Quase metade dos brasileiros considera o governo Dilma pior do que o de Lula, aponta pesquisa. Ou: Pesquisas têm de ser livres, e a gente tem de ser livre para criticá-las
Ô preguicinha! Agora saiu pesquisa CNT Sensus sobe o governo Dilma… Há dados para todos os gostos. A gente pode escolher a abordagem de alguns portais e anunciar: “70,2% aprovam o governo Dilma”. E o eleitorado, boquiaberto, exclama: “Ohhhh!!!” Mas também pode optar por outro caminho: “45.4% considera o governo Dilma pior do que o […]
Ô preguicinha!
Agora saiu pesquisa CNT Sensus sobe o governo Dilma… Há dados para todos os gostos. A gente pode escolher a abordagem de alguns portais e anunciar: “70,2% aprovam o governo Dilma”. E o eleitorado, boquiaberto, exclama: “Ohhhh!!!” Mas também pode optar por outro caminho: “45.4% considera o governo Dilma pior do que o de Lula”. E muitos exclamariam: “Xiii…”
Aprovação ou reprovação de governo são conceitos, vamos dizer, arcanos… O que querem dizer exatamente essas palavras? A reprovação, parece-me, induz a idéia da troca, da substituição: “Dilma tem de sair”. Há outro conceito ainda mais misterioso: a aprovação da pessoa da presidente: nesse caso, de 67%. Esses dados, entendo, não querem dizer rigorosamente nada.
Há uma pergunta mais objetiva e mais reveladora: “O governo é ótimo, bom, regular, ruim ou péssimo?” Aí os números do CNT/Census convergem com os do Datafolha e Ibope:
Ótimo – 10,1%
Bom – 39,1%
Regular – 37,1%
Ruim – 4,3%
Péssimo – 5%
Somados “ótimo e bom”, chega-se a 49,2%, empate técnico com o Datafolha (semana retrasada) e o Ibope (semana passada): ambos em 48%.
Em dezembro do ano passado, pesquisa CNT/Sensus apontou que Lula era aprovado por 87% dos brasileiros — assim, pode-se dizer que Dilma caiu 20 pontos em relação a seu antecessor… Ah, sim: essa turma do CNT/Sensus tem tal amor à objetividade que, no fim do ano passado, Clésio Andrade, presidente da CNT, anunciou que Lula havia batido o recorde mundial de popularidade. Isso só poderia ter sido afirmado se o Sensus tivesse feito pesquisa nos demais países. Não fez. Era só politicagem.
Pesquisismo
O pesquisismo virou categoria de pensamento no Brasil. Anula a análise, o pensamento, a política propriamente. Se o governante é “popular”, então ele passa a ser preservado da crítica dos opositores, o que, é evidente, colabora para… manter a sua popularidade. Lembrei a comparação megalômana de Clésio Andrade, que agora é senador pelo PR de Minas, para evidenciar que dados colhidos em pesquisa podem ser politicamente manipulados.
Procurem no Google quantos são os títulos que sustentam: “Governo Dilma é aprovado por 70,2% dos brasileiros”. Essa foi, afinal, a leitura que os donos do levantamento fizeram. O Planalto tinha ficado insatisfeito com aquela história de que a popularidade da presidente sofrera uma queda no Ibope…
Para encerrar: se a oposição começar a dar corda a esses feiticeiros de opinião pública, repetirá os erros cometidos ao longo de oito anos do governo Lula e nas duas últimas campanhas eleitorais à Presidência. E ficará, de novo, refém de especialistas convertidos ao governismo: alguns por uma crença que não tem preço; outros por um preço que não tem crença.
Ah, sim: eu acho que pesquisa tem de ser livre, sem quaisquer restrições. E acho que a gente tem de ser livre para apontar picaretagens de pesquiseiros. Criou-se no país uma espécie de doxa: quem questiona esses valentes é obscurantista. Obscurantismo é querer criar uma categoria de profissionais que está acima da crítica.