LADRÕES QUE FURTAM E SÃO ENFORCADOS E LADRÕES QUE FURTAM E ENFORCAM
Vi ontem no Jornal Nacional aqueles abnegados que ocupavam a Câmara do Distrito Federal para protestar contra as safadezas da gangue local. Alguns saíram carregados pela Polícia, verdadeiros heróis da moralidade pública. No mensalão do PT, muitos deles também estavam nas ruas: denunciavam o golpe dos que acusavam o… mensalão do PT!!! Uma gente honesta, […]
Vi ontem no Jornal Nacional aqueles abnegados que ocupavam a Câmara do Distrito Federal para protestar contra as safadezas da gangue local. Alguns saíram carregados pela Polícia, verdadeiros heróis da moralidade pública. No mensalão do PT, muitos deles também estavam nas ruas: denunciavam o golpe dos que acusavam o… mensalão do PT!!! Uma gente honesta, coerente, decente. Também vi no JN o deputado petista Paulo Tadeu discursar enérgico: “O governador Arruda está utilizando da máquina pública para impedir que investigações ocorram aqui na Câmara, ou mesmo, em outros setores”. Estava ali um homem de coragem, vivendo o seu grande momento em rede nacional.
Foi uma pena que as câmeras de JN não tenham se dedicado a seguir um pouco mais o herói do dia. Logo mais à noite, ele tinha uma grande festa. Numa casa de eventos de Brasília, o partido estava fazendo uma homenagem a seus ex-presidentes — um motivo sem dúvida nobre. Entre os homenageados, ninguém menos do que José Genoino, presidente do PT na época do mensalão petista, e José Dirceu, apontado como o grande comandante do esquema. E o PT, como a gente sabe, nunca usa a máquina pública para impedir investigações. Está decidido! Meu herói no Distrito Federal, agora, se chama Paulo Tadeu! Ele quer a punição exemplar dos mensaleiros dos outros, mas vai fazer festa para o seus.
É provável que a população não fique sabendo da festa do PT a seus mensaleiros porque o evento não será considerado uma pauta de TV — só os jornais noticiarão, e pouca gente lê jornal, o que é motivo de orgulho lá no Planalto. Mas Tadeu é só um quase-nada alçado à fama. Quem também compareceu à festança foi a ministra-chefe da Casa Civil, Dilma Rousseff. Em pessoa. E, segundo informa Vera Rosa no Estadão Online, disse palavras de grande profundidade e apuro moral ímpar. Comentando o caso do Distrito Federal, afirmou que a lambança “compromete o DEM”, pedindo punição mais rápida “quando as provas são inequívocas”. Mas e sobre os mensaleiros do PT, que ela foi homenagear?
Bem, aí a coisa muda de figura: “Não há provas contundentes contra eles, que não foram sequer julgados. No caso do DEM, as imagens são estarrecedoras, muito claras.” É o fim da picada! Julgado, a rigor, não foi ninguém. E as provas, ainda que não imagens, sobre o mensalão do PT são escancaradas. Qual é a diferença? Aquela mesma de que falava Padre Vieira num sermão sobre ladrões: “Uns furtam e são enforcados; outros furtam e enforcam“.
Já disse aqui desde o primeiro dia qual, acredito, deva ser o destino de Arruda. E espero que o DEM o expulse. Se o fizer, estará dando o exemplo que o PT não deu, embora não deva esperar a atribuição de algum mérito por boa parte da imprensa, que também acredita, intimamente, que o mensalão do PT tinha como objetivo uma causa nobre; já o do DEM, claro, é só roubalheira.
Os moralistas do PT não ficaram por aí. No dia da festa-celebração a seus mensaleiros, a direção do partido divulgou um documento em que se lê o seguinte trecho: “Resta contabilizar o estrago do panetonegate, que coloca por terra o discurso hipócrita dos falsos vestais do DEM no DF, numa reprise ainda mais chocante dos escândalos do PSDB de Yeda Crusius no RS e de [Eduardo] Azeredo, em Minas Gerais”. Sobre o próprio mensalão, obviamente, nem uma linha. Preservado pelo noticiário, alçado à condição de juiz dos demais partidos como se tivesse a ficha limpa, é pura conversa mole essa história de que o PT optará só por uma campanha propositiva.
Citei Padre Vieira? Pois é… Os três crimes — o do PT, o do DEM-DF e do PSDB-MG — são diferentes: o do PT era de lesa democracia; o do DEM-DF é roubalheira pura e simples, e o do PSDB-MG era caixa dois de campanha. Por que eu não sou petista? Entre outras razões, porque não teria cara para defender os “meus” criminosos, como tem Dilma, como tem Lula, como tem o tal Tadeu e seus 30 segundos em rede nacional. O que enoja nessa história toda é que alguns candidatos a rei da Macedônia decidam repreender os piratas. Aí volto ao padre. Vejam que maravilha:
Navegava Alexandre em uma poderosa armada pelo mar Eritreu a conquistar a Índia; e como fosse trazido à sua presença um pirata, que por ali andava roubando os pescadores repreendeu-o muito Alexandre de andar em tão mau ofício: porém ele [o pirata], que não era medroso nem lerdo, respondeu assim: “Basta, senhor, que eu, porque roubo em uma barca, sou ladrão, e vós, porque roubais em uma armada, sois imperador?” Assim é. O roubar pouco é culpa, o roubar muito é grandeza: o roubar com pouco poder faz os piratas, o roubar com muito, os Alexandres. Mas Sêneca, que sabia bem distinguir as qualidades e interpretar as significações, a uns e outros definiu com o mesmo nome (…) Se o rei de Macedônia, ou de qualquer outro, fizer o que faz o ladrão e o pirata; o ladrão, o pirata e o rei; todos têm o mesmo lugar, e merecem o mesmo nome.
É isto: que se dane o pirata da perna de pau! Mas quem tem coragem de afrontar o rei da Macedônia e sua corte de descarados?