Poucos assuntos geram tanta agonia em Brasília como as intermináveis negociações sobre reformas ministeriais. O saldo invariavelmente é ruim. Os que ficam se sentem inseguros por terem tido suas fragilidades políticas expostas ao público por semanas. Os que chegam demoraram tanto a entrar que assumem num misto de raiva e sensação de que não foram tratados com o devido respeito. As negociações atuais para a incorporação do Centrão no governo Lula 3 repetem os defeitos das reformas anteriores com uma pergunta nova: afinal qual a agenda de Lula para o Congresso?
Montado às pressas nas vésperas do Natal enquanto parte da equipe negociava a PEC da Transição, que assegurou o orçamento de 2023, o time de Lula 3 é heterogêneo. Passados sete meses apenas três ministros tem uma agenda clara de onde quer chegar, Fernando Haddad na Fazenda, a dupla Mauro Vieira e Celso Amorim nas Relações exteriores e agora Alexandre Padilha na Articulação Política. Não chega a ser surpresa que quase todos os demais se sentem apreensivos sobre a possibilidade de perderem seus cargos.
Grosso modo, o governo Lula tem entre 180 e 200 dos 513 votos na Câmara dos Deputados. É o suficiente para impedir qualquer iniciativa de impeachment. E só. Todo projeto, mesmo a burocrática medida provisória de criação de ministérios, precisou ser negociado um a um, num processo de desgaste que não se resolveu com o empenho de mais de R$ 7 bilhões de emendas parlamentares.
Nas contas dos articuladores do Planalto, a chegada dos deputados Celso Sabino, do União Brasil, Silvio Costa Filho, do Republicanos, e André Fufuca, do Progressistas, entregaria mais 80 votos ao governo, garantindo uma maioria estável. Mais importante do que quais os ministérios que o Centrão vai ocupar, no entanto, é entender qual a agenda do governo Lula para o Congresso.
Há agendas importantes em estudo no governo _ a regulação dos créditos de carbono, a revisão da reforma do ensino médio, a reformulação da política de armas…-, mas o principal se resume em aumentar a arrecadação para, ao mesmo tempo, manter o atual nível de gastos sociais e cumprir promessa do arcabouço fiscal é de zerar o déficit primário em 2024.
Sem um aumento na carga tributária não há como o Orçamento de 2024, que o Ministério do Planejamento, envia ao Congresso em 30 de agosto ficar de pé.
Em agosto, Haddad inicia a espinhosa batalha para convencer deputados e senadores a aprovarem um aumento de impostos. Na primeira fase serão propostas taxas mais altas para os Fundos Exclusivos, Juros sobre Capital Próprio e fundos off-shore (a MP sobre o assunto será substituída). São medidas que atingem o bolso de investidores ricos, entre eles os próprios senadores e deputados.
Provavelmente em outubro será enviada a proposta de reforma de renda, que projeta aumentar a isenção de imposto de renda para todos que ganham até R$ 5 mil em troca da taxação da distribuição de dividendos das empresas, outro tema que o Congresso refugou em aprovar sob presidentes mais afinados ideologicamente com o Centrão, Michel Temer e Jair Bolsonaro.
Atrair o Centrão para o governo Lula, portanto, não é uma vaidade do governo, mas parte de um plano para combinar duas variáveis que raramente se cruzam, gastos sociais e responsabilidade fiscal. Se Lula conseguir que Arthur Lira e parte do Centrão aceite essa agenda, três, seis ou dez ministérios vão parecer uma pechincha.