O terceiro mandato de Lula e os líderes sem liderança do PSDB
Não vou sugerir a vocês que recorram ao arquivo do blog ou ao Google para procurar as vezes que escrevi que haveria a tentativa — ao menos ela — de abrir caminho para Lula emplacar o terceiro mandato. Até batizei o esforço, numa alusão aos apoiadores de Getúlio Vargas, de movimento “queremista”. Era claro como […]
Não vou sugerir a vocês que recorram ao arquivo do blog ou ao Google para procurar as vezes que escrevi que haveria a tentativa — ao menos ela — de abrir caminho para Lula emplacar o terceiro mandato. Até batizei o esforço, numa alusão aos apoiadores de Getúlio Vargas, de movimento “queremista”. Era claro como o dia que isso seria tentado. Todo o discurso do Apedeuta, de fato, prepara o terreno para o “queremos Lula”. Pode dar certo? É claro que sim. Seria um “golpe”, como diz o senador tucano Arthur Virgílio (AM)? Lamento: se alguém apresentar uma emenda constitucional e se ela for aprovada pelo Congresso, golpe não é. O trágico, meus caros, não é haver petistas e outros aliados pensando no assunto (Lula, aliás, não pensa em outra coisa). O trágico é sabermos que, em larga medida, o governo só não arranca essa emenda do Congresso se não quiser.
Haveria reação negativa de muita gente? Sim. Mas também haveria manifestações de apoio. Se vocês me perguntarem se isso, hoje, está mais para o “provável” ou para “improvável”, cravo a segunda opção. Por enquanto, Lula vai evitar o confronto. Mas, se decidisse comprar a briga, creio que não haveria força capaz de detê-lo. Enfrentaria, eventualmente, críticas severas de setores da imprensa. Mas não muito além disso. O DEM botaria a boca no trombone, reforçando seu caráter de oposição. E o PSDB tentaria se levantar de seu estado letárgico, quase moribundo. “Com que roupa?”, perguntaria o sambista.
Ontem, os tucanos ameaçaram suspender as negociações sobre a CPMF se essa história prosperar. Grande valentia! Chega a ser ridículo. O partido se coloca como linha auxiliar do governo, transforma Lula no condestável da República, subordina-se, catito, à sua estratégia política e depois reclama. Os tucanos podem ficar calmos. O deputado Devanir Ribeiro (PT-SP), amigo pessoal de Lula, tem como esperar a aprovação da emenda da CPMF. Depois disso, o presidente não precisa da oposição nem mesmo para lhe limpar as botinas. Pode lhe dar um vigoroso pé no traseiro.
Lula arranca a emenda da (re)reeleição se quiser porque, entre outros motivos, a oposição não tem um rosto reconhecível. O DEM, justiça seja feita, bem que tenta. Mas está em fase de criação de lideranças. Vai demorar até ter um nome com envergadura nacional — razão pela qual, diga-se outra vez, creio que Gilberto Kassab deva, sim, tentar a reeleição em São Paulo, ainda que tendo de disputar com Geraldo Alckmin. No caso do PSDB, sobram líderes e falta liderança. Quando o PSDB começa a fazer oposição? Vai se lembrar de criticar o governo Lula só a partir de maio ou junho de 2010, quando definir seu candidato? Ou vai se manter calado para ser a continuidade sem continuísmo? Bem, então mudar pra quê?
Nos próximos dias, Lula deve negar qualquer relação com o grupo queremista e reafirmar que não pretende emplacar o terceiro mandato consecutivo. Reitero: neste momento, até que uma proposta não seja mesmo apresentada, isso é o de menos. Grave é saber que, se ele decidir fazê-lo, não haverá quem possa dizer: “Epa! Espere aí. Assim não vai dar”. Porque os líderes reconhecíveis da oposição estão completamente rendidos à agenda lulista. O caso da CPMF, desnecessário dizer, expõe de forma dramática esse vazio.
Observo também que o PSDB, para variar, faz uma aposta perigosa. Numa lista livre de candidatos, nomes do partido ocupam os três primeiros lugares. Em cenários plausíveis, sem Lula, Serra obtém grande vantagem. Ainda que o Apedeuta se guarde, como chegou a enunciar, para 2014, o cenário não é nada hostil à construção de um novo nome. Nem precisa ser necessariamente petista. Basta que se conforme em se subordinar ao lulo-petismo. Sei que transferência de voto não é algo tão simples. Mas uma campanha bem-feita, bem-trabalhada, com o Apedeuta carregando nos ombros o “seu” candidato pode ter efeitos inesperados.
Ora, se o PSDB atua hoje para fortalecer o presidente, é evidente que ele pode se voltar contra o partido se achar conveniente. Um terceiro mandato de Lula, nesse caso, pode prescindir até mesmo do próprio Lula.