‘Águas Rasas’ já bastaria por Blake Lively. Mas é maior que ela
Uma praia, uma garota, um tubarão: o diretor Jaume Collet-Serra combina esses elementos com sensacionalismo, mas sem perder a elegância
A praia é deslumbrante: uma baía pequena e isolada, com ondas de um azul-turquesa cristalino sobre corais e areia branca. Só os locais sabem como chegar a ela, e planejam manter o segredo — o sujeito que levou Nancy (Blake Lively) até ali nem sequer revela o nome da praia, e o mesmo fazem os dois surfistas que ela encontra além da arrebentação. Não há mais ninguém à vista; já é de tarde, e logo vai escurecer. Nancy bem que deveria aproveitar uma carona com os dois rapazes e ir embora também, mas seu coração pede mais meia hora, mais uma onda: foi ali que sua mãe descobriu estar grávida dela, e faz pouco tempo que Nancy a perdeu. Pegar onda ali é como estar junto de sua mãe de novo. E pode ser que esse reencontro deixe de ser mera figura de linguagem: com meia dúzia de braçadas na direção errada, Nancy invade sem querer o território de um tubarão-branco — e a fera, furiosa, decide que a turista será sua próxima refeição. Apenas uns 200 metros separam Nancy da areia. Mas eles são intransponíveis.
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Só pela pele amorenada e pelo cabelo alourado de sol, e por aquela silhueta magnífica de quase 1,80 metro, Blake Lively já poderia ser o que basta a Águas Rasas (The Shallows, Estados Unidos, 2016), que estreia agora no país. Mas Blake, revelada uma década atrás como beldade na série adolescente Gossip Girl, se mostra aqui uma atriz de enérgico compromisso físico e psicológico com sua personagem: cada vez mais esfolada, lacerada, queimada, enregelada e exausta, Nancy reage à provocação contra a sua vida com uma obstinação que em nada fica a dever à do tubarão. Ou, melhor dizendo, a fêmea de tubarão: embora o gênero do bicho não seja explicitado no filme, na cabeça do diretor catalão Jaume Collet-Serra isto aqui é uma catfight — uma briga entre duas mulheres muito irritadas uma com a outra.
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Collet-Serra é mestre em fazer esse tipo de sensacionalismo com elegância, e com um dinamismo e uma originalidade que se bastam a si mesmos. São dele, por exemplo, os ótimos filmes-exploração Desconhecido, Sem Escalas e Noite sem Fim, todos estrelados por Liam Neeson. Blake traz algo novo ao estilo do diretor: uma serenidade ante o perigo e uma racionalidade nos meios de enfrentá-lo que obrigam Collet-Serra a refinar suas artimanhas. Ela é o toque feminino que faltava aos seus filmes.
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