Sobre bancos, liberalismo, estatismo e… política
Plinio Apuleyo Mendoza, Alvaro Vargas Llosa e Carlos Alberto Montaner definiram no Manual do Perfeito Idiota Latino-Americano as características do perfeito idiota esquerdista. Acontece que é possível haver um “perfeito idiota liberal” também. E, a exemplo de seu congênere oposto, sua militância, além de atrasada, é contraproducente até para os propósitos de sua luta. É […]
1) Já são estatais
Banco do Brasil e Nossa Caixa já são estatais hoje e assim permanecerão se a operação se realizar. O grau de estatização do sistema financeiro nem aumenta nem diminui. O dado positivo é que o Estado de São Paulo, que não precisa ter banco, livra-se do seu e ainda consegue recursos para investir em áreas prioritárias.
2) E o Banco do Brasil?
Ou o Banco do Brasil é visto “quase” como um banco qualquer, sem regalias, e, portanto, tem direito de tentar se expandir como qualquer outro — remunerando seus acionistas (tanto os da Bolsa como o majoritário, o Estado brasileiro — ou é privatizado. Por mim, seria privatizado. Há condições políticas de fazê-lo? Quem seria o doido a topar a empreitada? A Telebras deve ser ainda hoje a privatização mais bem-sucedida do mundo, seja pelo preço conseguido, seja pelos efeitos em 10 anos: a universalização da telefonia. Até agora, fala-se em privataria, e há certa nostalgia do sistema estatal. Parece piada, mas é assim. Enquanto o Banco do Brasil existir, ele tem de tentar se modernizar e se expandir, a exemplo de seus congêneres do setor privado.
3) Dá pra fazer leilão?
A proposta seria simplesmente rejeitada na Assembléia — hoje ao menos —, e o processo demoraria um século, sem contar o festival de ações judiciais que ensejaria. O processo seria desgastante para o próprio banco. Um dos grandes ativos da Nossa Caixa são os depósitos judiciais, pelos quais os bancos privados não dariam um tostão — já que, por lei, eles teriam de ir para um banco estatal: o próprio Banco do Brasil. Ou seja: se o BB compra a Nossa Caixa, a dinheirama — R$ 16 bilhões — tem valor; se o setor privado compra, ela não vale nada e vai parar, de mão beijada, no BB. MAS ATENÇÃO: ISSO SE A ASSEMBLÉIA APROVASSE A PRIVATIZAÇÃO. MAS ELA NÃO APROVA. ENTÃO O DEBATE SE DÁ SOBRE O NADA.
4) Qual é o preço?
Ninguém sabe. A avaliação será feita. Mas se abre aí um caminho que pode ser bastante criativo, até inédito. Digamos que se conclua que o banco vale R$ 6 bilhões. Ora, nada impede o Itaú de dizer: “Dou R$ 8 bilhões”. E o Bradesco: “Parem! Dou R$ 9 bilhões”. Aí, sim, estaríamos diante de um processo bastante virtuoso: jogar-se-ia a bola para a Assembléia. E também se elimina aquela conversa mole de sempre dos perfeitos idiotas esquerdistas: “Ah, vendeu a preço de banana”.
5) Estatização do sistema financeiro
Ah, tenham piedade, né? O sistema financeiro brasileiro é hoje o mais rentável do mundo — por causa da sua competência, da expansão do crédito e da estupenda remuneração da rolagem da dívida pública. Os grandes bancos privados batem recordes sucessivos de lucratividade. O estatismo na área nem avança nem diminui. Fica rigorosamente onde está.
6) É o possívelA incorporação da Nossa Caixa pelo Banco do Brasil é o que as condições políticas do momento permitem. Não fui eu que as fiz. Não foram vocês. Os que agora reclamam da “operação entre estatais” financiaram alegremente a campanha eleitoral de Lula em passado recente, que tinha como um dos pilares justamente a demonização das privatizações. Ou ninguém mais se lembra da onda criada pelo PT em 2006, acusando Alckmin de querer vender justamente a Petrobras e o Banco do Brasil?
Que político brasileiro, aspirante à Presidência da República, entraria, a esta altura do campeonato, numa guerra de guerrilha jurídica para vender um banco estatal sanado? Só se for maluco. Eu não entraria. Acreditem: seria um processo que se estenderia além de 2010. Se, por qualquer razão, o Banco do Brasil não comprar a Nossa Caixa, acredito que as coisas fiquem como estão. E São Paulo continuará a ter um banco mesmo sem precisar, e os paulistas continuarão a precisar de coisas que não terão, mesmo sendo “sócios” de um banco.
Os bancos privados certamente têm lá a sua cota de reclamações, mas não se diga que não dispõem de ampla liberdade para concorrer. Eles não têm de temer um Banco do Brasil eventualmente robustecido. Têm é de procurar ser mais eficientes e competitivos, como mandam os princípios do capitalismo.
Delfim Netto, por exemplo, acha que Serra acabará optando pelo leilão. Pode até ser. Então vamos ver quanto o Banco do Brasil está disposto a pagar pela “Nossa Caixa inteira”, com os depósitos judiciais. Se os bancos privados derem mais, aí é o caso, então, de ver qual é a saída. Alguns falam que, sem leilão, haveria uma enxurrada de ações judiciais. Isso é o de menos: com ele, também. A causa do leilão sempre será boa. No caso, é preciso melhorar os argumentos.
Reitero à guisa de conclusão: vamos privatizar o Banco do Brasil também, não apenas a Nossa Caixa. Aliás, que tal começarmos a cuidar dessa cultura no país, a da economia privada? Os financiadores de campanha que tanto amam o livre mercado poderiam começar por só financiar candidatos e partidos defensores do… livre mercado!!! Em vez disso, o que vi na última campanha foi o contrário: os bancos, ora tomados de fundamentalismo privatista (em si, correto), deram os tubos justamente ao candidato que encarna o discurso estatizante.
É engraçado que o setor financie, então, o proselitismo estatista na esperança de que as oposições, tadinhas, sem dinheiro, se encarreguem dos fundamentos da economia privada, não é? Já imaginaram? Serra privatiza a Nossa Caixa, torna-se o mártir da economia de mercado, cai na boca de sapo do petismo antiprivatista, que lança seu candidato com farto financiamento dos beneficiários daquela privatização…