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Arquitetura de gênero e urbanismo feminista transformam os centros urbanos

O objetivo é torná-los cada vez mais inclusivos e seguros

Por Alessandro Giannini Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO 23 out 2022, 08h00

Produto da Revolução Industrial (1760-1840), as cidades modernas se desenvolveram baseadas no conceito de família patriarcal, em que cabia ao homem as tarefas produtivas e à mulher as reprodutivas. Em outras palavras, os pais saíam para trabalhar enquanto as mães ficavam em casa cuidando dos filhos. Essa ideia conservadora perdeu o sentido faz muito tempo, mas seus efeitos ficaram impressos na arquitetura de muitas metrópoles, fortalecendo o preconceito de gênero na organização, uso e fruição delas. A partir dos anos 1980, cientistas como a geógrafa britânica Doreen Massey (1944-2016) começaram a questionar tudo isso, dizendo que “lugares não têm identidades únicas, mas múltiplas”. Era a primeira semente da arquitetura de gênero e do urbanismo feminista, duas tendências que agora ganham corpo com iniciativas ruidosas e fundamentais em várias partes do mundo, incluindo o Brasil.

Em A Cidade Feminista: a Luta pelo Espaço em um Mundo Desenhado por Homens (Oficina Raquel), a geógrafa canadense Leslie Kern afirma que a cidade foi criada para favorecer os papéis tradicionais do gênero masculino e estabelecer as experiências dos homens como regra, criando bloqueios para mulheres e ignorando seu contato diário com a vida urbana. Pesquisas nesse sentido mostram que o homem, em geral, sai de casa para o batente e volta, num movimento pendular. Já as mulheres, também de forma generalista, se movimentam mais aleatoriamente, porque têm diferentes tarefas a cumprir ao longo do dia. “O urbanismo feminista pretende entender que movimentos são esses, que corpos são esses e que raças são essas, para que se possa pensar mais a partir de determinados públicos e organizações sociais”, diz a urbanista Sabrina Fontenele, professora da Escola da Cidade, de São Paulo.

DIVERSIDADE - Washington: a faixa colorida homenageou a comunidade LGBTQIA+ -
DIVERSIDADE - Washington: a faixa colorida homenageou a comunidade LGBTQIA+ – (Ted Eytan/.)

Uma das principais questões envolvendo esse movimento está na segurança. Quantas mulheres se sentem seguras se deslocando por ruas e avenidas à noite, sem medo de sofrer assédio ou outro tipo de violência? Com essa e outras indagações em mente, pesquisadoras e planejadoras urbanas do Departamento de Gênero da Prefeitura de Viena, na Áustria, começaram a pensar em soluções para esses problemas. O resultado veio na forma do conjunto habitacional Frauen Werk Stadt, com mais de 350 unidades. Com base em uma série de levantamentos, a arquiteta Franziska Ullmann planejou um bairro em que os espaços comuns são abertos e iluminados e as praças e os parques favorecem o encontro e a segurança das mulheres e crianças.

Iniciativas semelhantes se espalharam pelo mundo. Em Barcelona, na Espanha, a cooperativa Collectiu Punt 6 virou referência. Composto de arquitetas, sociólogas e urbanistas, o grupo vem trabalhando para repensar os espaços domésticos, comunitários e públicos a partir de uma perspectiva feminista, com mais de 400 projetos realizados em âmbito local, estadual e internacional. “Elas têm uma inserção muito grande no setor público, influenciando nas políticas públicas e pondo em prática as teorias que defendem”, diz a arquiteta e urbanista Diana Helene Ramos, da Universidade Federal de Alagoas. No México, o programa Caminhos Seguros, criado em 2019, repensou os espaços públicos, melhorando-os e tornando-os mais seguros, especialmente para as mulheres. No Brasil, a arquiteta Ester Carro ajudou a transformar um lixão em Paraisópolis em um parque, o Fazendinhando.

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PROTESTO - Cidade do México: o programa Caminho Seguro renovou a capital -
PROTESTO - Cidade do México: o programa Caminho Seguro renovou a capital – (Carlos Tischler/Eyepix Group/Getty Images)

Segundo a Organização das Nações Unidas (ONU), mais da metade da população mundial vive em cidades. Até 2050, o índice deve chegar a 68%. Já em 2030, espera-se que o mundo tenha 43 megacidades com mais de 10 milhões de pessoas cada uma — São Paulo, a maior metrópole brasileira, conta com 12,3 milhões de habitantes. Pensá-las para incluir mulheres, minorias e populações vulneráveis, como fez Washington, em 2017, quando pintou faixas de pedestres com as cores do arco-íris para acolher a comunidade LGBTQIA+, não é apenas um gesto de boa vontade. É um movimento inescapável e necessário.

Publicado em VEJA de 26 de outubro de 2022, edição nº 2812

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