samba.

Para além dos riffs e solos pouco criativos, Jagger já começou com esse erro imperdoável de timing: ele vem falar sobre a vida em confinamento com quase um ano de atraso, bem no momento em que a Inglaterra vive a expectativa da tão sonhada reabertura. Mas seria até possível relevar esse detalhe, se o cantor não cometesse um equívoco ainda mais monumental: o de acreditar que versos tão prosaicamente literais sobre a vida em quarentena seriam suficientes para tornar uma letra “antenada” com o tema. Não são. Falta a Easy Sleazy o principal elemento da alquimia musical: aquela centelha mágica que toca as pessoas, ao transformar o cotidiano em poesia. Ora, é isso que torna uma canção capaz de “traduzir” o espírito de seu tempo, captando com urgência as angústias da realidade.

Não é nada do que se encontra, porém, na tentativa de Jagger de encapsular as vibrações da rotina pandêmica. “É uma máscara bonita / mas não se arrisque em uma dança estúpida no TikTok / Tive uma aula de samba, sim, e caí de bunda”, canta ele em Eazy Sleazy. Chocado com tanta banalidade autocomplacente? Pois tome esses versos: “Muita TV, está me lobotomizando, sim / Acho que engordei / Vou tomar outra bebida e então limpar a pia da cozinha”. Nem as reprises de novelas no confinamento trazem um tédio tão grande.

Bon Jovi não chegou atrasado, mas também foi bastante literal em suas letras. O cantor e compositor escreveu um álbum inteiro só com músicas sobre 2020. Fala sobre temas importantes, como racismo e violência policial. E, claro, não se esquece da pandemia. De Bon Jovi já não se esperam pérolas poéticas à la Keats e Yeats, é verdade. Mas ele se supera na faixa Do What You Can. De uma literalidade maçante, a letra  fala de festas de formatura que foram canceladas, hospitais de campanhas sendo construídos, luzes da Broadway apagadas e das medidas de distanciamento social. Rimas e metáforas convincentes que é bom, nadica de nada. “Eles tiveram que cancelar a formatura / Não é justo fazer um baile por Skype / A TV está sempre ligada no canal de notícias”, canta em Do What You Can. Resumindo: Bon Jovi rivaliza com Jagger em sua banalidade oca.

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O ex-beatle Ringo Starr não chega a lavar a alma do ouvinte, mas alcança um resultado mais digno em sua tentativa de cantar as dores do confinamento. A razão é simples: ele teve a prudência de ser mais sutil. Em sua nova música, Zoom In Zoom Out, o título pode ser interpretado como o nome do aplicativo de videoconferências Zoom, ou apenas uma expressão de olhar de longe ou de perto para alguma coisa. Na letra, ele critica as pessoas que acreditam na Terra plana, e proclama: “Olhe de perto para ter uma nova perspectiva/ Olhe de longe para ver que estamos todos conectados”. Tudo isso embalado em um blues simples, com uma melodia cativante e certeira. É um prato musical básico, mas honesto.

Ainda bem que nem só de bombas se faz o repertório da pandemia. A cantora Fiona Apple, sem dúvida, foi a mais bem-sucedida ao lidar com tema. Embora seu álbum Fetch The Bolt Cutters tenha começado a ser feito antes da explosão do coronavírus, ele foi lançado no calor da emergência sanitária global – e a resume com primor. As músicas e letras falam sobre nossas ansiedades e medos (notadamente, da solidão). Não por acaso, o disco foi apontado como um dos melhores de 2020. A faixa-título fala sobre sair de qualquer prisão em que você se permitiu viver – construída para si mesmo ou à sua volta. No refrão, Apple canta: “Pegue os alicates, eu já estou aqui há muito tempo”. E arremata: “Saia da situação em que você está”. A canção, gravada em sua casa, impressiona pela simplicidade e pelos sons ambientes, que vão de buzinas de carros nas ruas aos cachorros e gatos que vivem com ela.

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Em 2020, no entanto, nenhuma canção com letra direta sobre a pandemia fez tanto sucesso quanto F2020, do trio de garotas Avenue Beat, de Illinois, nos Estados Unidos. A despeito da qualidade musical, que não é grande coisa (os vocais, em particular, são bem chatinhos), elas se notabilizaram por ser “sinceronas” ao narrar o sentimento comum de muitas pessoas. Cantam que, em 31 de dezembro de 2019, brindaram e disseram: “2020 vai ser meu ano”. Dois meses depois, claro que tudo soava ridículo: “Meu gato morreu, uma pandemia global tomou conta da minha vida e eu escrevi algumas músicas com que ninguém se importou”, lamentam com humor. Ainda que façam uma ressalva respeitosa: “Ok, os problemas que eu tenho, honestamente, não são tão ruins se comparados com o que muitas outras pessoas estão passando. Mas eu estou só constatando um fato: 2020 foi horrível”. Tomara que em 2021 venham músicas melhores sobre a realidade da pandemia.

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