Na era da “Politeia”, advogada de defesa vira investigada e logo será… ré! Passou dos limites
Se a moda pega, em breve, só haverá advogados no Brasil para quem não precisar de advogados. De certo modo, Ministério Público e Polícia Federal estão mesmo lutando bravamente para criar no Brasil a “Politeia” de Platão. Aquilo era uma ditadura. Vamos ver. Marcelo Odebrecht iria depor nesta quinta sobre o tal bilhete passado a […]

Se a moda pega, em breve, só haverá advogados no Brasil para quem não precisar de advogados. De certo modo, Ministério Público e Polícia Federal estão mesmo lutando bravamente para criar no Brasil a “Politeia” de Platão. Aquilo era uma ditadura. Vamos ver. Marcelo Odebrecht iria depor nesta quinta sobre o tal bilhete passado a seus advogados em que supostamente mandaria destruir provas. O dito-cujo é a principal justificativa para mantê-lo em prisão preventiva. Digo de novo: deporia hoje, três dias antes de sua prisão completar… um mês! Mas não houve depoimento nenhum! Nem hoje.
Por que não? Porque Dora Cavalcanti, que responde por sua defesa, foi informada pela Polícia Federal de que, ora vejam!, também será ouvida no inquérito. Logo, não poderia acompanhar o depoimento de seu cliente. É evidente que isso passou de todos os limites aceitáveis numa sociedade democrática e de direito.
Vocês conhecem a minha opinião a respeito desse caso. Se você, leitor, jamais entregaria a um policial federal um bilhete mandando destruir provas, por que Marcelo Odebrecht o faria? Será que ele é mais bobo do que todos nós? Tenham a santa paciência! Nota: o bilhete não foi “apreendido”, como se diz, mas entregue ao agente para que passasse aos advogados.
No dia 24 de junho, escrevi aqui post a respeito. Afirmei sobre a acusação feita pela Polícia Federal:
“Parece estar em curso também uma tentativa de intimidar a defesa. O presidente da Odebrecht endereçou o bilhete a Rodrigo Sanchez Rio e Dora Cavalcanti, seus advogados. Ora, quando se acusa o investigado de estar instruindo seus defensores a cometer crimes, é claro que se está atacando também a reputação desses profissionais, que têm um código de ética a seguir.”
Eis aí. Dora Cavalcanti já passou da condição de advogada de defesa à de investigada. E parece evidente o esforço para transformá-la em ré.
Há idiotas vibrando com esse estado de coisas? Bom proveito! Talvez nunca tenham precisado antes de advogados de defesa, não é mesmo? Talvez estejam certos de que nunca venham a precisar…
Já alertei aqui e volto a fazê-lo: as transgressões à ordem legal estão se avolumando nessa operação. Já vimos isso antes e sabemos aonde pode dar. O resultado acaba sendo impunidade. Dora disse que vai recorrer às instâncias legais contra o óbvio constrangimento a que está sendo submetido o direito de defesa no país (ver vídeo).
Escrevo de novo para quem quer e para quem não quer entender: isso nada tem a ver com Marcelo Odebrecht ou com Dora em particular. Isso tem a ver com garantias do Estado democrático. Ele pode ser culpado de tudo o que o acusam? Pode. Que se sigam os ritos para, confirmada essa culpa, pagar pelo que fez. O que não se inventou ainda na democracia é condenado antes do julgamento, sem direito à defesa.
Para encerrar: se Cristo descer amanhã à terra e reivindicar o direito de governar e decidir acima dos códigos democraticamente pactuados, direi não! É claro que Cristo não faria isso. E, se o fizesse, Cristo não seria, mas o capeta disfarçado de nazareno.
Não se esqueçam de que escrevi isto no dia 16 de julho: advogados e juízes das mais variadas tendências estão assombrados com certas práticas da Operação Lava Jato. E elas cobrarão seu preço. Sim, no petrolão, cometeram-se crimes em penca. Um único ladrão topa devolver US$ 97 milhões. É possível fazer Justiça segundo os fundamentos da… Justiça. Ocorre que há nesse meio gente achando que as leis que temos atrapalham o seu trabalho.
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