Do subsolo de Roma para o mundo, uma ascensão grotesca
Gravura grotesca do artista flamengo Cornelis Floris (1556) Numa das acepções para as quais seu sentido acabou por transbordar – de coisa bizarra, ridícula, caricata, repulsiva, monstruosa – a palavra grotesco, substantivo e adjetivo, tem, como se sabe, vasta aplicação na vida contemporânea. Sua origem, porém, é antiga e se situa no campo restrito do […]

Numa das acepções para as quais seu sentido acabou por transbordar – de coisa bizarra, ridícula, caricata, repulsiva, monstruosa – a palavra grotesco, substantivo e adjetivo, tem, como se sabe, vasta aplicação na vida contemporânea. Sua origem, porém, é antiga e se situa no campo restrito do vocabulário das artes: o termo italiano grottesco ou grottesca data do Renascimento, ali por meados do século 15, e a princípio nomeava os murais e afrescos descobertos nas escavações da Roma Antiga ocorridas naquela época. A palavra era derivada do italiano grotta, “galeria escura, subterrâneo, caverna”, que também passaria à nossa língua como grota, de sentido correlato.
As velhas pinturas encontradas no subsolo de Roma acabaram por impulsionar o surgimento de um novo estilo que se espalharia pelo restante da Europa, levando com ele a palavra, que penetrou no francês (na época com a grafia crotesque) em 1526 e, por meio deste, no inglês (grotesque) por volta de 1560. A data para o primeiro registro em português é 1548, segundo o Houaiss. Já então o espírito do grotesco era menos renascentista e mais maneirista, no entendimento da maioria dos modernos historiadores da arte, com sua representação de visões fantásticas em que se misturavam formas humanas e animais em cenários de flora extravagante.
Os sentidos expandidos de grotesco, que levaram o termo para passear fora do terreno da arte, surgiram nos séculos imediatamente posteriores. Para Douglas Harper, o termo só ganharia valor pejorativo em inglês ali por meados do século 18, sendo até então empregado apenas como sinônimo de “fantasioso, imaginativo”. Em francês, porém, é certo que a palavra já fosse usada um século antes disso com o sentido pouco lisonjeiro de “que faz rir pela extravagância”, ou seja, ridículo, segundo o Trésor de la Langue Française.