‘Recessão’, a palavra, surgiu para acalmar. Não deu certo
Quando uma palavra entra em cena com fôlego para ser eleita não apenas a mais marcante da semana, mas quem sabe a do ano, todas as outras se calam. O Brasil está em recessão, anunciou hoje o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Isso quer dizer que foi registrado um semestre inteiro de resultados […]

Quando uma palavra entra em cena com fôlego para ser eleita não apenas a mais marcante da semana, mas quem sabe a do ano, todas as outras se calam. O Brasil está em recessão, anunciou hoje o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).
Isso quer dizer que foi registrado um semestre inteiro de resultados negativos na variação do Produto Interno Bruto, o que caracteriza uma definição de manual para recessão – termo que o português foi buscar no latim recessionis, “ação de se afastar, recuo, retrocesso”.
Só no século XX a palavra ganhou emprego no vocabulário econômico. Significativamente, isso se deu pela primeira vez em inglês, na esteira da quebra da Bolsa de Valores de Nova York, em 1929.
O lexicógrafo britânico John Ayto, da equipe do dicionário Oxford, o mais importante da língua inglesa, afirma que a acepção econômica de “recessão” contém “mais que um traço de eufemismo”. Segundo essa tese, o termo, com seu jeitão frio e técnico, surgiu para conter o alarmismo que palavras mais cruas, como “crise”, pudessem provocar.
Economistas gostam de eufemismos – “crescimento negativo” é o maior clássico do gênero –, mas a recessão iniciada em 1929 acabou se mostrando tão grande e desvastadora que desmoralizou qualquer possibilidade de atenuamento, transbordando de seu próprio sentido para desaguar num termo ainda mais assustador: “depressão”.
Se a fronteira entre esses dois estados econômicos doentios não é muito clara, pois economia nunca foi ciência exata, vale lembrar uma boa tirada do ator e presidente americano Ronald Reagan: “Recessão é quando seu vizinho perde o emprego. Depressão é quando você perde o seu”.
De uma forma ou de outra, o ex-eufemismo não demorou a perder inteiramente o poder de acalmar alguém, como o noticiário brasileiro demonstra mais uma vez.