ELE NÃO GOSTAVA DE REELEIÇÃO; AGORA GOSTA. OU: SURFANDO NO SOFRIMENTO DOS PAULISTAS
O trecho abaixo revela, como poucos, o jeito Lula de pensar e de fazer política: O sr. não pensa mesmo em voltar à Presidência? Não penso. Quem foi eleito presidente tem o direito legítimo de ser candidato à reeleição. Ponto pacífico. Essa é a prioridade número 1. O sr. não vai defender a mudança dessa […]
O trecho abaixo revela, como poucos, o jeito Lula de pensar e de fazer política:
O sr. não pensa mesmo em voltar à Presidência?
Não penso. Quem foi eleito presidente tem o direito legítimo de ser candidato à reeleição. Ponto pacífico. Essa é a prioridade número 1.
O sr. não vai defender a mudança dessa regra, de fim da reeleição com mandato de cinco anos?
Não vou porque quando quis defender ninguém quis. Eu fui defensor da idéia de cinco anos sem reeleição. Hoje, com a minha experiência de presidente, eu queria dizer uma coisa para vocês: ninguém, nenhum presidente da República, num mandato de quatro anos, concluirá uma única obra estruturante no País.
Então o sr. mudou de idéia…
Mudei de idéia. Veja quanto tempo os tucanos estão governando São Paulo e o Rio Tietê continua do mesmo jeito. É draga dali, tira terra, põe terra. Eu lembro do entusiasmo do Jornal da Tarde quando, em 1982, o banco japonês ofereceu US$ 500 milhões para resolver aquilo. A verdade é que, para desgraça do povo de São Paulo, as enchentes continuam. Eu não culpo o Serra, não culpo o Kassab e nenhum governante. Eu acho que a chuva é demais. No meu apartamento, em São Bernardo, está caindo mais água dentro do que fora. Choveu tanto que vazou. Há dias o meu filho me ligou, às duas horas da manhã, e disse: “Pai, estou com dois baldes de água cheios.” Eu fui a São Paulo no dia do aniversário da cidade e disse que o governo federal está disposto a sentar com o governo do Estado, com o prefeito, e discutir uma saída para ver se consegue resolver o problema, que é gravíssimo. Não queremos ficar dizendo: “Ah, é meu adversário, deu enchente, que ótimo”. Quem está falando isso para vocês viveu muitas enchentes dentro de casa.
Comento
Prestem atenção à primeira resposta do bloco. Ele volta a dizer que a “prioridade número 1″ de quem se eleger seu sucessor é disputar a reeleição, e não fazer um bom governo ou um governo necessário, o que nem sempre quer dizer “popular”, como é óbvio. Pergunta: um governo que não estivesse interessado na própria continuidade não estaria mais apto a fazer o que precisa ser feito? Observem ainda que a resposta sugere que Dilma fatalmente irá sucedê-lo. E se for um tucano? Sua promessa de não tentar voltar em 2014 se mantém?
Quanto à reeleição, tem-se ali um legítimo Lula, não é mesmo? Questão prévia: este escrevinhador sempre foi contra a reeleição — combati a emenda votada no governo FHC. Considerei e considero um erro. Foi uma das vezes em que divergi no ex-presidente, embora tenha mais concordado com ele do que discordado dele — e me orgulho disso. Inicialmente, fica parecendo que ele não apoiará o fim da reeleição só por birra — “quando eu quis, ninguém quis” —, mas, na seqüencia, a gente nota que ele já “está convencido de que” a reeleição é um expediente necessário. Assim, segundo Lula, seu antecessor fez bem em propor a emenda da reeleição, certo? Poupou Lula de fazê-lo. Que coisa! Basta o atual presidente concordar com o ex, e eu me vejo obrigado a discordar dos dois!
Quanto às enchentes… Notem que Lula considera que a culpa, evidentemente, não é de Serra ou Kassab — até porque o valente não cita os desastres provocados nas cidades governadas pelo PT; no caso de Guarulhos, o partido está no poder há NOVE ANOS. Ao mesmo tempo, sugere que todas as obras feitas até agora foram inúteis, o que é de uma estupenda irresponsabilidade. Que não tenham sido eficazes contra a maior quantidade de chuvas em quase 70 anos, isso é verdade. Na resposta, Lula faz o contrário do que enuncia: surfa na “desgraça” dos paulistas afirmando que não pretende fazê-lo.