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Cavalos de bronze de Hitler devem ir a museu após disputa judicial

Depois de seis anos de queda de braço com um colecionador de arte, Alemanha conquista estátuas feitas para adornar a chancelaria do líder nazista

Por Tamara Nassif 28 jul 2021, 16h21

Em 2015, a polícia alemã encontrou duas relíquias em uma investigação de tráfico ilegal de arte. Nada mais eram que dois cavalos gigantescos em bronze, esculpidos por Josef Thorak (1889-1952) para Adolf Hitler em pessoa, cada qual com 10 metros de altura e “na guarda” da Chancelaria do Reich, palacete onde o Führer regia os destinos do III Reich. Comprados há mais de trinta anos pelo colecionador de arte Rainer Wolf, os cavalos de bronze eram alvo de uma disputa judicial com o Ministério da Cultura da Alemanha, que buscava tê-los em posse do Estado. Seis anos depois, o imbróglio finalmente chegou a um fim: os “equinos” de Hitler são agora propriedade do governo e devem ser exibidos em um museu em breve.

De paradeiro desconhecido por décadas, a cavalaria passou por poucas e boas. Queridinha do Führer, chegou a ser realocada em segurança para um cofre em Wriezen quando a II Guerra Mundial estourou. De lá, foi parar em um campo esportivo do quartel do Exército Vermelho russo, na Alemanha comunista, e, então, quando o Muro de Berlim caiu, em 1989, as peças desapareceram. Havia boatos de que o bronze fora inteiro desconstruído para passar incólume pelas revistas fronteiriças – afinal, não dava para guardar as esculturas no bolso. Há seis anos, as peças foram encontradas sob os cuidados de Wolf, cujas propriedades foram alvos da operação de busca e apreensão policial. Ao contrário do que se pensava, essas e outras obras nazistas foram adquiridas legalmente, e por cifras milionárias, através de membros do Exército russo. Como parte do acordo travado com o Ministério, Wolf pode manter sob sua tutela o restante das estátuas nazistas que detém.

“Não sobrou muito da Chancelaria do Reich, peça de grande destaque na propaganda nazista”, disse à imprensa internacional Stephan Klingen, historiador do Instituto Central de História da Arte de Munique. O prédio foi quase que totalmente destruído na II Guerra. “Esses cavalos pertencem a um museu, não a um colecionador particular. É melhor que possamos vê-los.”

Postada em ambos os lados da escadaria do palacete, a cavalaria em bronze era tudo que a arte nazista pregava: triunfante, heroica, realista e, bem, de um neo-classicismo imensamente cafona. Rejeitado pela Academia de Belas-Artes de Viena por falta de talento, Hitler empreendeu uma perseguição ao campo artístico chamada de entartete Kunst – em português, a “arte degenerada”, o que incluía todas as vertentes do modernismo. Além da proibição dos movimentos dadaísta, surrealista e cubista, o regime nazista perseguiu artistas cujas obras não estavam em conformidade com os ideais hitleristas de ode à perfeição, ao arianismo e à arte greco-romana clássica. Vale lembrar que tudo que era de autoria judaica também estava sob o guarda-chuva da “arte degenerada”, o que aumentou substancialmente a quantidade de peças destruídas ou apreendidas.

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Diante desse passado nada abonador, a escolha de exibir os cavalos de Hitler pode ser polêmica – ainda mais num momento em que ferve o debate sobre a derrubada de monumentos que fazem alusão a episódios históricos condenáveis. Até pouco tempo atrás, a Alemanha do pós-guerra cravava um “não” decidido para a indagação sobre se seria admissível expor arte nazista: para muitos, as peças de propaganda do regime eram símbolos de um período que não deveria ser homenageado sob hipótese alguma, e ativavam memórias dolorosas em parentes de vítimas do Holocausto. Mas, conforme os anos alargaram o distanciamento dos horrores do regime, a exposição da arte nazista deixou de ser vista como uma validação memorialista, mas sim uma oportunidade de estudo e investigação.

Eis aí uma das funções da arte: promover reflexões fundamentais para que os erros do passado não sejam esquecidos no presente.

 

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