A maior semelhança e a diferença entre Janja e Michelle Bolsonaro
Uma das autoras do livro ‘Janja, a Militante que Se Tornou Primeira-Dama’ fala a VEJA
Após perfilarem as 34 primeiras-damas da República em Todas as Mulheres dos Presidentes, publicado em 2019, Ciça Guedes e Murilo Fiuza mergulharam na vida de Janja Silva – apenas a segunda primeira-dama a ter uma carreira independente (depois de Ruth Cardoso, que foi casada com FHC). O resultado dessa investida é o novo livro da dupla, Janja, a Militante que Se Tornou Primeira-Dama (ed. Máquina de Livros). Em conversa com a coluna, Ciça entrega as diferenças entre a atual mulher de Lula (PT) e Michelle Bolsonaro, a mais recente ex-primeira-dama.
O livro defende que Janja foi fundamental na campanha eleitoral, tendo papel protagonista na narrativa “amor contra ódio”. Como se deu isso? Desde que Lula foi preso, Janja usava nas redes sociais a hashtag #oamorvencerá. Após a libertação, ela passou a usar #oamorvenceu, frase que, depois, foi bordada na lembrancinha que o casal entregou no casamento. Janja e Lula perceberam que o amor deles contagiou um país que estava dominado pelo comportamento eivado de ódio da extrema direita.
Janja ocupa neste terceiro mandato o lugar que, em eleições passadas, foi de Zé Dirceu, Duda Mendonça, Palocci, José Genoino, entre outros? Sim, podemos fazer um paralelo com o Lula do primeiro mandato. Naquele momento, o petista contava com o publicitário Duda Mendonça, que criou “Lulinha paz e amor”, e José Dirceu, como principal ministro e articulador político, seus conselheiros. Janja, Gleisi Hoffmann e Fernando Haddad estiveram ao lado de Lula nos 580 dias de prisão em Curitiba, mesmo quando a repercussão da Lava-Jato tornou Lula radioativo, ninguém queria se aproximar dele.
O que mais te chamou a atenção a respeito da personalidade de Janja? Amigos e colegas de trabalho a descrevem como corajosa. Janja diz que herdou essa característica da mãe, que perdeu os pais ainda menina e trabalhava como doméstica para a família a que foi entregue. Também nos chamou a atenção o fato de que Janja se destacou em todas as posições que ocupou na vida profissional.
O livro narra episódios saborosos do cotidiano de Janja com Lula. Pode contar um desses momentos de intimidade? Vale lembrar o primeiro Dia dos Namorados que celebraram, já com Lula na prisão havia dois meses. A amiga e assessora Neudicléia de Oliveira, a Neudi, juntamente com a amiga Luciana Worms e os advogados de Lula, organizaram um “encontro”. Janja foi ao apartamento de Neudi, de onde se avistava o basculante da cela em que Lula estava, e, no horário combinado, o petista piscou três vezes a luz. Em seguida, flores e um presente, providenciados pelos advogados, chegaram a Janja. Foi uma choradeira entre as três amigas, entre goles de vinho e pedaços de pizza.
Pelo trabalho que vocês têm com pesquisas sobre outras primeiras-damas, o que Janja tem de diferente das demais? Em primeiro lugar, o gosto legítimo pela política. Janja é militante do PT há quase quatro décadas, tem vivência da vida partidária, por ter trabalhado na liderança da sigla na Assembleia Legislativa do Paraná, e experiência em empresas públicas, como Itaipu e Eletrobras. Vale lembrar ainda o fato inédito na história: ter uma primeira-dama numa reunião de governadores após grave crise institucional e política (o encontro de Lula com os chefes de Executivos estaduais após os atos terroristas de 8 de janeiro).
Janja e Michelle Bolsonaro têm divergido publicamente sobre vários temas. O que elas têm em comum? Apenas o fato de terem se casado com os dois líderes de lados opostos da política brasileira. Michelle foi escondida por Bolsonaro e seus assessores na eleição de 2018, em razão dos problemas de sua família. Na posse dele, porém, apareceu esfuziante, quebrou protocolos, discursou em Libras, deu selinho no marido. Depois submergiu e só foi reaparecer na campanha de 2022, na caça ao voto das mulheres. Janja, desde o início da campanha, deu o tom nas redes sociais, na articulação com artistas e personalidades do meio cultural, levantou bandeiras feministas.
De onde vem essa adoração de Janja pela lua? É um lado místico da primeira-dama? Janja é atenta a tudo o que tem a ver com o feminino e, nesse sentido, sempre foi ligada à lua. Ela povoou suas redes sociais com fotos da lua cheia. Curiosamente, o tempo de cárcere do namorado foi contado por Janja em luas cheias. Durante os 580 dias da prisão de Lula, ou seja, um ano e sete meses, foram 18. E o casamento foi marcado para um dia frio de maio em São Paulo, mas com uma lindíssima lua cheia no céu. Esse foi inclusive o tema da festa do casório, Luar do Sertão.
É possível já prever uma eleição futura em que Janja venha candidata? Talvez ela tenha de vencer resistências, antes de essa possibilidade se concretizar, dentro do próprio PT.