Teori Zavascki e as teorias conspiratórias
O desconforto da incerteza motiva a busca por explicações pouco plausíveis

Em 2016, um dos filhos de Teori Zavascki postou, em seu Facebook, que “há movimentos dos mais variados tipos para frear a Lava Jato”, e “se algo acontecer com alguém da minha família, vocês já sabem onde procurar!”. (Quem estaria por trás desses movimentos? Nenhuma indicação.)
O delegado Márcio Anselmo, da Polícia Federal, trata o caso como um “acidente” – entre aspas mesmo!
Um amigo me pergunta em um grupo de whatsapp: “Csinho, mataram o juiz??” (Sim, Csinho é um dos meus apelidos. Ainda não respondi a mensagem.)
Vamos com calma.
Há duas maneiras de derrubar um avião intencionalmente. Os assassinos podem ser suicidas: é o método terrorista do 11 de Setembro. A lógica é de martírio, de morrer por uma causa. Não vejo como aplicar isso ao caso do avião de Teori.
E os assassinos podem sabotar a aeronave. Quem poderia estar interessado na morte do relator da Lava Jato? O Twitter explica: o presidente Michel Temer, o Movimento Brasil Livre, os parlamentares que seriam implicados nas delações da Odebrecht, o senador peemedbista Romero Jucá, o PT, Lula, o PMDB, o PSDB… Por que não todos juntos de uma vez?
É mais provável que a queda do avião tenha sido acidental, causada por más condições climáticas, erro humano, ou uma combinação de vários fatores. É também possível – mas muito menos provável – que alguém interessado em tirar Teori da relatoria da Operação Lava Jato no STF tenha articulado a queda de seu avião. Como teriam feito isso? Impossível saber.
Mas dizer que “provavelmente foi um acidente” é sonolento. Qual o charme disso? Acreditar em uma conspiração é muito mais legal. E é racional. Afinal, não estamos preparados para lidar com caos e confusão. Precisamos de explicações. E aí podemos ser divididos em três tipos de pessoas: os que acreditam que nada explica nada (adeptos do “caos”), os que acreditam que algo explica tudo (adeptos de “conspirações”) e os que acreditam que algo explica certas coisas (adeptos da “ciência” e bom jornalismo). (O livro “The Storytelling Animal” traz uma ótima discussão sobre o tema.)
Os cientistas políticos Eric Oliver e Thomas Wood definem teoria conspiratória como uma explicação que implica forças ocultas e malévolas que têm certo objetivo específico. Nem todas as teorias conspiratórias são mentirosas, mas todas contradizem uma explicação aceita como verdade para o mesmo fenômeno explicado pelos adeptos da teoria.
De acordo com esses estudiosos, elas são atraentes porque permitem que lidemos com eventos incômodos, desconfortáveis. Tendem a ganhar espaço quando há um vácuo de liderança política. Cass Sunstein, um dos intelectuais mais interessantes das últimas décadas, adiciona duas explicações. A primeira é que alguns de nós somos “conspiracionistas”, pré-dispostos a crer em teorias conspiratórias sobre vários assuntos simultaneamente. A segunda é que teorias desse tipo se beneficiam muito de um “efeito de rede”. A teoria é publicada nas redes sociais e adotada por muitos outros.
Assim, ao permitir a circulação frenética de informações, a internet causa ansiedade. E quanto mais ansiosas estão, mais as pessoas tendem a crer em teorias conspiratórias, afirmam Scott Radnitz e Patrick Underwood, dois cientistas políticos que fizeram um interessante estudo sobre o assunto (Underwood?! É o sobrenome do protagonista de House of Cards... Coincidência?? ). O artigo fornece uma pista interessante sobre por que as mortes de Celso Daniel (PT) e Eduardo Campos (PSB) foram lembradas por alguns (aqui estão: 1, 2 , 3, 4, 5, 6, 7, 8) quando Teori morreu. Múltiplas vítimas dão um padrão aos acontecimentos, diminuindo o desconforto de não saber o que aconteceu. Viver com incerteza é muito ruim. É tão ruim que podemos acreditar em um padrão para essas mortes mesmo sabendo, intuitivamente, que o esforço para esconder os responsáveis pelos assassinatos seria absurdo. E muito improvável. Afinal, quem poderia estar igualmente interessado nas mortes de Eduardo Campos e um ministro do Supremo Tribunal Federal? Um petista? Ok, e Celso Daniel? As explicações ficam cada vez mais longas e implausíveis.
No caso da morte do ministro do STF, como observei acima, é difícil implicar apenas um potencial assassino. Mais fácil falar em forças ocultas, de modo vago, como fazem essas pessoas: 1, 2, 3, 4. E quem não acredita nesse tipo de teoria conspiratória – uma teoria que nem oferece uma explicação, na verdade! -, é tido como inocente. Paciência.