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Berlim: mulheres dominam primeiros filmes da competição

Por Mariane Morisawa, de Berlim
6 fev 2015, 17h39

O 65º Festival de Berlim começou com papéis femininos em evidência. Depois da abertura com Nadie Quiere la Noche, filme de Isabel Coixet sobre Josephine Peary (Juliette Binoche), a americana que se arriscou em uma expedição pelo Círculo Ártico em 1908, a competição apresentou a jornada de uma escritora pelo Oriente Médio, uma mulher que descobre segredos do marido após quase cinco décadas de casamento.

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Queen of the Desert (Rainha do deserto), do alemão Werner Herzog, conta a história de Gertrude (Nicole Kidman), que ao chegar a Teerã apaixona-se por um dos secretários da embaixada britânica, Henry Cadogan (James Franco), mas o romance não é aprovado pelo pai da moça, um aristocrata. Ela então começa sua série de viagens, indo para a Palestina, a Síria, a Arábia, a Jordânia, onde cruza com um jovem T.E. Lawrence (Robert Pattinson), o Lawrence da Arábia. Um novo amor impossível cruza seu caminho. Alguns anos mais tarde, com a queda do Império Otomano, será a responsável por traçar as fronteiras de um novo país, o Iraque, que ficou sob domínio britânico.

É uma história fantástica, filmada com o talento habitual por Herzog, que expõe a beleza e a imensidão das paisagens desérticas da região. Mas foi recebida com frieza pela plateia de jornalistas. O diretor mostra-se menos à vontade nas cenas românticas entre Kidman e Franco (que também não ajuda muito como ator). Algumas provocaram risos involuntários na plateia. Na verdade, são algumas das únicas cenas sensuais dirigidas por Herzog na sua carreira. “Foi divertido para mim vê-lo descobrir como fazer esse tipo de cena com o qual não estava acostumado”, disse Franco na coletiva de imprensa após a exibição.

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Queen of the Desert também marca a primeira vez do diretor de Fitzcarraldo com uma protagonista feminina. “Deveria ter feito antes! Vou continuar”, avisou. Herzog sabe que o longa fala de política, mas seu foco era a vida interior da personagem. “Política é coisa para uma biblioteca, não para um filme”, disse. Ele admitiu, porém, que tinha vontade de mostrar um outro lado dessa parte do mundo, vista com tanta negatividade por causa dos acontecimentos recentes. “Há dignidade na vida sob o Islã”, afirmou. Mais tarde, ao ser indagado sobre as consequências das ações daquele momento na atualidade, disse: “Podemos discutir se as fronteiras criadas artificialmente na época foram boas ou não. Mas a alternativa está se materializando: o Estado Islâmico ultrapassa as fronteiras, quer criar um califado obedecendo à versão mais radical da Sharia. Não podemos ser paternalistas. De qualquer forma, aqui, não estamos fazendo história. Estamos contando uma história”.

Filmar no Marrocos e na Jordânia foi uma verdadeira aventura, até por causa da maneira como Werner Herzog trabalha. Em uma cena, um urubu tentou bicar Nicole Kidman. James Franco pensou que era um animal treinado. “Depois eu fiquei sabendo que tinham acabado de encontrá-lo na beira da estrada”, contou, rindo. Nicole Kidman levou os filhos e fez questão de incluir uma cena da sua personagem tomando banho numa banheira no meio do deserto, ao ar livre. “Eu faria qualquer coisa por Werner Herzog, fosse seguro ou não”, disse a atriz.

Taxista – O primeiro filme do dia foi Taxi, do iraniano Jafar Panahi. Ele foi banido de fazer cinema pelo governo de seu país por 20 anos. Mas não desiste. Em Isto Não É um Filme (2012) e Cortinas Fechadas (2013), Panahi desafiou a sua sentença ao filmar dentro do próprio apartamento, no primeiro caso, e em uma casa de veraneio, no segundo. Agora, sai às ruas de Teerã como um taxista, em um longa-metragem que, como a maior parte dos seus trabalhos anteriores, só parece espontâneo, mas é inteiramente construído e brinca com as fronteiras entre realidade e ficção o tempo todo.

Os passageiros que entram e saem de seu carro fazem comentários sobre a alta criminalidade, a sharia (lei islâmica), o cinema, a censura, além da própria prisão de Panahi e de outros críticos do governo. O diretor costura referências a seus trabalhos anteriores, trazendo por exemplo duas senhoras com um aquário de peixes vermelhos, o sonho da menininha de O Balão Branco (1995). A grande estrela, porém, é a sobrinha do cineasta, uma garotinha cheia de opinião que está aprendendo na escola a fazer filmes “distribuíveis”, ou seja, “aprovados” pelo governo.

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Jafar Panahi pode ir para a cadeia por causa de Taxi, que não foi autorizado. Por isso, o filme não tem nem créditos, já que as pessoas que participam não podem ser identificadas. Mas, mesmo em um filme clandestino, o cineasta se aproxima de alguns dos melhores momentos da sua brilhante carreira. Taxi foi aplaudidíssimo na sessão de imprensa. Dado o seu currículo em festivais – Caméra d’Or com O Balão Branco em Cannes, Leopardo de Ouro com O Espelho em Locarno, Leão de Ouro em Veneza com O Círculo, prêmio do júri da mostra Um Certo Olhar em Cannes com Ouro Carmim e Urso de Prata de direção em Berlim com Offside – Fora de Jogo -, pode-se imaginar que vai difícil ele sair sem um troféu.

Queen of the Desert estabelece uma conversa tanto com Nadie Quiere la Noche quanto com Taxi. Com o filme de Coixet, por se tratar de uma mulher à frente de seu tempo em uma viagem por uma paisagem inóspita. Com Taxi, porque a personagem sai da Inglaterra para Teerã, onde se encanta pela poesia persa e a língua farsi – é impossível não fazer relação com a situação complicada da região no presente, vista na obra de Jafar Panahi.

45 Years – Juliette Binoche e Rinko Kikuchi estão ótimas em Nadie Quiere la Noche, Nicole Kidman dá conta do recado em Queen of the Desert, mas a competição do 65º Festival de Berlim já tem uma favorita ao Urso de Prata de atriz: Charlotte Rampling, pelo drama 45 Years (“45 anos”), segundo longa de Andrew Haigh, conhecido também por ser um dos roteiristas da série Looking, da HBO.

Ela interpreta Kate Mercer, a uma semana da festa de comemoração de seus 45 anos de casada com Geoff Mercer (Tom Courtenay, fantástico). É quando Geoff recebe uma carta avisando que o corpo de Katya, sua namorada antes de Kate, foi descoberto depois de mais de 50 anos – ela caiu num despenhadeiro num passeio pelos Alpes.

Kate fica cada vez mais chateada com o mergulho no passado que Geoff empreende após a carta e acaba descobrindo segredos mantidos pelo marido. Haigh faz um filme econômico, em que a emoção está sempre sob a pele. Tem uma dupla de atores que vive os personagens em vez de interpretá-los. Ao mesmo tempo, o cineasta constrói 45 Years cheio de tensão e suspense, demonstrando o terror íntimo de quem passa a ter uma dúvida que pode transformar sua existência. Mesmo em uma sessão de imprensa vespertina, que tem menos gente do que as exibições para jornalistas no Berlinale Palast, o longa-metragem foi bem aplaudido.

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