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As novas ferramentas tecnológicas para restaurar obras-primas da pintura

Equipamentos modernos de raios X levam a descobertas surpreendentes; em alguns casos, prova-se até que as obras são imitações

Por André Lopes Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO Atualizado em 10 jan 2020, 10h43 - Publicado em 10 jan 2020, 06h00

Se há alguma dúvida quanto às proezas de que é capaz a civilização, apesar do permanente risco de uma guerra, convém passar alguns minutos diante da mais conhecida tela a óleo do holandês Rembrandt (1606-1669), A Ronda Noturna, de 1642. Exposta no Rijksmuseum, em Amsterdã, sua monumentalidade feita de claros e escuros, registro da guarda cívica comandada pelo capitão Frans Cocq, colosso artístico de 3 metros por 4 metros, vive uma jornada especial, desnudada ao público em plena restauração.

O minucioso mergulho no pentimento de história da magnum opus de Rembrandt é a janela de um extraordinário movimento que une tecnologia e arte. “Hoje sabemos quantas vezes um artista mudou de ideia enquanto criava uma obra”, diz o historiador da arte Martin Kemp, professor da Universidade de Oxford. O recurso mais preciso é o MA-XRF (na sigla em inglês, macroespectrometria de fluorescência de raios X), um conjunto de sensores que emitem diferentes frequências de luz para possibilitar fotografias que captam imagens escondidas debaixo das camadas mais superficiais da tinta de pinturas (veja o quadro).

O MA-XRF permitirá levar a cabo uma meticulosa restauração que começou em julho de 2019 e demorará três anos para ser concluída. Ao término da jornada, o quadro deve, pela primeira vez, ficar igual ao original, do século XVII. Isso porque, antes desse trabalho, restauradores dependiam tão somente de suas próprias impressões para realizar todo tipo de recuperação. Com a aplicação da nova tecnologia, é possível descobrir como a obra foi tracejada por Rembrandt, destacando traços iniciais sob as camadas de remendos feitos ao longo dos séculos. A tarefa começou quando se descobriu que a figura de um cachorro, no canto inferior direito da pintura, apresentava desgaste. Especulou-se que a deterioração poderia se estender ao restante da tela. Ao optar pela via tecnológica para o conserto, o museu holandês fez do processo um show à Big Brother.

IDENTIDADE – A ‘Natureza-Morta’, do Masp: a pintura não é de Van Gogh (João Musa/MASP/.)

Os profissionais trabalham em uma câmara de vidro, observados pelos visitantes. Para quem vê de fora, trata-se de uma cena típica, com restauradores em andaimes, pincelando calmamente o quadro. De perto, sabe-se que cada nova camada de tinta foi calculada após a análise de mais de 10 000 imagens, de resolução doze vezes superior à do display de um iPhone de última geração.

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Os inexoráveis avanços da ciência, liderados pela espectrometria, têm redefinido a forma como se estuda arte. Hoje em dia, como exemplo, utiliza-se a inteligência artificial (IA) para identificar até se uma pintura é mesmo do autor especificado ou se é fruto de imitação. Em 2019, a Universidade Cornell (EUA) criou um software especializado em analisar trabalhos de Pablo Picasso (1881-1973). O algoritmo distingue minúcias como o peso aplicado pela mão do artista. Uma das surpresas: ao escrutinar O Velho Guitarrista Cego (1903), a IA levou à descoberta de que a obra se sobrepôs a outra, de um desenho mais antigo de Picasso.

Todavia, às vezes a tecnologia ilumina revelações desagradáveis. O mesmo MA-XRF que ajuda na recuperação de A Ronda Noturna nocauteou a tela Natureza-­Morta com Prato, Vaso e Flores (1885), atribuída a Van Gogh (1853-1890). Ela era destaque incontornável do Masp, em São Paulo. Isso até julho do ano passado, quando foi submetida ao exame tecnológico. O desfecho, anunciado por Marije Vellekoop, diretora do Museu Van Gogh, em Amsterdã: “Não é uma obra autêntica”.

Publicado em VEJA de 15 de janeiro de 2020, edição nº 2669

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