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Ex-Globo sobre Bolsonaro: ‘Nossas liberdades estão ameaçadas’

Rodrigo Alvarez lança ‘O Candidato’ e fala a VEJA a respeito do atual cenário político no país

Por Valmir Moratelli Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO 13 set 2022, 14h30

Depois de livros com temática religiosa – de Jesus Cristo a Maria Madalena – Rodrigo Alvarez, 48 anos, mira na ficção com O Candidato. O jornalista, que atuou como correspondente da TV Globo na Europa, com base em Berlim e Paris, revela à coluna que a obra surgiu de uma necessidade de se expressar “num momento em que nossas liberdades estão gravemente ameaçadas”. A seguir, a conversa na qual Alvarez não poupa críticas ao governo Jair Bolsonaro (PL).

Você vem de livros sobre personagens cristãos, santos católicos. Agora o protagonista é um político. Dá para se fazer um paralelo entre eles? Minha trajetória na literatura começou com livros-reportagem, depois entrei num universo de pesquisa sobre religião, que resultou no livro Aparecida, que era também investigação jornalística, ainda que com forte componente histórica, sobre o maior fenômeno da fé brasileira. Almeidinha, o personagem central de O Candidato (Citadel, 2022) nasceu como uma necessidade de me expressar usando a literatura, num momento em que nossas liberdades estão gravemente ameaçadas. Penso que em tempos de opressão ideológica e ameaças à democracia, as artes precisam mostrar outras cores. O Candidato é uma sátira de nós mesmos, do Brasil que entrou numa “encruzilhada de bosta”, como diz Almeidinha, e que precisa encontrar uma saída. Ao olhar para o passado temos muito mais clareza para refletir sobre o presente.

Em O candidato, o personagem volta ao passado, antevendo um golpe militar. “Golpe militar” é um termo que frequenta as notícias de política. Foi proposital tratar desse tema?Claro. Almeidinha foi levado a acreditar que 1958 tinha sido o melhor ano da nossa história, mas não se conformava sabendo que aquela maravilha toda – bossa nova, otimismo econômico, Seleção campeã no futebol, construção de Brasília – tinha terminado com golpe militar que, de um dia para o outro, nos tomou as liberdades e nos apagou os sorrisos. O Candidato é uma sátira com elementos históricos reais. Toca nas nossas veias que, recentemente, descobrimos ainda estarem abertas.

Por que escrever ficção com temática política diante do que o país atravessa? Nasci em 1974, quando a ditadura ainda prendia, torturava e arrebentava quem discordasse de seus modos violentos. Na minha casa, sempre ouvi as histórias terríveis de como os governos militares perseguiram brasileiros, e meu avô foi um deles. O coronel-aviador Carlos Alberto Alvarez foi expulso da Força Aérea Brasileira e proibido de pilotar aviões (até mesmo na iniciativa privada) porque era contra a ilegalidade de um golpe militar – e não porque fosse comunista, pois não era. Aliás, e se fosse? Por causa do autoritarismo dos militares, meu avô, que pilotava aviões de guerra, foi bater de porta em porta para vender cestinhas para bebês e sustentar a família. Governo nenhum tem direito de escorraçar seu povo. Ao ver o que Jair Bolsonaro estava fazendo com a nossa democracia, e ainda por cima tecendo loas aos generais assassinos que nos governaram, promovendo torturadores mortos para que seus descendentes recebessem mais dinheiro público em suas pensões, entendi que era preciso usar a literatura para protestar. E escolhi fazê-lo com o humor e a ficção.

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Você teme um golpe no país? Cheguei a temer, mas hoje não acho que estejamos neste rumo. Mas, com ou sem um golpe de facto, o golpe moral já foi dado. Jair Bolsonaro tirou da pauta os temas que realmente importam. Primeiro, a educação. Tratou a Educação como um ministério cabideiro, onde se dependuram pastores desonestos. Escolheu os piores ministros da nossa história recente. Um deles até falsificou o currículo. O outro está envolvido num escândalo de corrupção. Em seguida, a Saúde. Bolsonaro riu dos brasileiros, riu dos pacientes que morriam de Covid, e gargalhou de todos nós ao fazer do Ministério da Saúde um espaço para promoção de inverdades que contradizem a ciência e o bom senso. O golpe foi dado! Perdemos quatro anos na Educação, na Saúde, na Cultura, no Cinema, nas Artes de maneira geral. E quantos anos mais isso vai nos custar?

Você já declarou que no país atual há uma “falta de compromisso com a palavra dita”. Como jornalista, o que quer dizer? Me refiro exclusivamente ao presidente da República, seus filhos e seguidores. São criadores de mentiras e mantêm a militância ativa dizendo inverdades. Dizer algo e voltar atrás no dia seguinte também não é o menor problema para o governo Bolsonaro. Um dia rejeita a vacina, no outro diz que foi responsável por um suposto sucesso na vacinação. Esse é só um exemplo óbvio, há inúmeros. Mais recentemente, a religião passou a ser usada como ferramenta de manipulação. A primeira-dama da República posa de pastora. Bolsonaro tenta ser o salvador. Que cristianismo há nisso? Da mensagem de amor amplo e indiscriminado propagada por Jesus Cristo, o presidente e sua mulher não trazem absolutamente nada: apenas usam de ferramentas de manipulação que há muito vêm sendo testadas em sociedades com fins lucrativos que se autodenominam igrejas. A pós-verdade que o mago (Donald) Trump levou ao limite nos Estados Unidos e que os Bolsonaro importaram é o fim do compromisso com a honestidade.

Por que você saiu da Globo? Saí porque queria um período de reflexão, longe do comprometimento quase sacerdotal exigido pelo jornalismo diário. Saí para poder escrever mais e tenho escrito todos os dias. Desde minha saída, no fim de 2019, já lancei cinco livros e tenho outro pronto. Agora, isso não quer dizer que eu deixei o jornalismo. Meu período sabático foi esticado pela pandemia e estou me preparando para voltar à TV.

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Seguirá com as biografias religiosas ou enveredará de vez para a ficção? O futuro, não sei. O que posso tenho certeza é que meu próximo livro será uma ficção, tratando sobre questões importantíssimas que a tecnologia e as redes sociais vêm nos colocando. Em O Outro Eu (Ediouro, 2023), o protagonista vive num futuro próximo em que o celular começa a fazer parte do nosso corpo, quando o metaverso já uma realidade. O que ele precisa é aprender a viver em sociedade. Aliás, não é essa falta de conexão com o outro, a falta de empatia, o mal que está deixando o Brasil nesse caos de agora?

Rodrigo Alvarez -
Rodrigo Alvarez – (./Divulgação)
Rodrigo Alvarez -
Rodrigo Alvarez – (./Divulgação)
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