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Reinaldo Azevedo

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Tão certo e tão errado!

Muito interessante a entrevista do sociólogo argentino Juan Gabriel Tokatlian a Andrea Murta na Folha desta segunda. Ele comenta o qüiproquó entre Equador, Colômbia e Venezuela. E não é que o homem acerta e erra em grandes proporções? Generoso, começarei pelo seu acerto. Trechos da entrevista em azul. Comento em preto. FOLHA – Quem ganhou […]

Por Reinaldo Azevedo Atualizado em 5 jun 2024, 22h53 - Publicado em 10 mar 2008, 07h03
Muito interessante a entrevista do sociólogo argentino Juan Gabriel Tokatlian a Andrea Murta na Folha desta segunda. Ele comenta o qüiproquó entre Equador, Colômbia e Venezuela. E não é que o homem acerta e erra em grandes proporções? Generoso, começarei pelo seu acerto. Trechos da entrevista em azul. Comento em preto.

FOLHA – Quem ganhou e quem perdeu com a disputa?
TOKATLIAN –
O Brasil é um perdedor. O Equador também, por ter sido violentado em sua soberania. Perdeu Hugo Chávez, que teve uma atuação desproporcional, desnecessária, que deu um sentido exagerado a um problema real, mas do qual não pôde tirar benefícios. Já Uribe consolida seu predomínio político interno, o que o levará provavelmente a vencer um novo mandato, se for possível, através de uma reforma constitucional, permitir uma outra eleição. Washington deve estar feliz, pois sem aparecer em primeiro plano conseguiu que seu maior aliado tivesse uma vitória político-militar transcendente e que sua lógica da “guerra contra o terror” começasse a tomar corpo na região. Creio que não há grandes vencedores coletivos. Um dos mais golpeados são as Farc. Mas se olhamos esta trama a longo prazo, o que veremos serão reacomodações e teremos de ver se todos os vitoriosos de hoje ainda o serão amanhã.

Como vocês sabem, endosso cada uma das palavras que vão acima. Os bandoleiros perderam. A Colômbia ganhou — e, é claro, os Estados Unidos também. O Brasil é o maior país do subcontinente e viu sua liderança ser absolutamente ignorada. A conversa de que a mediação do Itamaraty evitou a guerra é balela das grossas. Recuperem tudo o que escrevi a respeito e verão por que concordo com o tal Toklatian. Mas ele também consegue ser supinamente idiota, e isso acontece quando ignora os fatos para fazer antiamericanismo barato. Querem ver?

FOLHA- Como o sr. avalia todo esse episódio?
JUAN GABRIEL TOKATLIAN –
O que ocorreu tem três faces. A primeira, fundamental, é que se produziu um ato violento, que afetou as relações interamericanas, significou uma violação do direito internacional e vai ter profundas repercussões futuras. Provavelmente se instalou aqui definitivamente a noção da guerra contra o terrorismo, que era mais própria do Oriente Médio, da Ásia Central, do Chifre da África etc. Em segundo lugar, no campo específico da Colômbia, o que se produziu foi menos o exercício de um presidente que seguia exigências de Washington e muito mais a oportunidade política interna de dar às Farc um golpe demolidor. Provavelmente estamos em um ponto de inflexão muito significativo da confrontação armada na Colômbia. Por isso, para grande parte da população colombiana, a ação foi percebida como uma vitória. Mas ela foi conseguida por meio de um instrumento ilegal e ilegítimo do ponto de vista latino-americano. O terceiro ponto -e nisso o mais afetado é o Brasil- é que desmoronou a noção de que a América Latina ia a caminho da união sul-americana. Esse projeto, que o Brasil em particular defende tanto, caiu como um castelo de cartas. A América do Sul não pôde se antecipar a isso, nem evitar que se rompessem relações entre países, nem conseguiu que a solução seja segura e definitiva. Aqui há cada vez mais retórica de integração e prática de fragmentação.
Viram só? Ele está enxergando as patas do Satã do Norte no continente. Trata a soberania territorial como um dogma — sim, claro, também acho que seja —, mas ignora o fato de que está evidenciado, de modo escancarado, que Venezuela e Equador estão se imiscuindo nos assuntos internos da Colômbia.

Uma boa pergunta: e qual é o problema de se instalar no continente a noção da “guerra contra o terrorismo”? O que ele propõe? A convivência com o terror? Vejam nos muitos mapas publicados a respeito as áreas da Colômbia sob influência das Farc. Os terroristas estão usando os territórios da Venezuela e do Equador como base de operações. E com o consentimento e, pior do que isso, patrocínio dos governos desses dois países. E nesse caso? Quem viola o quê?

De fato, pode-se censurar duramente a diplomacia brasileira, que permitiu que a situação chegasse quase a uma guerra. Ele fala da derrota do Brasil, mas se abstém de dizer o óbvio: o país tem dado, quando menos, apoio ideológico e moral às ilegalidades e arreganhos autoritários dos gorilas do continente: Chávez, Rafael Correa e Evo Morales. No caso das Farc, como é público, as relações são até mais perigosas: o PT e os terroristas pertencem a um mesmo organismo, o Foro de São Paulo, no qual Lula discursa.

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O que espera Tokatlian? A VEJA que chegou às bancas no sábado e a Folha de domingo demonstram como a vida da própria Venezuela, nas áreas fronteiriças com a Colômbia, já foi alterada pela rotina de terroristas, ex-paramilitares e bandoleiros de toda a ordem. O que tem dito o Brasil? Ora, leiam o que Marco Aurélio afirmou ao Le Figaro: “As Farc não são nem terroristas nem força beligerante”. Com os diabos! São, então, o quê?

Se vocês lerem a entrevista (íntegra aqui), verão que ele sugere, um tanto obliquamente, que se façam esforços para considerar os terroristas, sei lá eu, uma força política. É o que pretende Marco Aurélio. Uma força política que seqüestra, tortura, mata e trafica drogas? Pois é. Não fosse o juízo essencialmente delinqüente, cumpriria lembrar que o povo colombiano não quer isso, como deixou muito claro nas urnas. Cumpre respeitar a democracia. Bush não é um bicho-papão debaixo da cama dos latino-americanos. Se há algum monstrengo ali, é o terrorismo. E tem de ser combatido. Sabem como? Com a guerra ao terror.

No dia em que Correa e Chávez reconhecerem que também as Farc violam a soberania territorial de Equador e Venezuela, talvez se possa fazer a guerra por outros meios: com a diplomacia.

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