O governo entrou na terceira semana de discussões sobre o pacote de corte de gastos. Sem andar um milímetro.
A dificuldade não surpreende.
Quando o governo anunciou o arcabouço fiscal, em março de 2023, ele foi aplaudido por ser muito melhor do que o que se temia, mas não foram poucas as vozes alertando que era insuficiente, buscava o deficit zero sem prever corte de despesas em nenhuma circunstância. E garantia que haveria aumento.
O economista Armínio Fraga foi ao Senado e deu a real: “A aritmética não fecha, gente. Infelizmente, não é suficiente zerar o déficit primário, porque zerando o primário significa que vamos estar tomando dinheiro emprestado para pagar o juro direto, e o juro é esse que a gente conhece.”
Desde então, o governo nada fez a respeito, e a dívida, que custa o juro que a gente conhece, não para de subir. O juro sobe e cria um círculo vicioso. Todos os indicadores da economia vão mal.
Mesmo assim, o governo não consegue se mexer. Com exceção de Fernando Haddad e Simone Tebet, ninguém quer ouvir falar desse assunto — os ministros Luiz Marinho, do Trabalho, e Carlos Lupi, da Previdência, chegaram a ameaçar se demitir por causa dele.
A esquerda tem um problema duplo com o equilíbrio fiscal. Pelo lado da (i)maturidade, não se conforma que dinheiro não dá em árvore, que gastar demais tem consequências. Pelo lado da ideologia, supõe que equilíbrio fiscal é um valor neoliberal que existe para arrochar pobre (ou seja, a aritmética é de direita). Vale para Lula e para a maioria de seus ministros.
O Brasil gasta demais, e gasta muito mal. Para fazer o ajuste necessário, precisa de um presidente que tenha a coragem de encarar o problema para valer.
Lula não foi esse presidente 20 anos atrás, quando era fácil sê-lo, e não o será agora, quando é difícil.
(Por Ricardo Rangel em 11/11/2024)